Treze

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– Embaixo do assento da poltrona tem uma chave, presa com uma fita.
– Achei. – Cecília está me ajudando a sair, depois que fiquei pronto segundo as orientações dela.
– Pega e desce em silêncio até a cozinha.
– Certo, tô indo.

Vou na ponta dos pés, rezando para que ninguém me apanhe e bem agarrado na chave.

– E agora?
– Saia pela porta dos fundos. A cópia da chave tá na sua mão. A chave original fica guardada com o pai dela depois que ela foi pega fugindo de casa. Ele acha que não existe outra, mas isso não vem ao caso.
– Ela não faz barulho?
– Não, por isso que Ashley tentou fugir por aí, e não pela porta da frente.
– Então como ela foi pega?
– Deixou uma garrafinha de vidro cair no chão. Enfim, saia logo daí.

Destranco a porta com todo o cuidado e vou para fora, voltando a trancar.

– Certo, estou de fora.
– Que dia é hoje mesmo? – Cecília pergunta.
– Bom, considerando a hora, já é quarta.
– Então o turno do porteiro noturno começou na terça, e na terça... – Ela se interrompe para bufar. – Temos um último problema.
– Qual?
– Existem dois porteiros noturnos. Pablo é nosso amigo, ele trabalha nas Segundas, Quartas e Sábados, mas hoje quem está lá é Cláudio, das Terças, Quintas, Sextas e Domingos. E ele não é fácil.
– Como assim?
– Não vai te deixar sair e voltar livremente, e se deixar, vai dizer para Denis pela manhã, antes de ir embora.
– O que eu faço, então?
– Espera, deixa eu pensar... – Ela tira o telefone de perto e grita pela Fabrícia. – Espera aí.

E eu espero. Longos minutos. De vez em quando eu soltava um "alô?" para me certificar que ainda se lembravam de mim, o menino que tá no quintal, de madrugada, com frio e medo de ser pego, esperando.

– Josh? – É a voz de Cecília.
– Ainda estou aqui.
– Eu me enganei, quem está na portaria hoje é o Pablo. Os turnos dele são na Terça, Quinta e Sábado, na verdade.
– Sério?
– Sim, pode ir despreocupado e contar toda a verdade para ele. Já chamamos um táxi para você.
– Já estou indo.

Em poucos minutos chego na portaria, onde um senhor magro com um bigode enorme folheava um jornal qualquer. Se levantou quando me viu.

– Boa noite, o senhor precisa de algo?
– Você é o Pablo?
– Sou sim, da parte de quem? – Ele diz, sorrindo.
– Eu sou Josh, minha mãe namora o Denis Oliveira e me mudei para cá.
– Espera aí, você é o novo irmão da Ashley? – Ele pronuncia "Ashley" de um modo engraçado. – Oh, é um prazer! Do que precisa?
– Ashley foi para uma festa e bebeu mais do que devia, estou indo buscar ela. Tudo bem?
– O pai dela sabe?
– Que eu estou indo atrás dela ou da festa?
– Os dois.
– Ele está dormindo agora, mas espera encontrar Ashley no quarto pela manhã. Pelo o que me explicaram, ele deixa ela sair para voltar quando quiser, contanto que ela amanheça em casa.
– Então você está propondo que eu não conte nada para ele? – Ele coça o bigode.
– Por... favor?
– Tudo bem, João. Vai lá e busca ela, mas volta logo. Eu não me responsabilizo por você. – Acho engraçado ele me chamar de João.

Pablo libera a minha passagem só quando o táxi chega, para não correr perigo. Entro no carro e o homem já sabe o meu destino, definido através do aplicativo. Me leva até a casa de Cecília, um casarão lindo. Peço para o homem não ir embora, para nos levar de volta, e bato na porta da casa.

– Você é o Josh? – Uma menina ruiva atende a porta.
– Sim.
– Ai, graças aos céus! Vem, pode entrar. – Ela sorri e me deixa passar. – Prazer, sou a Fabrícia. Senta aí no sofá.
– Onde que a Ashley tá?
– Vomitando no banheiro. – Ela se senta do meu lado. – É nojento e eu não posso ficar nem perto, mas é bom para ela, tipo... Jogar toda essa bebida para fora.
– Acho que sim.

O silêncio toma conta da sala. Não se escuta mais nada quebrando ou pessoas gritando, mas a casa está uma bagunça. Coitada da Cecília.
Minutos depois, o cômodo ainda em silêncio, chega uma menina com traços de índia (muito bonita, por sinal), provavelmente Cecília, ajudando Ashley.

– Josh? – Ashley é a primeira em me ver. – Josh! O que que você tá fazendo aqui?

Ela vem cambaleando até mim, mas parece muito melhor do que as meninas descreveram e eu escutei pela chamada.

– Eu vim te buscar. A festa acabou, Ashley.
– Não acabou. – Ela faz manha. – Meninas, falem pra ele que ainda não acabou!
– Você precisa descansar, amiga. – Diz quem eu penso ser Cecília.
– E rápido. – Fabrícia completa.
– Tá. – Ashley me abraça. – Então me leve, cavaleiro dourado. Me leve até meu castelo.

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