Tela de segurança

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— PRECISO DE AR FRESCO – disse Lisa. Estávamos sentadas no chão em

frente à sala das enfermeiras, como de costume.

Daisy ia passando.

— Me dá um cigarro – disse.

— Se vira, sua vaca – disse Lisa. E depois deu-lhe um.

— Que cigarro mais nojento – disse Daisy. Lisa fumava Kool.

— Preciso de ar fresco – Lisa tornou a dizer. Apagou o cigarro no carpete

marrom e bege e se levantou. — Ei! – disse, enfiando a cabeça pela porta

dividida em duas da sala das enfermeiras, que estava entreaberta. — Estou

precisando de um pouco de ar fresco, porra!

— Daqui a um minutinho, Lisa – disse uma voz lá dentro.

— Já! – Lisa bateu no batente que dividia a metade superior e a inferior da

porta. — Isso é ilegal. Vocês não podem manter uma pessoa fechada dentro de

um prédio durante meses. Vou chamar meu advogado.

Lisa volta e meia ameaçava chamar seu advogado. Ela tinha um advogado

indicado pelo tribunal, um cara de seus 26 anos, bonito, de olhos amendoados. Ele

não conseguira impedir sua internação. Chamava-se Irwin. Lisa alegava ter

trepado com ele algumas vezes, no tribunal, na sala onde os clientes consultavam

seus advogados.

Sempre que Lisa ameaçava chamar o advogado, a enfermeira-chefe se

interessava.

— O que foi, Lisa? – perguntou com uma voz cansada, debruçando-se no

peitoril.

— Quero um pouco de ar fresco, porra.

— Não precisa gritar – disse a enfermeira-chefe.

— Porra, de que outro jeito vou fazer com que prestem atenção na gente, aqui

neste lugar?

Lisa só chamava o hospital de "este lugar".

— Pois estou aqui, na sua frente – disse a enfermeira-chefe. — Estou

prestando atenção.

— Então já sabe o que quero.

— Vou pedir a uma atendente para abrir sua janela – disse a enfermeirachefe.

— Janela! – disse Lisa. Virou-se um instante para olhar para nós. – Não quero

saber de janela, porra.

Bateu de novo no peitoril. A enfermeira-chefe deu um passo para trás.

— Ou a janela ou nada, Lisa – disse.

— Janela ou nada – cantarolou Lisa.

Afastou-se alguns passos pelo corredor, para que todas, inclusive a

enfermeira-chefe, pudessem vê-la.

— Eu só queria ver como é que você ia se virar, em um lugar como este, sem

nunca respirar um pouco de ar puro, sem nunca poder abrir a própria janela,

porra, e com um bando de piranhas cheias de frescura dizendo o que você pode e

o que não pode fazer. Valerie, tá na hora do almoço; Valerie, não precisa gritar;

Valerie, hora do sonífero; Valerie, vamos parar com essa "atuação". Sabe como

é, não sabe? Ou seja, como é que você ia se virar? Me diz, porra!

O nome da enfermeira-chefe era Valerie.

— O que quero dizer é que você não aguentaria dez minutos neste lugar.

— Vaca de merda – disse Daisy.

— Quem chamou você? – disse Lisa, apontando o dedo para Daisy.

— Me dá um cigarro – disse Daisy.

— Dane-se – disse Lisa. Dirigiu-se à enfermeira-chefe. — Vou chamar meu

advogado.

— Tudo bem – disse a enfermeira-chefe, que era bem esperta.

— Você acha que eu não tenho direitos? É isso que você acha?

— Quer que eu faça a ligação?

Lisa agitou o braço para encerrar o assunto. — Não – disse. — Não, mas abre

a janela.

— Judy – chamou a enfermeira-chefe. Judy era uma jovem atendente loura,

que a gente gostava de atormentar.

— Valerie! – gritou Lisa. Só quando estava contrariada chamava a

enfermeira-chefe de Valerie. — Valerie, quero que você abra a minha janela.

— Estou ocupada, Lisa.

— Vou chamar meu advogado.

— Judy pode fazer isso.

— Não quero nenhuma vaca fresca dentro do meu quarto.

— Nossa, como você é chata – disse a enfermeira-chefe. Apertando a

campainha de segurança que destrancava a parte inferior da porta, juntou-se a

nós no corredor.

Lisa sorriu.

Para abrir uma janela, o funcionário tinha de destrancar a tela de segurança,

que era uma rede grossa e inexpugnável, presa a uma moldura de aço, depois,

levantar as pesadas janelas de vidro inquebrável e fechar e trancar de novo a tela

de segurança. Isso levava uns três minutos e era um trabalho árduo. Era uma

função típica para os atendentes. Depois de aberta a janela, o ar entrava pela tela

de segurança, desde que houvesse brisa naquele dia.

A enfermeira-chefe voltou do quarto de Lisa, um pouco corada pelo esforço.

— Pronto – disse. Bateu na porta da sala das enfermeiras, pedindo que

apertassem a campainha e a deixassem entrar.

Lisa acendeu mais um cigarro.

— Sua janela está aberta – disse a enfermeira-chefe.

— Estou sabendo – disse Lisa.

— Você não vai nem entrar lá, não é? – disse ela suspirando.

— Olha, cara... – disse Lisa. — Isso ajuda a passar o tempo. – Por um

segundo, encostou a ponta acesa do cigarro no braço. — Não viu? Levou vinte

minutos, meia hora, talvez.

A campainha soou, a enfermeira-chefe abriu a porta, entrou e se debruçou de

novo no peitoril.

— É verdade, ajuda a passar o tempo – disse.

— Me dá um cigarro – disse Daisy .

— Dane-se, sua vaca! – disse Lisa. Depois lhe deu um


Garota, interrompidaOnde histórias criam vida. Descubra agora