Capítulo 9

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Ponto e vírgula.

Hoje era o último dia do prazo.

A semana passada transcorreu tranquilamente. Não tive qualquer alucinação. Conversei com um psicólogo e ele me explicou muitas coisas; Concordei em ir conversar com ele pelo menos duas vezes ao mês. Nenhuma outra conversa estranha com Henly, apenas meios sorrisos e olhares intensos quando me via. Tive que repetir a história do desequilíbrio no banheiro tantas vezes que até eu já estava acreditando. Agora os ferimentos já estavam quase sarados e os pontos foram removidos. Vitor me deixou em casa hoje após reafirmar várias vezes que qualquer coisa eu deveria ligar imediatamente.

Agora só me restava esperar até a meia noite. O que não seria uma espera longa, considerando que já eram 23h30.

Eu ainda não tinha certeza do que iria fazer. Como iria saber? Eu nem sei como isso funciona. Mas para prevenir, resolvi colocar uma peruca loira, óculos escuros e roupas estranhas em uma bolsa para o caso de eu ter que agir pessoalmente.

Eu estava tão absurdamente nervosa que sequer conseguia ficar sentada. Eu não tinha certeza se o nervosismo era por causa dessa loucura de viagem no tempo ou por sair escondida de casa pela primeira vez e ainda mais nesse horário e sozinha. Era mais que perigoso. Mas o que eu poderia fazer? Considerando meu histórico dessa semana, nem eu tinha certeza se estava em plena sanidade mental.

Coloquei uma roupa prática, que se resumia à jeans, camiseta e tênis, peguei minha bolsa e pulei a janela do meu quarto.

Dizer que eu andei o caminho toda olhando para todas as direções como se estivesse fugindo de alguma cena do crime era pouco. Achei que a essa hora as ruas estariam vazias, mas ainda havia alguns grupinhos de jovens bebendo ou voltando de festas, um ou outro bêbado caído pelas calçadas e também pessoas que eu sabia que não estabelecer contato visual era a melhor escolha. Não vi ninguém conhecido, o que foi um alivio. De casa até a praia devo ter levado de quinze a vinte minutos, então não foi uma caminhada muito longa.

A praia estava deserta, o que foi outro alivio. Ainda faltavam alguns poucos minutos para a meia noite, então fui me sentar bem próxima à água, sem me importar com me molhar. Eu estava tremendo. Respirei fundo e fiquei observando as ondas.

00h00.

A pedra em meu colar começou a brilhar forte.

Entrei no mar com roupa, bolsa e nervosismo mesmo. Quando me distanciei mais da praia, notei o brilho no fundo e nadei até lá. Tudo ficou escuro. Mais uma vez.

Dessa vez, quando voltei à consciência, não achei que tinha morrido ou algo do tipo. Estava exatamente no fundo do mar como da outra vez.

— Vejo que aceitou.

Aquela voz novamente. Eu ainda não fazia ideia do que se tratava, mas dessa vez podia distinguir que a voz era feminina.

— Quase. Antes, eu preciso saber de umas coisas antes de confirmar minha decisão.

— Prossiga.

— Quando eu voltar, se eu voltar, ao passado e mexer nas coisas, a Yasmin do passado terá consciência de que fiz isso? E a Yasmin, eu, de agora, me lembrarei de ter feito isso?

— A Yasmin do passado não fará a menor ideia do que aconteceu, mas as mudanças que você fizer alterarão a vida dela, sua vida. E quanto a Yasmin de agora, é decisão dela escolher se deseja ou não lembrar.

— E eu tenho que decidir isso agora?

— Não. Você encontrará um filtro dos sonhos em sua bolsa. Basta segurá-lo e desejar esquecer, tudo ou algumas partes. E então suas lembranças ficaram guardadas ali. É um objeto muito poderoso, então tenha cuidado. E só pode ser usado uma vez.

— Mas e se eu decidir tirar a memória de alguém? Se eu quiser me apagar da vida de alguém, as outras pessoas que sabem de nosso envolvimento lembrarão?

Eu estava realmente preocupada com isso.

— Se você escolher fazer com o que o Nicolas te esqueça, então todos irão esquecer também que vocês estiveram juntos, vão lembrar de você, só não vão lembrar de vocês juntos. A chave é apagar-se da pessoa certa.

Eu estava boquiaberta.

— Como você sabe do Nicolas?

— Apenas sei.

— Ok... Como isso funciona? Até agora não faço a menor ideia.

— Quando você decidir que irá fazer isso, então eu farei sua passagem, mas para voltar, estará por conta própria. Para voltar, basta você segurar a pedra em seu colar com força e desejar com todo o coração retornar para casa. Não há um tempo limite determinado, se quiser, pode ficar permanentemente lá, por isso a próxima informação é de muita importância que preste atenção.

Respirei fundo, tentando prestar atenção em cada palavra e não deixar nada escapar.

— Quando estiver lá, você e a Yasmin daquela época serão a mesma pessoa, como se você estivesse a substituindo. Então precisa ter muito cuidado, qualquer dano causado pode fazer com que você não venha a existir no futuro, ou seja, atualmente. E se decidir voltar, as duas se separarão, com a diferença de que ela não terá qualquer consciência disso, mas estará ciente de todas as coisas que faz, e já você terá consciência de tudo. Se decidir ficar, se tornarão uma só, e com a sua consciência do que aconteceu.

Caramba, isso realmente estava acontecendo.

— Entendi. — repeti.

— É preciso que você seja muito cuidadosa, Yasmin Genevieve, mexer com o tempo é uma tarefa muito complicada. Use seu poder com sabedoria. E com bondade. Nada de bom acontece quando se usa esta chance para o mal, como já aconteceu.

Digeri lentamente tudo aquilo que me foi dito. Eram muitas informações e realmente complexas. Mas eu já estava certa.

— Outra coisa. Como eu disse, você pode escolher dois momentos do passado, mas não precisa usar os dois de imediato, se quiser usar daqui anos, poderá. Tome cuidado com suas decisões.

Eu quase não sabia para onde ir na primeira, imagine na segunda.

— E então, já tomou sua decisão?

— Sim. Eu irei.

— Preciso que deseje com todo o seu ser a época em que deseja ir. Data, mês, ano e horário, tudo com precisão. Não importa se é anos atrás ou até mesmo ontem ou duas horas atrás. Se não é agora ou depois, é passado.

Fiz exatamente isso.

No exato momento em que terminei de desejar, senti-me ficando mais pesada, como se meu corpo estivesse realmente ali agora e a necessidade de respirar estava começando a surgir. A pedra em meu colar agora emitia um brilho cegante. Parecia que eu estava sendo empurrada por uma grande força, mas não dava para saber para qual direção.

Quando eu achei que meus pulmões iam explodir com a necessidade repentina de oxigênio, senti como se eu tivesse sido jogada para fora da água, emergindo para a superfície.

E então tudo ficou quieto.

Quando abri meus olhos, eu estava em meu quarto.

Para ser mais exata, eu estava no meu quarto, cinco meses atrás.








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