· Good

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Satoru Gojo

Quando eu era criança, minha mãe tentou tratar um dos meus olhos roxos com uma compressa quente, jurando que o calor faria com que o sangue se separasse e se expandisse, e que eu seria capaz de ir à escola no dia seguinte sem me sentir envergonhado por entrar em outra luta.

Não funcionou; em vez disso, o calor fez minha pele inchar, embaçando minha visão naquele olho por dois dias inteiros. Usei um tampão na escola, a vergonha ardendo nas minhas bochechas enquanto os outros meninos sussurravam e apontavam, como se olhos roxos em uma escola católica particular não fossem uma ocorrência comum.

Todas nós tínhamos mais raiva acumulada do que nossos pequenos corpos podiam suportar, um resultado da vida em que nascemos e que nos fez reprimir tudo, e muitas vezes se manifestava no recesso na forma de punhos voadores e botas descartadas.

Meus pais nunca perguntavam o que aconteceu quando eu chegava em casa com um novo corte ou hematoma, mas sempre havia um pequeno brilho nos olhos de Papà que enchia meu peito com um calor sentimental.

Um que de uma forma silenciosa me dizia que ele estava orgulhoso de mim por lutar, mesmo que não conhecesse as circunstâncias.

Não importava, porque como um Gojo, lutar está no meu sangue. É o esperado.

Encorajado, dentro do razoável, claro.

Então, quando abro os olhos e me deparo com o olhar severo e descontente do meu marido, fico surpreso por um instante. Sobretudo porque não sei o motivo de ele estar me encarando.

Piscando o sono dos olhos, observo o cômodo, reconhecendo os móveis e as cortinas pretas que cobrem as janelas do nosso quarto. Se não fosse pelo brilho suave da luminária da mesa de cabeceira, estaríamos entrincheirados na escuridão completa.

- Oi - falo em uma voz áspera, a única palavra como fogo raspando minha garganta.

- Beba - Suguru diz inexpressivo, segurando um copo de isopor com um
canudo. Tão direto e ao ponto, desprovido de qualquer emoção quando encontra meu olhar.

Nem mesmo uma pitada de alívio.

Por falar em maus modos. Sempre ouvi dizer que o dr. Geto era eficiente, mas frio ao lidar com pacientes, mas até agora nunca o vi em ação.

É... poderoso, o tom dele não deixa espaço para discussão. Um forte contraste com o homem calmo, mas apaixonado, que conheci, embora suponha que haja muito pouco espaço para paixão em um ambiente médico.

Pego a bebida, tomando um gole cauteloso, tentando ficar calmo, mesmo quando o líquido incendeia o interior da minha garganta seca. Fechando os lábios ao redor do canudo, eu o observo enquanto seu olhar pousa no meu queixo. Ele está usando o terno em que o vi pela última vez,
embora agora esteja amassado e ostentando vários graus de manchas, e seu
cabelo está todo desgrenhado, alguns fios escapando do coque.

Será que ele se sente mal por me deixar?

Provável que não, medito em silêncio, mudando o foco para as dores que
decoram meu corpo.

Meu olho lateja, percebo, cronometrando cada pulsação dolorosa com o batimento do meu coração, e cada um dos meus músculos parece irregular e despedaçado, como se eu tivesse acabado de correr uma maratona sem o treinamento adequado.

Colocando o copo na mesa de cabeceira, estico os braços acima da cabeça, estremecendo quando uma sensação aguda me atravessa, fazendo meu corpo convulsionar. Deixando-os cair, estendo a mão e passo pelo cabelo, parando quando encontro forte resistência.

-» Devotion / SatosuguOnde histórias criam vida. Descubra agora