O ALARME DO CELULAR DA BIANCA soou como se fosse um soco na minha cara. Adormeci com aqueles sentimentos bons do Miguel, e agora que acordei, estava com medo e insegura. Olhei para os lados e vi que nós todos estávamos acordando. Ótimo! Todos bem!
Bianca levantou e se assustou com o Miguel. Eu expliquei para ela. Logo perguntou se era seguro abrir a porta. Ela também estava com medo. Miguel foi na frente, olhou pelo buraco da fechadura, e foi abrindo a porta lentamente. Aparentemente, tudo normal. Colocou o corpo para fora e deu uma olhada melhor. Enquanto Bianca passava para o banheiro, ele foi até a sala e depois verificou o quarto dela também.
Por fim, entrou no meu quarto, e fechou a porta. Eu pedi para ele pegar o controle que eu iria desligar o aparelho de ar-condicionado. Ele me entregou e se jogou de volta no colchão onde dormiu.
Eu sentei na cama, com a coberta enrolada em mim. Estava com o primeiro pijama que vi na frente, e ele não era muito comportado. Fiquei pensando nos meus pais. Se alguém estava atrás de mim, eles seriam uma forma de me atingir. Não tinha jeito. Por mais que eu quisesse preservar os dois, eu teria que contar tudo no almoço hoje.
- Está pensativa... – ele falou cortando o meu raciocínio.
- É, estou. Não consigo parar de pensar nos eventos de ontem e se isso, de alguma forma, pode atingir meus pais. Estou bem preocupada, na verdade. – dividi meus pensamentos com ele na forma tradicional.
- Imagino.
- É, vou ter que contar para eles sobre tudo que aconteceu ontem – falei - Eu só queria ser capaz de saber, não importa de que forma, quem são "eles", ou pelo menos, o que "eles" querem!
Na mesma hora, o grito da minha irmã fez com que nós dois saltássemos até a porta do quarto. Miguel abriu a porta o mais rápido possível, já olhando para cima da parte externa, provavelmente porque leu os pensamentos dela após o grito.
Eu olhei para Bianca, ela tinha saído do banho, estava vestida para almoçar e trabalhar depois. Estava chorando e apontando para a parte superior da porta, agora, virada na minha direção.
Como mágica, a frase estava acabando de ser gravada na madeira, arrancando a tinta e deixando a resposta para a minha pergunta:
TODOS OS TRÊS!
Não sei se foi por causa da conversa que estávamos tendo mais cedo, ou em razão do fato de o Miguel estar com a leitura de mentes ativada, mas, logo depois que a escrita se fixou na porta, ele foi o primeiro a gritar:
- Seus pais!
Sem precisar de comando, corremos todos na direção da porta de saída da casa. Peguei as chaves do carro da Bia, que ficam penduradas na cozinha e minha bolsa, que estava lá desde o dia anterior.
Peguei as minhas chaves dentro da bolsa e joguei para a Bianca, que estava pegando o celular ao lado da televisão, fiz isso falando:
- Não sei se adianta, mas, tranca a casa enquanto eu tiro o carro!
Miguel já estava parado ao lado do veículo. Entrei no lado do motorista e ele no carona. Sem nem pensar, ou olhar para trás, acionei ré e acelerei. Virei todo o volante para a direita como se o carro não tivesse dianteira. Passei por cima do pequeno jardim que minha mãe ainda estava montando na frente da casa e freei bruscamente bem na direção da porta, onde Bianca me esperava.
Ela entrou no carro, jogando o corpo para frente e plugando o celular no cabo auxiliar. Acredito que o Miguel tenha lido meus pensamentos, olhou para trás para ver se vinha algum carro, já que minha rua é de mão dupla. Ele me deu o comando para ir.
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Subterfúgio: não há tempo para pensar
Science FictionComo seria a sua vida se pudesse sentir os sentimentos de outras pessoas apenas com um olhar? Esse poder, que acompanha Nina desde que nasceu, faz dela vulnerável e privilegiada ao mesmo tempo. A mesma capacidade que a faz criar subterfúgios, recorr...