Subterfúgio: não há tempo para pensar

CAPÍTULO 11 - A VERDADE

CONTAMOS TUDO O QUE ACONTECEU, desde o acidente voltando do trabalho, como encontrei o Miguel e o que nos fez correr para a casa deles daquela forma, destruindo jardins, derrubando cercas e violando a lei.

Agora, meus pais demonstravam um pouco de medo. Eu estava medicada, então preferi não focalizar nos sentimentos deles. Como eu já disse, o medo é o sentimento alheio mais perigoso, enquanto o amor é o mais violento. Não seria prudente misturar tudo isso dentro de mim naquela hora.

Miguel falou pela primeira vez:

- Só queria avisar, que como combinei com a Nina ontem, não estou com meu dom ativado. Ativei quando ouvi os gritos da Bianca e desativei logo que os policiais foram embora.

Me voltei para ele:

- Eles vão investigar? Você acha que pode dar algum problema para a gente?

- Não. Pensam que somos um trio de crianças estúpidas que não sabem lidar com problemas. Não vão fazer nada. Além disso, a Bianca tratou do filho de um deles mês passado, e ele a adorou. – Respondeu.

Meu pai olhava atônito! Bianca repetiu umas cinco vezes a parte de quando ela saiu do banheiro e na porta começou a ser gravada a frase: "todos os três". Agora ela falava sem parar que eles haviam marcado o quarto, que deveria ser uma indicação de quem eles deveriam pegar, etc.

Eu me intrometi para contar para ela o que tinha acontecido no quarto enquanto ela tomava banho. Expliquei a minha conversa com o Miguel, que falávamos sobre como contar para o papai e para a mamãe o fato de ter alguém atrás de mim. Disse que no final eu falei que eu queria saber quem eram "eles" ou então, pelo menos, o que "eles" queriam. Contei que foi na mesma hora que ela gritou. Ou seja, "eles" me responderam: queriam todos os três.

Como era de se esperar, um silêncio profundo se instalou na sala. O clima era mais pesado do que o de um funeral.

Meu pai agora estava fuzilando o Miguel. A reação dele mudou completamente, sem nenhum motivo. Começou a falar:

- E você? Miguel, não é? Eu escuto esse nome e sempre tem problema! Tudo isso começou exatamente quando você reencontrou a Nina! Você passou a noite toda com as minhas filhas! Como eu posso saber se esse seu poder não envolve mágica também? Nós não conhecemos você como achávamos! Pelo que eu entendi você mente para minha filha há mais de dez anos! – se virou para nós duas, estava azul de raiva – E vocês?! Duas irresponsáveis! Uma advogada e uma médica! Como levam um homem que acham que conhecem para casa, e...

- Pai! – Eu gritei, interrompendo-o pela primeira vez na minha vida – Não somos irresponsáveis! Somos duas alienadas, isso sim! Como o senhor disse: "uma advogada e uma médica"! Grande coisa! Nós vivemos escondidas atrás do senhor e da mamãe! Eu vivi utilizando o tio Eduardo como meu escudo. Pela primeira vez me dei conta de que tenho poderes sobrenaturais e nunca busquei a causa disso! De onde eu e a Bianca viemos? Por que nós somos assim? Eu não sei! Vocês nos deram todas as soluções e nós sempre nos acomodamos com isso. Quem quer saber o problema se já tem a resposta? No entanto, nós não temos a resposta!

Respirei fundo. Finalmente tinha falado em voz alta o que eu estava segurando desde a noite anterior. Continuei:

- Nós podemos ser alienadas, mas não somos doidas! O Miguel foi analisado! Ele mentiu antes, mas eu conheço ele! Mamãe conhece a família dele! O senhor sabe que meus métodos de detecção podem falhar as vezes, só que ele não demonstrou nenhum sinal de mentira em nada do que falou. Os sentimentos dele sempre foram coerentes com os acontecimentos. Se eu não sou o suficiente, a Bianca testou ele quase uma centena de vezes! Ela viu a vida dele inteira! E, dela, não tem como fugir! Se ele tentasse esconder algo, viria imediatamente para ela! – Eu estava suando e chorando enquanto falava – Agora, se ele é tão poderoso assim, a ponto de forjar sentimentos, de bloquear a Bianca, ler pensamentos e ainda escrever magicamente em portas, poderia ter fugido para outro país que não conseguiríamos escapar dele!