𝟸𝟶- 𝙿𝚎𝚛𝚒𝚐𝚘𝚜

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O sol mal tinha nascido, a casa ainda estava mergulhada em um silêncio quase sagrado. Mas eu não dormi. Não conseguia. Passei a madrugada sentada na poltrona da sala, coberta por uma manta fina e o coração em guerra. Já era quase seis da manhã quando ouvi o portão se abrir com aquele estalo mecânico familiar.

Me levantei num pulo, os pés descalços tocando o chão frio enquanto corria até a porta. A camisa escura colada ao corpo estava rasgada em alguns pontos. O rosto suado, o cabelo bagunçado como se tivesse atravessado um furacão. E, o pior de tudo... manchas de sangue marcavam o colarinho e parte da manga.

— Felix?! — arfei, o choque me fazendo recuar meio passo antes de correr até ele. — Pelo amor de Deus, o que aconteceu?

Ele não respondeu de imediato. Os olhos estavam fundos, cansados, com aquela expressão vazia de quem segurou o mundo inteiro nas costas a noite toda. Mas assim que me viu...
A tensão nos ombros dele se desfez por completo.

— Tô bem. — murmurou, a voz baixa e rouca. — Tá tudo certo agora.

Fui abraçá-lo, mas ele levantou uma das mãos, avisando.— Não... eu tô sujo. Não quero te sujar também.

— Que se foda!! Você acha mesmo que isso me importa agora? — rebati, ignorando a advertência e o abraçando forte.

O cheiro metálico do sangue e o suor misturado à colônia dele ainda estavam ali. Mas também estava o calor, o alívio de saber que ele tinha voltado inteiro. 

— Mamãe?! — a voz do Taekwon ecoou escada abaixo, fininha e sonolenta.

Vi ele surgir no alto da escada com o pijama todo torto e os olhos arregalados quando avistou o pai na porta.

— PAAAAAAAIIIIIIIII!!! — ele gritou, descendo os degraus em disparada.

— Taekwon! Devagar! — tentei alertar, mas já era tarde.

O mini míssil pulou no colo do Felix com toda a força de uma criança de seis anos com saudade acumulada. Felix soltou um som de dor baixo, mas agarrou o filho com força, como se ele fosse a única âncora no meio do caos.

— Papai... você demorou! — Taekwon se agarrou no pescoço dele, fungando. — Eu pensei que você tinha sumido igual aquele filme do homem que vira pó!

— Eu jamais deixaria você, sabia? — Felix disse, a voz ainda cansada. — Papai só teve que... resolver uns assuntos feios. Mas eu tô aqui agora.

Taekwon olhou pra camisa suja e logo franziu o nariz. — Isso é sangue?

— É tinta vermelha. — menti rápido, tentando cortar o clima. — De um... mural. De arte.

— Ahh... — Taekwon aceitou sem resistência, voltando a se aconchegar.

Felix me olhou por cima da cabeça dele e sorriu de lado, fraco. — Obrigado por manter tudo de pé enquanto eu tava fora.

— Você vai me contar tudo, né? — cruzei os braços, o tom sério.

— Vou. Mas primeiro, um banho... e uma cama. — ele murmurou, a mão acariciando as costas de Taekwon.

— Tá bom. Mas você vai dormir abraçado comigo! — decretou Taekwon.

Felix assentiu com um sorriso cansado. — Sempre, meu rei.

E então, mesmo exausto, mesmo coberto de sangue e sujeira, ele subiu as escadas com o filho no colo, como se carregar o mundo fosse leve, desde que o mundo fosse aquele pequeno ser de cabelo bagunçado. Felix estava esgotado. Seus passos no corredor eram mais arrastados do que o normal, e mesmo tentando manter a postura firme na frente de Taekwon, eu via — cada olhar, cada gesto — que ele estava no limite.

𝐏𝐫𝐢𝐬𝐢𝐨𝐧𝐞𝐢𝐫𝐚 𝐝𝐚 𝐨𝐛𝐬𝐞𝐬𝐬ã𝐨 집착의 포로 - 𝘿𝙖𝙧𝙠 𝙍𝙤𝙢𝙖𝙣𝙘𝙚Onde histórias criam vida. Descubra agora