Destiny - 𝙳𝚞𝚜𝚝𝚒𝚗 𝙷𝚎𝚗𝚍𝚎𝚛𝚜𝚘𝚗

074 - Tagarelas

O reencontro com Dustin deixou uma marca diferente em Chloe, não foi uma cura, longe disso, mas um realinhamento. A dor agora tinha um contraponto, ao lado da memória fantasmagórica de Anthony e Dylan, havia agora a imagem vívida de Dustin ajoelhado no chão, seus olhos cheios de lágrimas e determinação. O toque de suas mãos, o peso do dado de plástico azul entre suas palmas, tornou-se um ponto de ancoragem físico quando os pesadelos tentavam sugá-la de volta.

Ela guardava o d20 sob o travesseiro, as vezes, durante a noite, seus dedos buscavam o plástico liso e frio, e o simples contato a lembrava: você tem uma ficha. Você ainda está no jogo.

Steve notou as mudanças, pequenas e preciosas, ela agora conseguia antecipar alguns sons, quando o carrinho das refeições rangia no corredor, ela não mais se encolhia em pânico; seus olhos iam para a porta, seu corpo ficava tenso, mas era uma tensão vigilante, não paralisante. Ela começou a nomear as enfermeiras. "A Alina é a que tem o sotaque da California", ela comentou uma manhã, após a troca do soro. "Ela não gosta de falar sobre o tempo." Era um detalhe ínfimo, uma observação banal, mas para Steve, foi como ouvir uma sinfonia, era a Chloe observadora, a que sempre notava os detalhes das pessoas, voltando à tona.

O ritual diário de caminhar até a janela se expandiu, agora, algumas vezes, eles davam uma volta completa pelo corredor circular da ala.Chloe caminhava ao lado dele, seus passos ainda arrastados, mas mais firmes, não olhava mais para cada porta como uma possível emboscada, as vezes, ela até observava os quadros genéricos nas paredes, paisagens serenas, flores, com uma expressão crítica distante, como se avaliasse sua autenticidade, e uma tarde, durante uma dessas caminhadas, eles passaram pela sala de recreação, a porta estava aberta, e dentro, uma TV antiga exibia um desenho animado em cores berrantes, Chloe parou no limiar, observando. O som alto e cacofônico, os movimentos bruscos da animação, tudo isso, semanas atrás, teria sido um gatilho certeiro para um ataque de pânico, por isso Steve ficou ao lado dela, em silêncio, pronto para intervir, mas ela apenas ficou ali por um longo minuto e então virou-se e continuou a caminhada sem dizer uma palavra, não havia recuado, apenas havia observado e continuado, foi uma vitória silenciosa que fez Steve respirar aliviado pelo resto do dia.

O verdadeiro teste, porém, Steve sabia, não seriam os corredores silenciosos ou as enfermeiras previsíveis, seriam as pessoas. As pessoas que carregavam consigo o peso dos últimos meses, das memórias que ela não compartilhava totalmente, então ele preparou o terreno para a próxima visita com a seriedade de um diplomata em negociações de paz

- Robin e Lucas vêm amanhã - anunciou, sentado em sua cadeira enquanto ela observava a chuva bater na janela - A Robin... ela tá ansiosa, mas ela sabe ir com calma. O Lucas também

Chloe não respondeu imediatamente, seus olhos seguiram uma gota de água escorrendo pelo vidro

- A Robin sempre fazia piada quando ficava nervosa - ela disse finalmente, sua voz um fio de som - Ela fez isso quando me contou que gostava de mulheres. Falou por dez minutos sobre a taxonomia de patos antes de conseguir dizer

Steve sorriu, um sorriso triste e afetuoso

- Ela ainda faz. Só que agora as piadas são piores

No dia seguinte, quando a batida característica, três toques rápidos, um hesitante, ecoaram na porta, Chloe estava sentada na poltrona que Steve trouxera para perto da cama, não estava encolhida, estava ereta, as mãos pousadas no colar, os dedos entrelaçados. Steve viu o pulso saltar no monitor, mas seu rosto estava sereno.

- Entrem

Robin entrou primeiro, e foi como uma explosão de energia contida em um corpo magro e desengonçado, seu cabelo estava um pouco mais comprido, amarrado de qualquer jeito, e seus olhos azuis, sempre tão expressivos, encontraram os de Chloe e instantaneamente se encheram de um alívio tão profundo que parecia doloroso, já Lucas entrou atrás dela, mais contido, ele também carregava as marcas, uma cicatriz fina perto da linha do cabelo, uma sobriedade no olhar que substituía parte da leveza do jogador de basquete, mas quando viu Chloe, um sorriso genuíno, tremendo nas bordas, iluminou seu rosto