Seis meses depois caso o presente continue intacto
Já era pra lá das duas horas da manhã, mas o que importa? Era sábado e estava de férias. Okay, tecnicamente domingo. Minha visão começava a incomodar por causa do cansaço e do sono enquanto eu lia mais um livro pelo celular. Ultimamente eu estava assim, tinha que ler um livro físico e um em ebook, quase como uma regra. A televisão transmitia uma luta a qual eu não havia nem passado os olhos e a ideia de assistir a possível chuva de meteoros foi por água a baixo por causa do céu extremamente nublado.
Suspirei.
Ao mesmo tempo que eu vinha evitando o Snapchat, também esperava involuntariamente por alguma foto na qual ele aparecesse. Hoje tinha uma festa escolar e havia amigas minhas na festa, então eu sabia da possibilidade de ele aparecer na história. E eis que lá estava, lá pelas 2 horas da madrugada conseguindo me tirar totalmente dos trilhos ao simplesmente aparecer em um vídeo engraçado. Aquilo foi a minha gota d'água. Arranquei o carregador do celular e quase corri para o meu quarto, me jogando na cama e já começando a soluçar. Chorei como não chorava há muito tempo, as lágrimas quentes escorrendo por meu rosto e a intensidade fazendo meu corpo tremer.
Eu não podia afirmar com certeza do porquê de estar chorando assim. Os últimos dias haviam sido horríveis, com um nível de mau humor elevado relacionado à minha falta de açúcar e carboidrato e uma confusão de sentimentos letárgica. Chorei porque sentia falta, porque estava com raiva, porque não conseguia me entender, porque não sabia se ele havia sentido falta de mim alguma única vez, porque precisava descarregar, porque foi necessário, porque sim.
Já fazia tanto tempo que tínhamos acabado. O normal era eu já ter superado, como todo mundo esperava - como eu esperava. E parecia mesmo que eu havia superado, já conseguia falar sobre ele com tranquilidade, já podia lembrar dos momentos sem chorar e quando tinha notícias suas ou via novas fotos só sentia o gelo no estômago, mas então era só isso. Então mal conseguia me entender porque estar chorando logo agora, quando as coisas pareciam ir bem. Sentia raiva por ainda ter sentimentos por ele, por ainda se importar tanto e principalmente por ainda chorar.
Podia mentir para todo mundo e até mesmo para o espelho, mas não podia me enganar. Não o tinha esquecido nem um pouco. E isso era o que mais doía. Quando isso iria passar? Estava passando dos limites.
Encolhi-me na cama e tentei controlar o choro. A única coisa que conseguia pensar naquele momento era o quanto sentia falta dele. Sentia falta de seu abraço forte, da maneira como em momentos me beijava como se eu fosse extremamente frágil e em outras com mais intensidade, do seu sorriso debochado, de seu jeito brincalhão e até da expressão que fazia quando estava zangado, de quando a erguia no ar por ser tão alto e até de todas suas implicâncias. Sentia falta pura e simplesmente dele, com todas as suas qualidades e todos defeitos.
Fiquei sendo torturada pelos pensamentos até cair no sono.
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Ponto e vírgula.
Cheguei em casa consideravelmente ensopada e sem dizer uma única palavra diante do olhar inquisidor da minha mãe. Subi as escadas correndo, tentando conter as lágrimas que chegaram sem serem convidadas. Tranquei a porta do meu quarto e sentei no chão com as costas apoiadas na parede. Abracei minhas pernas e deixei que as lágrimas caíssem livremente, sacudindo meu corpo a cada soluço.
Eu não sabia exatamente porque estava tendo essa reação. Tudo bem que eu sempre tive a torneira das lágrimas solta. Diante do medo, raiva, frustração, tristeza e até mesmo felicidade. Mas agora... eu estava confusa. Seria por causa da minha experiência de quase afogamento, por ter sido apresentada à uma parte do sobrenatural que nos espreita ou por ter visto o Nicolas pela primeira vez após nosso término e ter deixado nossa situação pior do que estava? Provavelmente por causa de todas essas opções juntas.
Minha cabeça estava latejando. Levantei, despi a roupa molhada e fui tomar um banho quente demorado.
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É loucura. Considerar essa proposta, considerar que tudo isso pode ser real é loucura. Há quem possa chamar de burrice também. Mas... e se só por um segundo eu pudesse considerar que é real? E se eu realmente pudesse voltar ao passado e mudar as coisas? É irônico pensar em todas as vezes que eu disse ou pensei algo como "se eu pudesse voltar ao passado e...", e agora que eu tenho a possibilidade em minhas mãos, eu sei que não faria nenhuma dessas coisas que completam a frase, eu não mudaria nada em minha vida, porque apesar de um ou outro detalhe, ela está ótima do jeito que está. Motivos como me esforçar mais em matemática e nos esportes não são motivos fortes o bastante para me fazer voltar ao passado e modificar isso. Eu também poderia evitar tragédias, alertar as pessoas certas, mas isso seria catastrófico, o que uma mudança tão grande como essa não poderia gerar? Se o simples fato de eu escolher um sabor de suco diferente cria uma linha de realidade paralela, uma mudança tão grande poderia abalar o mundo. Mas eu poderia ajudar alguém sem bagunçar a vida de todos. Uma das coisas que eu mais tive pensado nos dias recentes após Nicolas ter me contado tudo, foi o quanto eu gostaria de ajudar, o quanto eu gostaria de poder evitar que isso o acontecesse, mas não havia nada que eu pudesse fazer. Até agora.
É isso. Se essa chance realmente for real, eu irei voltar, encontrá-lo e impedi-lo de ver seu sonho sendo destruído aos poucos. Apesar de uma parte minha achar que ele não merece, eu ainda me importo, e não importa a raiva ou dor que eu possa sentir, eu sempre estarei disposta a ajudar.
É o certo, não é? Quero dizer, se eu tenho a chance de impedir que ele seja obrigado a largar o atletismo, eu farei. Não importa o que tivemos, foda-se isso, ajudarei como amiga. Como humana.
Deitei no chão. Isso é tudo tão insano.
Sentei abruptamente, acabando de notar algo. Aquela entidade, ser sobrenatural, sei lá como chamar, não mencionou se eu lembraria caso voltasse e mudasse algo. E nem se caso eu mude o passado de outras pessoas, elas lembrarão.
Então, eu só mudarei algo se ninguém puder lembrar, inclusive eu. Motivos: passaria tempo demais me torturando ao questionar se foi a escolha certa ou não.
*Olá, darlings! Duzentos anos para esse capítulo sair, mas finalmente está aí. E aí, o que acham, ela fez a escolha certa? Se vocês tivessem a oportunidade, fariam algo do tipo? Se tiverem gostado, o voto de vocês ajuda muito, obrigada! *
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Esboço do que Foi
De TodoE se você tivesse a chance de voltar no passado e mudar algo? E se esse algo salvasse o sonho de alguém ou até mesmo sua vida? Nunca pensou nisso? Yasmin recebeu essa chance, mas será que vale a pena arriscar suas lembranças, sentimentos e parte do...