capitulo 33

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*POV Harry*

Apesar de ter contado a verdade à Amy os meus problemas estavam longe de ter acabado.

- Eu já disse que preciso de mais tempo para arranjar o dinheiro. – Gritei mas arrependi-me de imediato quando me lembrei que estava toda a gente a dormir. Segurava o telemóvel junto ao ouvido e a minha mão tremia com os nervos.

- Vê lá como me falas! Dou-te três semanas, não quero saber como arranjas o guito. Se até dia treze não o tiver na mão já sabes o que acontece. – Ouvi alguém descer as escadas e quando vi a Amy desliguei de imediato a chamada.

- Com quem estavas a falar? – Perguntou-me.

- Seguros. Já sabes como são.

- Hum, hum. – Assentiu com a cabeça. Não me pareceu convencida, mas não insistiu no assunto.

- E tu? O que fazes acordada? – Agarrei a sua mão.

- Vim beber água. – Mostrou-me a garrafa de água que segurava com a outra mão. – Vens para cima? – Aproximou-se juntando-nos num abraço. Olhou para cima para me poder encarar.

- Acho que vou ficar na sala, perdi o sono. Mas vai para a cama, tu precisas de descansar.

- Está bem. – Colocou-se em bicos de pés para me roubar um beijo rápido. – Boa noite.

- Boa noite. – Ela sorriu. Permaneci sério enquanto a observava sair da cozinha e subir as escadas de volta para o quarto.

Puxei uma cadeira e sentei-me. Apoiei os cotovelos na mesa enquanto cobria o meu rosto com as duas mãos. Esfreguei a cara durante uns bons segundos com o intuito de me acalmar e conseguir pensar em algo que me pudesse ajudar a sair daquela trapalhada em que me meti há uns anos atrás. Tudo me parecia fácil na altura, nunca pensei ter problemas tão grandes como este. Mas é precisamente isso que acontece quando somos jovens: julgamos que as coisas más só acontecem aos outros. Para que isto fique bem claro: isso é um erro. Um grande erro. Temos de pensar nos nossos atos e nas consequências que eles nos podem trazer um dia. Pena foi só ter tido maturidade suficiente para perceber isso quando já tinha o pé na argola. Os meus pais toda a vida me deram aquele tipo de lições que ninguém quer ouvir. Aquelas bastante chatas que nos fazem pensar na série televisiva que vimos há minutos atrás, esquecendo que os nossos pais estão a falar conosco. Pelo menos comigo era assim que funcionava. '' Sabes Harry, '' começava o meu pai '' no meu tempo...'' e a minha mente desviava-se automaticamente para os episódios de Castle. Estou a gozar. Acho que nessa altura ainda não existia Castle. Mas via outras coisas. Só não me perguntem o quê porque não me lembro da maior parte delas. Conclusão: eu estava-me marimbando para o que eles diziam. Hoje arrependo-me. Ou não, porque se existisse Castle eu estava-me nas tintas para tudo.

Neste momento eles devem estar a apanhar banhos de sol e a comer lagosta ao lanche com a minha irmã Lindsy. Ela tem cinco anos e só estive com ela uma única vez. Não suportei a ideia de a minha mãe ter um filho de outro homem e o meu pai aceitar e perdoar. Depois têm a lata de dizer que sou eu que não sou responsável. Se assim fosse já lhes teria ido bater à porta a pedir ajuda para sair desta merda em vez de estar a trabalhar.

Lembro-me de quando fui visitar a minha mãe ao hospital depois da Lindsy nascer. Tinha dezanove anos. Fui porque o meu pai me arrastou até lá. '' Elas são a tua família Harry. '' disse-me ele enquanto dirigia o carro para o hospital. '' Eu não entro na porcaria do quarto! Não a quero ver! Nem a ela nem ao bebe!'' Gritei-lhe com uma camada de nervos a querer saltar do meu corpo fora. Nesse momento fitei a janela para não olhar para ele. '' Eu ultrapassei isso, '' fez uma pequena pausa e continuou '' sei o que estás a pensar, mas, raios, Harry! '' Senti o seu olhar pousar em mim, mas eu permaneci com o meu concentrado na estrada. '' Só porque tu ultrapassaste não quer dizer que eu também tenha de o fazer. Ao contrário de ti, eu amo a minha mãe, enquanto tu só a perdoaste porque sabes que se a deixasses acabavas debaixo da ponte a pedir esmolas.'' Cuspi. '' Posso estar desiludido e chateado com ela, mas pelo menos sou honesto.'' Prossegui. Ele travou o carro a fundo. Ouvi os carros buzinarem por trás de nós e pessoas mostrarem o dedo do meio e gritar com o vidro aberto à medida que nos ultrapassavam. Quase batia com a cabeça contra o porta luvas devido à travagem. '' Não te atrevas a falar assim comigo!'' Lembro-me do seu rosto encarnado e da minha forte vontade de rir naquele momento. Mas mantive a minha expressão séria. '' Eu sou o teu pai! '' Continuou. '' A sério? E eu sou o teu filho. Diz-me antes algo que eu ainda não saiba.'' Disse-lhe num tom de gozo. '' Lá por seres o meu pai não quer dizer que não tenhas que ouvir as verdades.'' Baixou o seu olhar quando decidi encará-lo. '' Eu vou fingir que isto não aconteceu. A tua mãe está cansada, por isso vamos entrar naquele hospital como se nada se tivesse passado e vais visitá-la ao quarto. É melhor também mudares essa cara e dares o mínimo de apoio à tua família.'' Desviou o seu olhar do meu e o carro voltou a andar. Não lhe voltei a dirigir uma única palavra até chegarmos. A sala de espera estava completamente vazia. A minha primeira atitude foi sentar-me. O meu pai olhou para mim como se me estivesse a tentar dizer telepaticamente para levantar o meu rabo do sofá e entrar no quarto. Não o fiz. Ele suspirou sentindo-se derrotado e cansado e entrou sozinho. Fiquei cerca de meia hora a olhar para a parede pintada de cor-de-rosa bebe à minha frente. Vi o meu pai sair pela porta com a Lindsy ao colo caminhando em minha direção. '' Pelo menos dá boas vindas à tua irmã'' Pediu-me enquanto ma passava para os braços. '' Fica com ela o tempo que precisares. Eu estarei lá dentro com a tua mãe. '' Avisou. O meu olhar caiu observando uma das pequenas mãozinhas frágeis apertar a minha. Como tinha medo de a deixar cair aconcheguei-a contra o meu peito. '' Desculpa '' Disse-lhe depois do meu pai se afastar. '' Sei que não tens culpa de nada. '' Continuei a observa-la. Tinha olhos esverdeados, tal como os meus. E os da minha mãe. '' Eu sou um péssimo irmão, acredita.'' Refleti no que estava a fazer. Ri-me do absurdo de estar a falar para um recém nascido. Vi uns pés à frente dos meus e olhei para cima. Era o meu irmão Jorge. Levantei-me e deitei a Lindsy nos seus braços. Sem dizer nada sai do hospital. A partir desse dia não voltei a ver os meus pais nem sequer a minha irmã que provavelmente hoje nem saberá da minha existência.

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