Capítulo 09
Notas: primeiro capítulo de hoje como eu falei hoje vo posta 3 . Entai espero que gostem vocês vão se surpreender . Próximo capítulo vocês vão pira e o último capítulo de hoje vocês vão surta . Bjs quero comentários.- É aqui, mãe.
Encarei dolorosamente a enorme e iluminada casa de Kelly assim que mamãe parou o carro rente ao meio-fio. Eu estava com um vestido azul escuro xadrez que ia até os joelhos, meus All Star azuis acinzentados de tão gastos e uma discreta bolsa preta, vestida até demais pra uma festa na mansão dos Smithers. Casais sem roupa aprontando pelos jardins era rotina em suas festinhas particulares, disso todo mundo sabia.
- Qualquer coisa me liga que eu venho te buscar - ouvi mamãe dizer, ainda desacostumada à idéia de me ver numa festa como aquelas. Ela sabia exatamente que eu não gostava desse tipo de evento, mas concordou em me levar quando eu fingi estar socialmente interessada naquela festa.
Assenti devagar, tirando o cinto e saindo do carro. Caminhei determinadamente na direção da porta da casa, ouvindo os batimentos acelerados de meu coração apesar da música alta que se tornava cada vez mais ensurdecedora a cada passo. Eu sentia medo pulsando em minhas veias, um medo indescritível de toda aquela situação.
Toquei a campainha quando meus pés afundaram no tapete de boas vindas da casa, e logo Kelly abriu a porta, revelando uma roupa totalmente promíscua. Assim que me viu, o mesmo sorrisinho maligno do dia anterior surgiu em seu rosto, e umas duas ou três garotas correram pra direções diferentes, provavelmente pra espalhar o boato de que Isabella Santoni estava numa festa de Kelly Smithers. Torci pra que elas não saíssem contando o motivo da minha presença também.
- Você veio mesmo - Kelly sorriu, erguendo as sobrancelhas em tom de surpresa - Pensei que não teria coragem.
- Vamos logo com isso - murmurei, tentando não demonstrar a insegurança que urrava dentro de mim.
Ela me deu passagem e eu entrei, sentindo instantaneamente o cheiro de cigarro, suor e álcool que dominava o ambiente. Muitas pessoas dançavam pelos cômodos, virando copos de bebida e passando as mãos onde bem entendessem nos corpos alheios. Com toda aquela gritaria bagunçando minha mente, eu podia jurar ter visto um olhar intrigado conhecido no meio de várias garotas quando meus olhos rapidamente percorreram o sofá da sala. Continuei seguindo Kelly até as escadas da casa, onde já se podia caminhar normalmente, e rapidamente subimos para o andar de cima. Ela abriu a porta de um dos quartos, interrompendo os amassos de um casal, e não precisamos dizer nada pra que eles se tocassem e saíssem.
- Como você percebeu, eu tenho uma festa animada pra aproveitar lá embaixo - Kelly sorriu, virando-se pra mim depois de fechar a porta do quarto atrás de nós - Então não vou demorar muito com você.
- Eu não pretendia passar muito tempo aqui mesmo - falei, sem emoção na voz, e ela ergueu uma sobrancelha, de um jeito que não me agradou muito.
- Ah, mas você vai - ela disse, cruzando os braços e sorrindo zombeteiramente da minha cara - Se realmente quiser manter seu caso com o sr. Simas escondido, você ainda vai freqüentar várias das minhas festinhas.
- Como é que é? - perguntei, rindo nervosamente com o olhar irritado fixo nela - O que exatamente você quer de mim, garota?
- Não vou pedir muito, vou até ser bem boazinha com você, só porque estudamos juntas desde que me conheço por gente - Kelly respondeu, como se estivesse fazendo um ato de caridade - Se você não quiser ver suas fotos no carro do sr. Simas estampadas na primeira página do jornal da escola, terá que obedecer a duas condições.
Ela fez uma pausa, só pra aproveitar mais um pouquinho a minha cara de enterro, e continuou:
- Primeiro, você vai ter que concordar em me fazer alguns favores de vez em quando, por exemplo, a minha lição de casa... E a das minhas amigas também, claro. Eu sei que isso é bem pouco perto da seriedade do seu segredinho, mas eu disse que ia ser boazinha.
- E a outra condição? - rosnei, tentando ignorar o fato de que teria de copiar no mínimo umas sete vezes as respostas gigantes dos exercícios do Hammings até achar um jeito de me livrar daquela chantagem barata. Kelly soltou um risinho satisfeito, apesar de seu olhar fulminante, e respondeu:
- Não ouse dirigir uma palavra ao Vitti.
Franzi a testa em tom de desprezo, e não pude evitar uma risadinha baixa.
- Peraí, deixa eu ver se entendi - falei, segurando uma gargalhada - Você quer que eu faça a sua lição de casa e ignore o Vitti em troca do seu silêncio?
Mais engraçada do que aquela situação toda foi a cara de tacho da Smithers, totalmente sem resposta diante do meu divertimento. Nem pra chantagear alguém ela prestava. Ignorar o Vitti é algo que eu adoro fazer, só ela ainda não tinha se tocado disso. Provavelmente ela sabia da cisma dele comigo, e estava se aproveitando daquela situação pra me manter longe dele e garantir sua atenção só pra ela, coitadinha.
- Se quiser que eu piore, é só falar - ela resmungou, totalmente desmoralizada, e eu engoli o riso. O assunto era sério, apesar do fracasso de Kelly como chantagista.
- Não, eu aceito essas condições - assenti, colocando as mãos nos bolsos do vestido - Bom, se for só isso, eu já vou indo.
- Mas já? Pra que a pressa? - Kelly perguntou, franzindo a testa do seu jeito cínico sem tirar um sorrisinho de canto do rosto - Bebe alguma coisa, senta um pouquinho. As meninas têm várias perguntas pra te fazer.
- Perguntas? - repeti, sem entender - Sobre o que?
- Oras, conquistar o professor mais desejado e intocado da escola não é motivo de curiosidade? - ela sorriu, encostando-se na porta e me impedindo de sair. Que absurdo, meu Deus do céu. Aquilo só podia ser uma piada. Como ela e as amiguinhas conseguiam ser tão putas?
- Você já conseguiu o que queria, agora me deixa ir embora - rosnei, quase dando um soco na fuça dela.
- Acho que esqueci de te avisar que os favores que vai fazer pra mim começam hoje - ela disse, como se eu tivesse problemas mentais e só entendesse as palavras se fossem ditas numa velocidade mais lenta que a normal - E o primeiro deles é ficar até o fim da festa. Quero ver como você se sai num ambiente completamente diferente do qual você tá acostumada a ficar. Talvez não seja tão divertido pra você, mas aposto que vou adorar a experiência.
Pude ver minha cara de perplexidade refletida nos olhos brilhantes de malícia de Kelly, e soltei um suspiro derrotado ao pensar no que estava em jogo ali. Minha relação com Fe, minha felicidade estava em risco, era um segredo perigoso demais pra arriscar uma rebeldia contra as condições dela.
- Que seja - murmurei, evitando encará-la e ver a alegria maldosa em seu rosto. Kelly abriu a porta com um sorriso, finalmente me deixando sair, e eu a acompanhei até o andar de baixo, sem acreditar na cilada na qual eu tinha acabado de cair.
- A casa é sua, querida - Kelly disse, cínica, quando descemos o último degrau da grande escadaria de mármore - Fique à vontade... Se conseguir.
Soltei um suspiro fúnebre enquanto me encaminhava pra qualquer lugar daquela mansão, fazendo questão de seguir a direção oposta à de Kelly. Por onde eu passava, via pessoas conhecidas da escola, e as poucas ainda sóbrias demonstravam curiosidade por me ver naquele lugar. Encontrei um balcão onde um rapaz preparava alguns drinques, e resolvi ficar por lá, já que a meia dúzia de pessoas sentadas ali pareciam estar bêbadas demais pra sequer se mexer.
- Cerveja, por favor - rosnei ao barman, com a garganta coçando por álcool. Se era pra encarar aquele martírio, que algo me ajudasse a passar o tempo mais rápido. Não sei te dizer em quantas línguas diferentes eu xingava Kelly em pensamento por me manter presa naquela festa horrorosa. Ela sabia muito bem que eu não suportava ficar em lugares como aquele, e ainda me forçava a aturar aquele bando de gente que eu já odiava quando estavam lúcidos, e conseguia odiar mais ainda quando estavam bêbados.
O barman logo me entregou uma latinha de cerveja, cuja metade do conteúdo eu mandei garganta abaixo de uma vez só, sem hesitar. Sentindo o líquido gelado descer dentro de mim, voltei a observar a bagunça na qual aquela casa tinha se transformado. Nada parecia estar em seu lugar, ninguém parecia estar em seu juízo perfeito... A não ser aqueles olhos.
Franzi a testa de leve, me perguntando se aquilo já era efeito da cerveja, mas era impossível com apenas um gole. Eu ainda podia senti-la descendo pela minha garganta, eu ainda me sentia lúcida o suficiente pra saber bem o que estava vendo. Aquilo era real, ele realmente estava ali, a poucos metros, me encarando como se soubesse que eu estava precisando de ajuda, como se soubesse que eu não estava ali por vontade própria. Seu olhar estava fincado no meu, extremamente sério, intrigado, preocupado. Havia muito mais coisas naqueles olhos do que eu podia descrever, me prendendo, me imobilizando, me retraindo.
Eu já devia imaginar que Rafael Vitti estaria naquela festa.
Não sei por que fiquei tão surpresa, afinal, ele era praticamente fixo da Smithers, todas as garotas de seu bandinho sabiam que ele era quase uma propriedade dela. Mas parecia que naquela noite ele estava liberado de sua monogamia, porque três garotas o rodeavam, uma mais descoberta que a outra. Rafael estava sentado num sofá perto de onde eu estava, com os braços abertos e apoiados no encosto do móvel, e tinha uma garota de cada lado seu, acariciando seu peito e sussurrando em seu ouvido com sorrisos pervertidos. Fora a terceira, que tinha uma perna de cada lado de seu quadril e estava sentada em seu colo, beijando-lhe indecentemente o pescoço. Mas apesar de tudo aquilo, era em mim que seu olhar repousava, como se tentasse descobrir o motivo de minha presença.
Desviei meu olhar do dele, sentindo meu coração disparar. Não estava sendo nada agradável estar sendo observada daquele jeito tão invasivo por uma pessoa como ele, o que só aumentava minha vontade de cometer suicídio por estar ali. Dei mais um grande gole na minha cerveja, encarando qualquer ponto ao meu redor que estivesse distante dele, mas meus olhos se recusaram a me obedecer quando o professor Vitti se livrou das três garotas que o provocavam e caminhou rapidamente na direção de Kelly, que passava por perto. Ele a segurou bruscamente pelo braço, de cara fechada, e disse algo em seu ouvido, pra que a música ensurdecedora não a impedisse de ouvi-lo. Afirmei pra mim mesma que aquela conversa tensa que se desenrolava entre os dois não podia ter a mínima relação comigo, mas ainda assim era impossível não observá-los.
Pela repentina mudança de humor de Kelly, a conversa não estava sendo das melhores. Rafael falava entusiasticamente em seu ouvido, gesticulando de leve com uma lata de cerveja nas mãos e com a testa constantemente franzida, e Kelly o respondia com incredulidade, com as mãos na cintura. Após um tempo de conversa, ela, que estava de costas pra mim, virou o rosto na minha direção e me lançou um olhar fuzilante. Rafael simplesmente disse mais algumas palavras, mantendo a expressão séria, e se afastou rapidamente, encolhendo seus ombros largos para poder passar pela multidão desvairada. Desviei meu olhar do dela, engolindo depressa o resto da minha cerveja, já sem tanta certeza de que aquilo não era sobre mim.
Os minutos foram se arrastando torturantemente, as cervejas foram descendo uma a uma, e uns quarenta minutos depois, eu já tinha perdido a conta de quantas latinhas tinha tomado. Tudo que eu sabia era que as coisas estavam meio confusas ao meu redor. As pessoas pareciam se mexer em flashes de imagens, e não mais continuamente, os sons se tornaram um pouco mais abafados, mas apesar dos sintomas de embriaguez, eu me sentia lúcida o suficiente pra ouvir os urros de depressão que ainda vinham de dentro de mim por ter que estar ali. Tomei um gole da cerveja que tinha pedido, mas aquilo era como água pra mim agora, descia pela minha garganta sem fazer a menor diferença. Só aquilo de álcool não estava bastando pra abafar minha frustração.
Resolvi me levantar, com uma leve vertigem, e caminhei vagarosamente pelas pessoas, tentando não deixar que a música abafada por um zunido estranho em meu ouvido estourasse meus tímpanos. Não demorou muito e eu encontrei uma grande passagem para outro cômodo bem mais vazio e silencioso: a cozinha. Pouquíssimas pessoas estavam ali, bebendo tequila com limão numa rodinha, entre elas um menino de olhos verdes faiscantes e cabelos compridos queimados de sol. Assim que avancei na direção de um armário, em busca de alguma bebida mais forte, notei que seus olhos me acompanharam, brilhando de interesse. Bem que minha mãe dizia que aquele vestido caía bem em mim.
Soltei um suspiro frustrado ao ver que naquele armário só havia louças, e enquanto fechava suas portas, pensando no que fazer, senti alguém se aproximar de mim, trazendo um cheiro de praia consigo. Sorri disfarçadamente e me virei na direção da pessoa, dando de cara com aquele mesmo menino.
- Tá procurando bebida? - ele perguntou, com um sorriso galanteador nos lábios, e eu assenti devagar, me perdendo sem querer naquele verde intenso - Se gostar de tequila, pode beber com a gente.
Com um leve aceno de cabeça que fez sua franja bagunçada se mexer, ele indicou o grupo de amigos, todos meninos e igualmente bronzeados. Ergui as sobrancelhas, e por fim assenti novamente. Tudo pela tequila, e não porque o garoto de olhos verdes tinha um cheiro gostoso de protetor solar.
Senti o garoto me puxar pela mão até seus amigos, e sem nem fazer questão de apresentá-los, me estendeu uma dose de tequila e um gomo de limão. Nunca tinha tomado aquilo na vida, mas me esforcei ao máximo pra parecer experiente. Espremi o limão em meu pulso, e sem demora virei o copinho de bebida, sugando o líquido amargo em minha pele logo em seguida. Com os olhos fortemente fechados, senti aquela coisa arder e queimar dentro de mim, arranhando tudo por onde passava e formando lágrimas em meus olhos. Pelo menos o forte efeito da tequila me manteria entretida por mais algum tempo, ainda mais quando acompanhada de um par de belos olhos esmeralda.
- Mais uma pra garota aqui, Jimmy - ouvi o menino pedir a um de seus amigos, quando abri os olhos e vi tudo embaçado ao meu redor. O garoto sorriu pra mim antes de tomar sua dose, e sem querer eu também estava sorrindo, com mais um copinho cheio de tequila numa mão e um gomo de limão na outra.
De repente eu me sentia leve. As coisas já não me preocupavam mais, a pesada responsabilidade sobre minhas costas tinha evaporado, e eu já nem me lembrava da razão de estar naquela casa. Ninguém existia mais, só eu e os garotos estranhos que riam alto e falavam besteiras ao meu lado. De repente tudo era extremamente engraçado, de repente eu me vi rindo de qualquer coisa, mesmo quando não havia motivo pra rir, com uma mão insistentemente apoiada no braço do garoto de olhos verdes, que eu descobri que se chamava Paul. E desse mesmo jeito repentino, estávamos nós dois sozinhos na cozinha: eu sentada sobre a bancada da pia, e ele em pé ao meu lado, segurando vacilantemente a garrafa de tequila quase vazia entre seus dedos.
- Eu já não te conheço de algum lugar? - ouvi ele perguntar, com a voz arrastada, enquanto eu soltava mais uma de minhas risadas desconexas - Sério, eu acho que já te vi uma vez.
- Ah, é? - falei, erguendo uma sobrancelha sem tirar o sorriso débil do rosto e com a certeza inconsciente de que tinha bebido muito mais que o aconselhável - Onde?
Paul chegou mais perto, aproximando sua boca de meu ouvido, e respondeu num sussurro:
- Em algum dos meus sonhos.
Soltei uma gargalhada alta e mais lerda que o normal, demonstrando que eu ainda tinha senso do ridículo e não tinha deixado de achar graça de cantadas baratas.
- Então você deve estar sonhando agora, porque eu tenho certeza de que nunca te vi na vida, muito menos em sonho - respondi, com a voz levemente ácida de desprezo - Além do mais, eu sou comprometida.
- Com quem? - ele insistiu com um sorrisinho tonto, me segurando pelo braço com um pouco mais de força que o necessário quando eu fiz menção de me levantar - Quem sabe eu não conheço o sortudo?
- Tenho certeza de que você não o conhece - resmunguei, tentando me desvencilhar dele, sem muito sucesso devido à minha fraqueza provocada pelo álcool - Agora solta meu braço, tá me machucando.
- Relaxa, Isabella - Paul pediu, sem me soltar, e eu já estava começando a me sentir realmente incomodada com aquele contato físico indesejado - Tá com medo de que eu te force a fazer alguma coisa, é?
- Me solta, por favor, Paul - implorei, olhando firmemente em seus olhos verdes semi-abertos - Eu quero ir embora.
- Ir embora? Agora? Mas por quê? - ele perguntou, ficando na minha frente e fazendo pressão com seus quadris contra meus joelhos fechados pra se encaixar entre minhas pernas - Logo agora que a gente ia começar a se conhecer melhor.
- Eu tô falando sério, me deixa sair daqui - falei, com a voz séria e um pouco mais alta que o normal, e quando minhas mãos foram na direção de seus ombros para afastá-lo de mim, suas mãos agarraram meus pulsos, praticamente me imobilizando, e fazendo com que a garrafa que ele segurava se espatifasse no chão - Me solta!
- Pára de resistir, eu sei que você também quer - ele sussurrou, chegando com seu rosto cada vez mais perto do meu apesar do meu recuo - Seu namorado não precisa saber.
Paul soltou meus pulsos e num milésimo de segundo suas duas mãos envolviam minha nuca e me puxavam na direção dele, tornando um beijo cada vez mais inevitável. Fechei os olhos, empurrando-o inutilmente pelo peito, e foi então que eu me lembrei do ponto fraco dos homens, e de que ele estava perfeitamente ao alcance dos meus joelhos.
Sem pensar duas vezes, dei uma joelhada caprichada em seus "documentos", imediatamente fazendo-o cair ajoelhado na minha frente. Desci da bancada e desesperadamente saí da cozinha, me afastando ao máximo daquele cômodo. Eu sabia que não devia ter bebido tanto, era sensível demais a álcool. Pensei em explicar minha situação à Kelly na intenção de conseguir ir embora, mas tinha certeza absoluta de que ela faria questão de me entregar numa bandeja a Paul assim que ficasse sabendo do acontecido. Cambaleando, acabei me trancando num cômodo do andar de cima, e por sorte escolhi a porta certa: a do banheiro.
Me encarei no espelho, e soltei um suspiro tenso. Eu estava corada por causa do calor e da adrenalina, levemente suada e um pouco descabelada. Lavei o rosto calmamente com a água fria, ficando um pouco mais lúcida, e o enxuguei com a toalha de mão, pensando em um jeito de sair daquele inferno. Minha única saída era tentar convencer Kelly a me deixar ir embora, e determinada a fazer isso, respirei fundo e abri a porta do banheiro, dando de cara com um garoto curvado e com cara de dor que acabava de subir as escadas.
- Você! - Paul exclamou, andando depressa até mim com uma fúria repentina, e eu voltei pra dentro do banheiro na hora. Tentei fechar a porta, mas ele se lançou pesadamente contra ela, conseguindo entrar facilmente.
- Pelo amor de Deus, pára com isso, me deixa sair! - gritei, tremendo da cabeça aos pés enquanto ele avançava na minha direção.
- Agora você vai se ver comigo - ele rosnou, totalmente fora de si, e me prendeu violentamente contra a parede, forçando um beijo doloroso e segurando meus pulsos com força. Dessa vez eu realmente não tinha como me mexer, estava prensada entre seu corpo e o azulejo frio, e quanto mais eu me recusava a beijá-lo, mais ele insistia.
Mantive meus olhos arregalados, esperando que alguém passasse pelo corredor e ouvisse meus gritos abafados, e logo vi uma sombra passar, sem conseguir ver quem era. O grito fino que não encontrava espaço em minha boca saía pelo meu nariz, ainda mais alto agora que eu sabia que havia alguém ali, e me debati com mais energia, até que subitamente o corpo de Paul não estava mais ali. Em um segundo, ele tinha ido parar fora do banheiro, caído no chão com um baque surdo. Quando finalmente assimilei o que tinha acontecido, vi que havia alguém me puxando pela mão na direção do andar de baixo, e eu apenas segui, ofegante e apavorada demais pra tomar conta de mim mesma.
As imagens se passavam como fotos em minha mente: primeiro Kelly reclamando vigorosamente com a pessoa que me guiava, depois a porta da mansão dos Smithers se abrindo, a porta do carona de um carro que eu não conhecia aberta na minha frente, e por último eu sentada dentro desse mesmo carro, enquanto a pessoa que tinha me levado até lá entrava pela porta do motorista. Totalmente desnorteada, franzi a testa quando vi quem estava sentado do meu lado.
- Você está bem? - Rafael perguntou, sem me olhar, enquanto colocava a chave na ignição. Não respondi nada, apenas continuei observando aquela cena. Eu ainda não acreditava que aquilo estava acontecendo, eu não acreditava que ele tinha realmente feito aquilo tudo, só podia ser invenção da minha cabeça. Não podia ser real, não fazia sentido ele ter me salvado.
- Isabella, você tá me ouvindo? - ele perguntou novamente, me encarando com firmeza. Por um segundo, tudo ficou ainda mais confuso quando aqueles olhos Castanhos se cravaram nos meus, mas depois as coisas pareceram voltar um pouco ao seu lugar, e eu consegui responder.
- Tô - murmurei, sentindo meu coração extremamente acelerado. Rafael ficou alguns segundos em silêncio, apenas me encarando, e logo depois voltou a olhar pra frente, balançando negativamente a cabeça em tom de desaprovação.
- Você é doida de se meter num lugar desses - ele disse, cerrando os olhos por causa do farol alto de um carro que passou por nós - As festas da Kelly são mais perigosas do que parecem. Elas misturam as pessoas erradas e as desavisadas no mesmo ambiente, fazem com que os desencaixados logo achem uma confusão da qual não possam se livrar antes de se arrependerem.
Ele deu uma pausa, enquanto eu mantinha meus olhos bem abertos e fixos nele. Como se quisesse reforçar mais ainda seu aviso, Rafael voltou a me encarar com uma conclusão:
- Aquela casa não é lugar pra você.
Sem esperar qualquer reação, ele arrancou com o carro, com a expressão fechada, e logo estávamos nos afastando rapidamente da mansão. Meus olhos teimavam em continuar presos a ele, tentando entender direito os últimos minutos. Por que ele tinha me livrado de Paul? Por que ele discutiu com Kelly antes de sairmos? E o principal...
- Pra onde está me levando? - ouvi minha própria voz perguntar, fraca, e só então senti que minha garganta ainda ardia pelo excesso de tequila.
- Eu pretendia te deixar na sua casa - Rafael respondeu, sem me olhar, e sem saber por que, eu quis que ele o fizesse - Mas você é quem sabe onde prefere ficar.
- Na minha casa está ótimo - concordei, tentando não forçar muito minha voz, e convenci meus olhos a se afastarem dele, pairando desatentamente sobre a barra de meu vestido. Minha visão ficou embaçada subitamente, e em poucos segundos senti lágrimas escorrerem pelo meu rosto. Não sei por que comecei a chorar, talvez fosse efeito da bebedeira exagerada e todos os recentes e horríveis acontecimentos. Funguei baixinho, enxugando discretamente meu rosto com as costas das mãos e virei meu rosto pra janela do carro.
As luzes da cidade passavam como borrões pela minha visão, e se tornaram imóveis quando paramos num sinal vermelho. Mesmo sem poder vê-lo, senti seu olhar sobre mim, mas não o correspondi. Estava com vergonha por estar chorando, eu odiava chorar na frente dos outros, me sentia ridícula.
- Tem certeza de que está bem? - ele murmurou, e eu fechei os olhos na tentativa de parar de chorar - Aquele garoto machucou você?
Senti uma lágrima insistente rolar rapidamente e passar pelo canto de minha boca, fazendo o local arder um pouco. Passei a ponta da língua ali e senti gosto de sangue, mas apenas fiz que não com a cabeça, respondendo à sua pergunta com um sorrisinho miserável que ele não pôde ver. A ferida física mal podia ser comparada ao trauma emocional que Paul tinha me causado naquela noite.
- Se você não tivesse aparecido, ele teria conseguido me machucar - falei baixinho, e me virei lentamente em sua direção. Não sei por que, mas assim que meu olhar fraco encontrou o dele, sempre tão sólido, eu me senti segura. Era como se tudo realmente fosse ficar bem, eu não precisava mais ter medo. Por mais ameaçador que eu sabia que Rafael podia ser quanto à minha relação com Fe, eu também o via como uma espécie de protetor disfarçado, sempre nos lugares certos e nas horas certas pra me ajudar. Já era a segunda vez que ele me salvava de uma enrascada em menos de uma semana.
- Talvez não - ele discordou, erguendo as sobrancelhas por um momento - Você tem muita sorte, duvido que ele conseguisse.
O sinal ficou verde e Rafael voltou a prestar atenção no trânsito. Abaixei meu olhar, com uma minúscula sombra de um sorriso triste no rosto, e suspirei profundamente. Aquele nem de longe parecia ser o mesmo Rafael que eu conhecia.
- A sorte passa reto por mim há algum tempo - eu disse, meio que pra mim mesma, voltando a encarar meus joelhos com desânimo - Tudo que tem acontecido comigo são desastres, um atrás do outro... Um pior que o outro.
Rafael não disse nada, apenas continuou dirigindo com a expressão dura. Sucumbi ao peso imaginário de minha cabeça, cuja dor eu ignorava há um bom tempo, e deitei-a no encosto do banco, fechando os olhos por um segundo.
E só voltei a abri-los quando a claridade do sol bateu em meu rosto, fazendo minha visão demorar mais ainda a entrar em foco. Num quarto estranho, numa cama estranha, e com uma voz conhecida.
- Bom dia, Santoni.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Biology
RomanceComo de um dia para o outro você se apaixona por a pessoa que você mais odiava ?! Isabella Santoni e uma estudante de 17 anos que é apaixonada pelo seu professor de biologia Felipe Simas . E odeia seu outro professor de biologia Rafael Vitti , mais...