Querido amigo,
Meu vestido branco está sujo, algumas manchas de sangue aqui e ali, manchas do meu sangue.
Eu não entendo mais nada, por que está tudo estranho, e dói de mais para ser algo que possamos simplesmente pensar ou explicar.
Meu peito arde, e eu não sei explicar como, por que eu não sei, eu não sei, não sei aonde estou, só sei que tenho um papel amassado e uma caneta na mão.
Eu não me lembro de tudo, ou lembro? Eu não sei, não sei.
Estou com medo, com raiva, com rancor afundado no fundo da alma.
Eu estava no baile, os lábios de Alexandre estavam nos meus, quando ele me pegou em casa, e meu vestido branco impressionou a todos que pensaram que eu estaria com um preto, mas agora ele tem respingos vermelhos, algumas folhas e lama, há partes que também estão meio rasgadas.
E eu também ri muito quando um balde de tinta rosa caiu no cabelo ridículo daquela menina, e ela saiu correndo, enquanto todos riam comigo, Alexandre riu mais ainda quando o disse que havia sido eu quem aprontei tudo aquilo, mas do nada, tudo se apagou no meio da musica lenta que dançávamos juntos, enquanto meu pescoço sentia os doces beijos dele.
E então um holofote se acendeu bem no meio da pista de dança, e lá estava uma menina com um vestido rosa lindo, ela parecia familiar, e eu descobri de onde a conhecia, quando outro holofote iluminou Alexandre e ela com um sorriso maravilhoso, correu na direção dele, o abraçando e beijando-o, ele estava surpreso mas mesmo assim sorriu.
Era a menina da foto, e algo em mim se apagou no meio do beijo dos dois, as lagrimas brotaram rápido e dessa vez eu não fiz o menor esforço para conte-las, eu o amava, ele disse que me amava.
Mas ela estava lá agora, e eu não sabia como, nem por que, mas o olhar dele se iluminou, o que se apagou em mim se acendeu nele de alguma forma, e eu não entendia, não entendo.
Mas minha mente voltava para Dezembro, quando na minha cama ele dizia que me amava, que realmente me amava, que me queria, voltava para Dezembro, para seus cabelos na minha cama de manhã enquanto eu te escrevia com um sorriso.
E eu sai correndo, eu empurrava todos que passavam perto de mim, eu apenas corri, corri por tanto tempo, corri pra qualquer lugar longe de mim, meus sapatos ficaram para trás em algum lugar, eu escutava Alexandre me chamando desesperadamente, por um tempo, mas eu não olhei para trás, e eu continuei correndo, era como se eu estivesse correndo do que eu vi, mas a imagem deles se beijando, do sorriso que os dois tinham, do jeito dos dois juntos, aquilo me cegava, e doía, como nada nunca doeu, como nunca doeu tudo no que aconteceu com meus pais, como nunca doeu todos aqueles cortes, como nunca doeu todos os dias sozinha, todos os dias cinzas da minha vida, como nunca doeu cada cicatriz deixada pelo orfanato.
E se eu fechasse meus olhos eu conseguia ver, ver tudo de novo, ver meu pai, ver o corpo da minha mãe, ver o orfanato, ver as garrafas de vodca no criado do meu quarto, ver os cigarros, ver a lamina.
Parecia que ele tinha se ido, mas ao mesmo tempo parecia como se ele nunca estivesse aqui de verdade, como se eu nunca tivesse percebido o olhar que carregava a saudade que ele tinha de casa.
Nunca passei de um caso de outro país.
E por isso eu não sei como, nem direito quando, mas eu afundei o mais fundo que podia um pedaço de vidro que estava no chão da rua, nos meus braços, nos meus pulsos, nas minhas pernas, e a cada momento tudo voltava a Dezembro, á Dezembro, sempre á Dezembro, eu me entreguei por completa, me dei a ele, ele me tinha, mas eu nunca o tive, e fui tão tola, tão tola, meu corpo dói, mas parece que algo dentro de mim dói mais ainda.
Por que o amor é tão horrível?
Eu não entendo.
Eu o odeio, e eu não entendo por que eu ainda o amo.
Com amor,
M.A.A
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Cartas Sem Remetente
Teen FictionDecidi escrever esse livro pra minha gêmea linda e maravilhosa. Pra quem gosta de AVDSI (as vantagens de ser invisível) esse livro vai ser perfeito. Uma pessoa assinando por: M. A. A escreve cartas para um amigo, como se fossem seu diário, conta...