Um

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"Eu preciso levantar", repetia mentalmente, olhando o relógio do celular. Tudo o que eu queria é que não tivesse aula hoje.
Há alguns minutos eu ouvi minha mãe gritar da sala que estava saindo, que havia dinheiro na mesa para eu comprar comida e que eu estava atrasado.
Preguiçosamente me arrastei até o banheiro, onde tomei banho e fiz minha higiene pessoal.
Logo que terminei de me arrumar, fui correndo à cozinha, tomei um copo de leite e fui pra escola, já atrasado.
Chegando lá, vou para a sala de aula sem falar com ninguém e deito a cabeça na mesa, cansado de correr tanto. Até que ouço uma voz familiar.

- Josh? Tá tudo bem? - Dizia meu amigo Carlos, com uma feição [no mínimo] preocupada.
- Sim, eu só me atrasei e vim correndo, tô até sem fôlego. - Ele espera que eu diga mais alguma coisa. - E bom dia pra você também.
- Bom dia, Josh! - E vai se sentar, satisfeito.

Carlos é meu melhor amigo desde sempre, que eu me lembre. Ele conseguiria qualquer garota com sua beleza: esguio, de cachos ruivos e olhos verdes. Por mais que ele não se sinta muito bem consigo mesmo, eu tenho um pouquinho de inveja da beleza dele.
Quando eu começo a cochilar (mesmo que essa não fosse minha intenção), o sinal para a primeira aula bate e a professora de Literatura entra na sala, exalando mau humor. Eu até gosto da matéria, mas ela é tão chata que eu me questiono.
Ela folheia seus materiais por um tempo, e depois faz menção de que ia dizer algo. Todos da sala se calam, curiosos, e quando estavam totalmente em silêncio, ela se vira e começa a escrever na lousa, como se nada tivesse acontecido. Apenas no meio da aula que ela se virou e, finalmente, começou a falar.

Depois de uma série de aulas chatas, eu finalmente posso ir pra casa. Sabia que tinha alguns pacotes de bolacha lá, então não tive que gastar o dinheiro e voltei direto (também porque eu estava com preguiça de parar no supermercado).
Chegando em casa, me joguei na cama e fui mexer no celular. Carlos tinha me mandado mensagem há alguns minutos.

"Vem aqui pra casa, tô sem nada pra fazer e muito entediado. Se sua resposta for não, considere que aqui tem sorvete."

Respondi que também não tinha nada pra fazer e que poderia ir pra lá. Marcamos às 14h, e falta cerca de meia hora para isso. Para alguns parece muito tempo, mas eu sou muito ruim com horários, então já comecei a me arrumar. E quando eu disse 'arrumar', quis dizer 'tomar um bom banho', porque nesse calor e com esse uniforme, eu não conseguiria sair todo suado.
Depois de me arrumar, trocar de roupa e ficar pronto pra ir, já estou quase atrasado: faltam dez minutos. Então vou para a casa do Carlos, e, chegando lá, toco a campainha. Quem atende é o pai dele, Oliver, que não gosta muito de mim. E juro, eu não sei o motivo.

- Boa tarde. - Ele diz, me fitando. - Carlos te chamou?
- Boa tarde, seu Oliver. Ele me chamou, sim.
- Ah. Então entra, ele está no quarto.

Oliver me deu passagem e eu entrei sob seu olhar severo. Fui para o quarto do Carlos e lá estava ele, mexendo distraído no celular.

- Que folga, nem parece que está esperando uma visita ilustre.
- Que visita ilustre? - Ele pergunta, ainda distraído.
- A minha, oras.
- Nossa, como você é engraçado, vou passar mal. Agora senta aqui, ou vai ficar em pé aí na porta? - Ele diz, se sentando na cama.

Me sentei, e vi que Carlos me olhava com aquela cara que eu bem conheço de 'eu vou te implorar algo que eu sei que você não vai querer'.

- Tudo bem Carlos, o que você quer?
- Achei que nunca perguntaria. - Ele pega o celular e procura uma mensagem. Quando acha, vira-o para mim.

"Hoje eu vou dar uma festa aqui na minha casa, tô convidando você e seu amigo gringo também, mas eu não tenho o número dele."

Era uma mensagem de Ronaldo, um menino que estudava com a gente. Sempre rodeado de pessoas populares, raramente chamava Carlos e eu para suas grandes festas.

- Você vai. - Declarou Carlos, vendo minha feição nada confiante.
- Mas eu não quero ir, vai ter muita gente lá, e muita gente que nós não conhecemos.
- Por isso mesmo, é uma ótima oportunidade de conhecer pessoas novas! Vamos, por favor, meu amigo gringo. - Ele adorava dizer isso. Segundo minha mãe, o meu pai, que eu não cheguei a conhecer, era inglês, e sugeriu o nome. O único problema é que não é um nome muito comum quando se mora em São Paulo, no Brasil.

Suspirei e pensei, mas depois de vê-lo forçando uma cara triste e chorosa, decidi que uma festa não seria tão ruim. E ele ficou super animado com o anúncio.

Voltei para casa quase às 19h, e, com toda a certeza, minha mãe estava em casa.
Eu estava certo. Quando cheguei lá, ela estava na cozinha, fazendo o jantar despreocupada (eu tinha avisado que não estaria em casa). Quando ela me viu, sua despreocupação foi embora. Então ela se virou para mim e, nervosa, disse que precisamos conversar.

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