Capítulo 31 - Cúmplices na Morte

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E seus olhos, irradiando ódio e fúria, fitavam o cadáver estirado no chão. A morta era Lilith, uma mulher com seus trinta anos que nunca fora boa, nem má, com as pessoas. Que possuía tamanha frieza a ponto que seus vizinhos duvidavam se o casamento dela com Teodoro era, realmente, por amor. Apesar dos boatos da vizinhança, os dois tiveram dois filhos: Adele e Julian. Julian era um garoto extrovertido, que se relacionava bem com todas as pessoas que conhecia. Era conhecido por manter um círculo de amizade com os meninos do futebol da escola particular mais disputada por pessoas da alta sociedade, mesmo sem fazer parte dela. Totalmente o contrário de Adele. Que sempre foi aquela garota quieta, sem amigos e que sempre servia de chacota da classe por ser a aluna mais inteligente. Com seus cabelos negros que lhe encobriam todo seu rosto e suas roupas o mais discreta possível, ela chegava em silêncio na escola e logo que sentava abria um de seus livros didáticos pronta para fazer seus exercícios. Era fria, como a mãe. Nenhum dos dois recebeu devido carinho dos pais. Lilith, a mãe, vivia em sua máquina de costura e evitava conversar com todos. O pai, Teodoro, sempre chegava cansado de casa, tomava um banho, comia uma fruta e ia dormir. A convivência ali, definitivamente não existia. Os olhares trocados eram ácidos, os abraços eram falsos e as palavras eram automáticas demais para expressarem algum sentimento. Mas as condições da família eram boas.
No funeral, Adele se comportou de maneira estranha: parecia nervosa demais e toda hora tocava seu bolso direito do suéter preto e sua aparência demonstrava medo. Voltou sozinha para casa e assim que o carro de policia chegou para investigar, ela entrou em pânico. Adele foi para a casa dos avós alegando estar passando mal. Depois, às 16:00 horas chegou o telefonema: Foi encontrado no suéter preto dela, o mesmo que havia usado no funeral, uma faca coberta de sangue fresco de Lilith. A família enlouqueceu. Seus avós deixaram a menina na rua. Teodoro e Julian haviam viajado sem dar notícias e levaram as chaves de casa. E ninguém sequer trocou uma palavra com ela naqueles dias. Mas depois de algum tempo, depois das investigações policiais, ficou concluído que Adele havia matado sua mãe por falta de compreensão familiar e por sofrer bullying na escola.
Ela, por ter seus dezenove anos, foi presa e condenada a quatro anos de prisão sem direito à fiança. Lá, sofreu na mão das outras mulheres que haviam sido presas e, por não se comportar bem e fazer parte de uma rebelião para fuga, levou nas costas mais três anos e meio.
Sua vida, definitivamente estava acabando aos poucos, quando foi chamada para uma conversa com seu pai, que havia voltado da França com Julian há alguns dias. Lá, com sua voz grave ele disse:
-Lilith, tentei pagar um advogado para que você não fosse presa. Mas não deu certo. Todas as provas levam exatamente a você. Mas, minha filha... Por que fez isso? Sua mãe não era das melhores, mas nunca havia feito nada de mais para você.
-Pai, eu não fiz nada.
-Você disse isso ao juiz e como ele, eu não acredito. Como já lhe disse, todas as provas encontradas levam a você. Ou seja, é a culpada.
-Eu sei quem a matou. E sei por qual motivo. Mas por que você saiu naquele dia com Julian sem me avisar? – perguntou ela indignada.
-Meu amor, Julian estava muito tenso com toda a situação e, como sabemos, ele tem um grave problema no coração. Qualquer emoção forte pode leva-lo à morte.
-E esta é só uma desculpa que ele usou para persuadi-lo. Ou... Vocês são cúmplices?
-O que minha filha? Do que está falando? – pergunto Teodoro elevando a voz a um tom grave.
-Ah pai... Não se faça de bobo porque isso você realmente não é. Vai me dizer que nunca supôs que Julian havia matado Lilith?
-Não. Ele sempre foi um menino extrovertido... Ao contrário de você, que só ficava escondida no quarto.
-Exatamente por isso. Lembra quando mamãe nos contou de certo dinheiro que tinha no cofre do banco central?
-Lembro.
-Então, num desses dias de briga familiar, depois de Julian chegar bêbado em casa e Lilith brigar com ele... – Adele faz uma pausa e respira fundo contando até dez na cabeça – Ele me disse antes de dormir que faria qualquer coisa para pôr as mãos neste dinheiro e fugir para longe de nós. No momento pensei que estivesse fora de si por causo do álcool, mas agora, ao parar para analisar, lembro-me que poucas horas antes de Lilith morrer, os dois tiveram uma briga devido à nova namora de Julian. Ela não aceitava o namoro, mas ele dizia que jamais se separaria de alguém por ela não gostar da pessoa. E sim, ele estava bêbado. Foi aí que retirou a faca de cima da mesa, que até tem um pouco de manteiga se for ver, e a matou.
Teodoro olhou perplexo para o rosto da filha e perguntou quase sussurrando:
-E como explica o fato da faca estar exatamente no suéter de seu bolso e com suas digitais?
-Ele me obrigou a ficar com ela e levar a culpa por tudo isso, caso contrário te mataria.
-Me mataria?
-Sim, você.
-O tempo terminou, meus camaradas! – Gritou o policial da porta. Vamos saindo, senhor!
-Minha filha... Eu vou tentar tirá-la daqui. Vou procurar Julian e...
Nesse momento um dos policiais fortes e com caras amarradas retiraram o homem do lugar o colocaram para fora. Adele se debruçou sobre a mesa e ali deixou que suas lágrimas rolassem. Pela primeira vez... Chorou com saudades da mãe, pela crueldade do irmão e, principalmente pelo coração partido do pai. Chorou porque não podia fazer nada. Chorou por antes não reagir... Chorou por existir.
E assim continuou: chorando, chorando, chorando. Os dias passavam e nenhuma notícia de seu pai, ou mesmo do assassino Julian.                                                                                                                                                   Agora se Teodoro era, de fato, cúmplice de Julian, nós jamais saberemos... Pois se repararem, ele não derrubou nenhuma lágrima e nem se mostrou pasmo quando Adele contou-lhe a verdade. E o pior: quando a garota perguntou se era cúmplice de Julian, sua voz elevou-se e fez tamanho som grave na sala que foi impossível distinguir se era sua voz ou um trator que por ali passava diariamente.

Mas não deu tempo. Não deu tempo de nada.

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