Capítulo 30 - Parte 2

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Regina inspirou profundamente. Aquilo significava que ela nunca mais veria Emma ou Henry. Tentou não pensar naquilo, e disse:

– OK. Só tenho uma última pergunta... Outra regra da magia é que não se pode mudar o passado. Então por que nós estamos aqui?

Blue Fairy olhou-a como se pensasse no que responder.

– Bem... Digamos apenas que eu sou mais poderosa do que vocês pensam.

Regina descia as escadas de seu quarto, que terminavam em uma cozinha ampla de onde ela ouvia vozes extremamente familiares.

Assim que pisou no último degrau, avistou seus pais sentados à enorme mesa de madeira, comendo alguns pães. Seu coração acelerou e seus olhos começaram a marejar, pois pensou que nunca mais os veria.

– Bom dia, querida. – disse seu pai, levantando-se e andando até ela. – Fico feliz que tenha acordado mais cedo, pois temos muito a fazer...

Regina interrompeu-o com um forte abraço, que nunca imaginou que sentiria novamente, e lágrimas lhe escaparam aos olhos. Henry parecia assustado.

– O que aconteceu? – ele perguntou, confuso.

Regina se afastou dele e disse:

– Eu... Eu tive um sonho horrível. Eu sonhei que vocês dois estavam mortos, e... Céus, estou tão aliviada.

Cora se levantou da mesa e andou até ela, segurando suas mãos.

– Não precisa chorar, Regina. – ela disse. – Foi apenas um sonho. Nós dois estamos bem. Agora, você deveria se vestir. Vou deixar você ter algumas aulas de cavalaria com Daniel hoje.

Regina sorriu, de início surpresa por sua mãe permitir que ela cavalgasse – Cora nunca gostara que Regina gastasse seu tempo com aquilo. Mas logo se lembrou do que Blue Fairy dissera - aquele era o dia em que ela salvaria Snow do cavalo propositalmente desgovernado por Cora; Logo, ela precisava que Regina estivesse no lugar certo quando isto acontecesse.

Tentando não pensar naquilo, Regina foi até seu quarto novamente e vestiu seus trajes azuis de cavalaria. Calçou um par de botas e amarrou seus cabelos em uma trança, decidindo aproveitar a chance que recebera.

Logo, ela e seu pai saíram da casa e atravessaram as cercas da propriedade, chegando ao largo espaço coberto por grama onde havia uma pista de obstáculos. Mais adiante, Daniel esperava por eles com o corcel Rocinante ao seu lado.

Regina correu até Daniel, sentindo algo crescer dentro dela. Seu coração acelerou e ela sentiu arrepios quando jogou as mãos ao redor de seu pescoço, tocando seus cabelos claros e macios, e aproximou-se para um beijo quente e suave. Daniel passou os braços ao seu redor. Mesmo depois de tanto tempo, ela ainda reconhecia cada detalhe de seu toque e de seus lábios, como se nunca houvesse ficado longe dele. Após vê-lo morrer em seus braços, ela passara anos sendo torturada pela certeza de que nunca mais o veria, e agora era envolvida por ele novamente – sentiu-se tão sortuda que quase não acreditou que tudo aquilo estava realmente acontecendo.

Mas havia algo de diferente em seu beijo, ela notou, como se já não fosse tão satisfatório quanto costumava ser. Regina supôs que isso se devia ao fato de ter passado tanto tempo sem beijá-lo. Seus lábios eram suaves, tinham um sabor adocicado e seu beijo era delicado, diferente da intensidade e ardor dos beijos de Emma. Ao lembrar-se de Emma, perguntou-se, culpada, se aquilo não seria traição. Mas lembrou-se de que elas não estavam tecnicamente juntas quando ela morrera, e, além disso, Emma não existia naquela nova realidade.

Sentiu-se injusta por pensar em outra pessoa enquanto beijava Daniel, e tentou ignorar aqueles pensamentos. "Esqueça Emma, Regina", pensou. "Você nunca mais a verá. Aproveite o que tem agora".

Foram interrompidos por seu pai, que pigarreou alto próximo a eles. Regina afastou-se de Daniel e olhou para ele.

– Vocês dois precisam tomar mais cuidado – disse Henry. – Sua mãe não pode, sob hipótese alguma, descobrir que estão juntos.

– Sinto muito, senhor. Não tinha a intenção de passar dos limites. – disse Daniel, e sua voz acalorou um pouco o coração de Regina.

Logo, Regina montou Rocinante e começou a cavalgar, sentindo o vento em seu rosto e uma sensação de liberdade que não experimentava há muito tempo. Pegou-se pensando que Henry provavelmente gostaria muito de cavalgar, e em seguida puniu-se mentalmente por pensar nele.

Mais tarde, após o almoço, ela e Daniel cavalgaram juntos até uma região afastada da fazenda, onde não corriam o risco de serem vistos por Cora. Sob a sombra fresca de uma árvore alta e um céu levemente nublado, os dois conversavam e se beijavam. E Regina percebia, com uma ansiedade crescente, que o momento em que tudo tivera início se aproximava.

– O sol está abrindo. O que acha de fazermos um piquenique? – sugeriu Daniel. Exatamente como ela se lembrava.

– Eu não posso. – respondeu Regina, calculando bem as palavras. – Eu tenho que voltar em uma hora para tomar chá com a minha mãe.

Daniel assumiu uma expressão desapontada, e se afastou dela.

– Isso é tudo o que teremos? Beijos rápidos entre o almoço e o chá? Quando você vai contar a ela sobre nós?

Ele suspirou profundamente, fazendo Regina se sentir culpada.

– Eu não entendo. – continuou. – Eu trabalho nos estábulos e ela começou como a filha de um moleiro, ela deveria entender.

– Ela entende! – defendeu Regina. – Mas ela acha que a trajetória de uma pessoa deve ser subir, e...

– Eu estou abaixo. – concluiu ele.

– Ela acredita que sim, Daniel, mas eu sei que não.

– Conte a ela, Regina. – insistiu ele. – Ela vai superar. O que ela pode fazer?

– Eu contarei, Daniel. – garantiu Regina, assumindo aquilo como uma promessa. – Mas no momento certo. Ela tem uma magia muito poderosa, e eu venho pensando em uma forma de, você sabe... Amansá-la.

– Eu não ligo para a magia dela. O amor verdadeiro é a magia mais poderosa de todas. Ele pode superar qualquer coisa.

Regina sentiu-se hipnotizada pela forma como ele disse aquilo, sua voz confortante e seu jeito otimista de encarar as coisas. Mas quando ele disse aquilo sobre o poder do amor, surgiram em sua mente imagens de Emma nas diversas vezes em que elas fizeram magia juntas. Sorriu ao lembrar-se daquilo, mas ao se dar conta de que eram memórias inalcançáveis, voltou a se concentrar em Daniel.

Enquanto estava distraída em seus pensamentos, ouviu uma voz familiar pedindo por socorro, e seu coração deu um salto. Era Snow.

Respirou fundo e olhou para o lado. Aquela era a atitude decisiva, que mudaria tudo. Avistou a garota passar voando sobre um cavalo que corria descontroladamente. Olhou para Daniel, que estava assustado, e montou Rocinante.

Selou o cavalo e fez sinal para que ele corresse. Cavalgou em alta velocidade até se aproximar dela, com medo de que pudesse fazer algo errado. No entanto, ao aproximar-se de Snow, pediu a mão da garota e tirou-a do cavalo desgovernado com sucesso. Segurou-a em seus braços, e quando Rocinante parou, Snow caiu no chão.

Regina aproximou-se dela e levantou-a com cuidado.

– Está tudo bem, querida, você está a salvo. – disse.

– Você salvou a minha vida! – exclamou a garota, seu olhar inocente e assustado que não fazia ideia dos anos de dor, ódio e inimizade que aquele encontro poderia gerar. Sua pele clara suava, e olhando em seus olhos cinzentos, parecia quase inacreditável para Regina pensar que ela havia encarado aquela garotinha como sua pior inimiga por anos. Mais engraçado ainda era pensar que aquela garota cresceria para dar à luz ao amor de sua vida. Droga, pensou. Tudo o que acontecia parecia levá-la a pensar em Emma.

– Você está bem? – perguntou-lhe.

– Sim. – ela respondeu, ainda atônita e ofegante, alisando seu grosso casaco cor de rosa. Segurou as mãos de Regina e completou: - Mas eu nunca vou cavalgar novamente.

Regina sorriu.

– O único jeito de superar o seu medo é encarando-o. Voltando a montar naquele cavalo o mais rápido possível.

Regina deu-se conta de que era fácil aconselhar, mas muito difícil seguir o que ela acabara de dizer. Encarar seus medos ainda era algo que ela tinha muita dificuldade em fazer.

– Obrigada. – sussurrou Snow.

As duas se apresentaram e se abraçaram, enquanto Regina se lembrava, nervosa, de que no dia seguinte o pai dela pediria sua mão em casamento. Ela precisava começar a agir logo.

No silêncio da noite, ouvindo o estridular dos grilos no pasto, Regina saiu de seu quarto e, cuidadosamente, desceu as escadas, encaminhando-se para a sala de estar.

Entre as colunas de pedra e candelabros apagados, olhou para a lareira que crepitava ao fundo. Concentrando-se bem, pôde ouvir o pulsar dos corações abaixo dela.

Fez um movimento com o braço esquerdo, e as lenhas cobertas de chamas se afastaram para trás, como se afundassem na parede. O chão onde ela estava ergueu-se como um alçapão, revelando uma escada larga que descia. Regina olhou ao seu redor, apreensiva, e desceu as escadas.

Logo chegou ao espaço fracamente iluminado por candelabros altos, onde, em buracos nas paredes de pedra, pontos vermelhos piscavam dentro de caixas – os corações que sua mãe arrancara.

Havia algumas colunas brancas de mármore distribuídas pelo local, e ela avistou uma estátua ao fundo, de uma figura feminina – talvez uma santa, ou uma deusa – e lembrou-se do que Blue Fairy dissera. Era ali que o coração da mãe se escondia. Por algum motivo, aquela escultura sempre havia chamado sua atenção, mas ela nunca soubera o motivo. Agora ela sabia.

Mas como ela poderia tirar algo de dentro da estátua? Começou a pensar, encarando o rosto da figura retratada.

Fechou os olhos e concentrou-se. Em seguida, esticou o braço direito, apontando-o para a escultura. Quando abriu os olhos, a figura havia se desgrudado de seu pedestal e flutuava a alguns centímetros do chão. Olhando para baixo, Regina notou que o suporte de madeira era na verdade uma caixa. Abaixou-se para abri-la, mas não conseguiu.

Perguntou-se o que Cora usaria para selar a caixa onde guardava seu coração. Provavelmente magia de sangue, concluiu. Regina mordeu a ponta do dedo indicador com força, até sentir pequenas gotas de sangue saindo. Depois, passou o dedo por toda a extensão da caixa. Se aquilo não funcionasse, ela não saberia mais o que fazer.

Mas logo a caixa se iluminou como um raio de sol, e se abriu. Quando sua tampa foi erguida magicamente, Regina pôde ver o coração vermelho-cereja da mãe, levemente escuro, sua luz piscando conforme ele pulsava.

Respirando pesadamente, apanhou o coração com as duas mãos, sentindo-o bater entre seus dedos. Levantou-se e subiu vagarosamente as escadas, seu manto arrastando-se pelo chão. Ao chegar à sala novamente, fez outro gesto suave para fechar a passagem. A lareira surgiu novamente e a passagem se fechou. Regina girou nos calcanhares, dirigindo-se ao quarto dos pais.

Nervosa com o peso simbólico do que carregava, ela andou por alguns corredores até chegar frente à porta estreita de madeira, ciente de que aquela seria a parte mais difícil.

Abriu a porta lentamente, agoniada com o leve rangido que as dobradiças produziram.

Seus pais dormiam pesadamente na espaçosa cama, sob cobertores de cetim, e, felizmente, Cora estava virada para cima. Aproximou-se da cama em passos lentos e leves, tentando fazer o mínimo de barulho possível com seus pés descalços.

Encarou Cora, cujos cabelos castanhos acobreados estavam soltos sobre o travesseiro, suas mãos cruzadas sobre a barriga. Olhou para o coração, e decidiu agir rápido, antes que o som de seu latejar despertasse-os.

Abaixou a mão e, em um movimento rápido, afundou-a no peito esquerdo de Cora, soltando o coração. Assim que tirou sua mão do peito da mãe, ela despertou, abrindo os olhos e ofegando pesadamente.

– O que você está fazendo aqui? – exclamou ela, enquanto Henry ainda roncava, sem qualquer sinal de interrupção do sono.

– E-eu... Eu tive outro pesadelo. – gaguejou Regina, assustada. – E vim até aqui por que... Fiquei com medo.

– Não acha que é um pouco velha demais pra isso? – perguntou Cora. – Volte para o seu quarto. Minha época de ninar bebês chorões já passou.

Fria e dura como sempre, notou Regina. Sendo assim, será que ter seu coração de volta no lugar faria algum efeito? Ela própria fizera coisas terríveis por um bom tempo com o coração no lugar, pensou, embora sempre procurasse fazer o que era melhor para Henry...

Tentando não pensar em Henry, ela virou-se, pronunciou um pedido de desculpas e foi embora.

Contanto que Cora não percebesse que estava com seu coração de novo, ela pelo menos teria uma chance de mudar seu destino. Felizmente, mesmo quando uma pessoa estava sem seu coração, o peito esquerdo continuava pulsando magicamente, como uma forma de "disfarce", então provavelmente Cora não notaria que o pulsar em seu peito vinha de um coração de verdade.

Quando Regina deitou-se na cama novamente, começou a rezar para que alguma força superior ou divina fizesse tudo dar certo, mesmo que não fosse muito de acreditar nessas coisas. E percebeu que seu primeiro dia tinha acabado. Só tinha mais 48 horas para consertar tudo e decidir se queria aquela nova vida.

Fechou os olhos, e teve uma noite repleta de sonhos sobre Emma e Henry.

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