ERA UM DIA DE PRIMAVERA desses que trazem esperança: cheio de brisas
suaves e delicados aromas de terra aquecida. Tempo de suicídio. Daisy se
matara uma semana antes. Na certa eles achavam que precisávamos de
distração. Sem Daisy, a proporção equipe de funcionários/pacientes era mais alta
do que o habitual: cinco pacientes e três enfermeiras.
Descendo a colina, passando pelas magnólias, que já perdiam suas flores
carnudas, seu tom rosado amarelando e apodrecendo nas bordas; passando pelos
narcisos estorricados feito papel; passando pelos loureiros pegajosos, que tanto
podem coroar como envenenar você. Naquele dia, na rua, as enfermeiras
estavam menos nervosas, talvez porque a febre da primavera as tornasse
descuidadas ou porque – quem sabe? – aquele coeficiente funcionárias/pacientes
acabasse sendo mais cômodo.
O assoalho da sorveteria me perturbava. Era de cerâmica e formava
quadrados pretos e brancos, como um tabuleiro de xadrez, maior do que o
tabuleiro do supermercado. Se eu olhasse apenas para um dos quadrados
brancos, tudo bem; mas era difícil abstrair os quadrados pretos que cercavam os
quadrados brancos. O contraste me incomodava. Sempre me sentia
desconfortável na sorveteria. O chão queria dizer "sim", "não", "isto", "aquilo",
"em cima", "embaixo", "dia", "noite" – todas as indecisões e os opostos que, se
na vida já são ruins, ficam ainda piores assim, explicitados no chão.
Havia um garoto novo servindo o sorvete de casquinha. Nós nos aproximamos
dele em bloco.
— Queremos oito casquinhas – disse uma das enfermeiras.
— Tudo bem – disse ele. Tinha uma cara afável, cheia de espinhas.
Demoramos um bocado de tempo escolhendo os sabores. Sempre
demorávamos.
— Paçoca de menta – disse a namorada do marciano.
— O nome é menta – disse Georgina.
— Piroca de menta.
— Francamente! – disse Georgina, engatando a marcha para um protesto.
— Xoxota de menta.
Por conta disso, a namorada do marciano foi premiada com um beliscão de
enfermeira.
Ninguém mais quis menta; o preferido foi o de chocolate. Havia um novo
sabor de primavera: pêssego em calda. Foi a minha escolha.
— Você quer com nozes?
1 – perguntou o garoto novo. Todas se entreolharam:
devíamos pronunciar aquela palavra? As enfermeiras prenderam a respiração.
Lá fora, os passarinhos cantavam.
— Acho que não nos fazem falta – disse Georgina.
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Garota, interrompida
Chick-LitAS PESSOAS ME PERGUNTAM: como você foi parar lá? O que querem saber, na verdade, é se existe alguma possibilidade de também acabarem lá. Não sei responder à verdadeira pergunta. Só posso dizer: é fácil.