Capítulo 29

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– Regina...

– Eu ouvi tudo. – disse ela, a voz pesarosa. – Eu estava aqui o tempo todo, invisível.

Pela expressão de Regina, Emma deduziu que ela estava pensando naquela hipótese que ela tanto temia.

– Você não tem que morrer, Regina. – disse ela, se aproximando. – Nós sairemos da cidade. E se você quiser, pode vir conosco.

– Eles vão sair e perder suas memórias de novo? Não é justo, Emma. – rebateu ela. –Todos vocês já tiveram suas vidas alteradas vezes demais por minha causa. E só estão aqui hoje por minha culpa. Sou eu quem tem que consertar isso.

– Regina, não...

Emma correu até ela para segurá-la, mas Regina foi mais rápida; correu até o círculo desenhado perto do poço e lançou uma barreira mágica ao seu redor, uma espécie de redoma. Ao tentar passar por esta redoma, Emma recebeu um leve choque no ombro e não conseguiu mover-se para mais perto dela.

– Eu traí a sua confiança, Emma. – falou Regina, enquanto lágrimas caíam por seus olhos. Emma odiava aquelas lágrimas mais do que odiava seus piores inimigos. – Você acreditou em mim inúmeras vezes, e eu desperdicei todas as chances, por causa de defeitos dos quais não consigo abrir mão. Talvez esta seja a única maneira de provar que eu realmente me arrependo de tudo.

– Não é! – exclamou Emma, começando a chorar também, as palavras saindo uma atrás da outra, carregadas de desespero. – Eu acredito em você, Regina, eu acredito! Não precisa fazer nada para me provar que mudou, ok? Eu sei que você mudou. Eu fui uma idiota, me desculpe. Eu te abandonei em um momento de fraqueza, te dei as costas quando você mais precisava de mim...

– Você só estava preocupada comigo – respondeu Regina. – Porque você me ama. Eu entendo isso, porque eu te amo também.

– Eu não agi como alguém que te ama – insistiu Emma, e quanto mais Regina se culpava, mais dor ela sentia. – Eu agi como uma egoísta. Eu deveria ter ficado e te apoiado, te ajudado a resistir ao seu lado mau, me desculpe, me desculpe...

– Você não tem que se desculpar. Eu sou a única aqui que precisa mostrar redenção. Sinto muito que as coisas tenham chegado a este ponto.

Emma já estava soluçando, seus olhos inchados. Não poderia suportar aquilo.

– Você não pode fazer isso, mãe – falou Henry. – Eu preciso de você. Nós precisamos.

Regina olhou para o chão ao ouvir aquilo, aparentemente sofrendo demais para conseguir encarar o filho.

– Eu sei, Henry. Mas vocês são fortes. E, uma vez... Alguém muito especial me ensinou que é preciso fazer sacrifícios por um bem maior – disse, um pequeno e tímido sorriso se esboçando em meio ao oceano de tristeza que era seu rosto. – E ela estava certa. Isso foi apenas uma das coisas maravilhosas que eu aprendi com ela.

Emma lembrou-se de quando dissera aquilo a Regina, sentada em seu quarto. Mesmo aquela época em que Regina estava com suas memórias alteradas parecia um maravilhoso sonho deixado para trás.

Naquele dia, dizer-lhe que era preciso fazer sacrifícios parecera algo favorável e certo – agora, a frase era uma culpa que a consumia. Sentia-se como se estivesse sangrando por dentro, as lágrimas inundando cada vez mais seus olhos enquanto encarava uma possibilidade tão dolorosa que ela nunca realmente pensara em encarar. Ajoelhou-se frente à redoma, suplicante, e disse:

– Você não tem que levar a sério tudo o que eu digo, está bem? Eu não quis realmente dizer aquilo, e eu não estou certa o tempo todo. Você não precisa se sacrificar, Regina... Por favor... Saia daí, e eu posso te dar mais uma chance. Posso te dar quantas chances você precisar. Só não nos deixe.

– Você só diz isso agora porque está desesperada. Mas nós duas sabemos que isso é o certo a se fazer. E pela primeira vez, Emma... Eu estou pronta para morrer. Pelo bem de vocês.

– Mas se você morrer, como Henry e eu poderemos ficar bem? – indagou ela, enquanto tentava, em vão, penetrar a barreira mágica ao redor de Regina, levando mais e mais choques, mas a dor dentro dela era tão grade que mascarava sua dor física.

– Para de fazer isso, Emma! Eu não quero que você se machuque!

– Você não quer que eu me machuque, mas eu tenho que te ver morrer na minha frente? Isso não é justo, Regina, não é justo! – exclamou, dizendo aquilo mais para o universo do que para Regina. Tudo que a envolvia era terrivelmente injusto. Ela se sacrificara tantas vezes por eles antes, e ainda assim continuava sempre encarregada da pior parte. E agora Emma se sentia culpada, porque talvez, se ela não houvesse desistido de Regina, ela não sentiria que precisava morrer.

– Por favor, Emma. – disse Regina, enxugando suas lágrimas. – Eu sei que é difícil aceitar, mas você sabe que é o único jeito. Wilma já escreveu o final da nossa história, e infelizmente, não é um final feliz.

Emma balançou a cabeça, negando-se a aceitar. Não iria simplesmente deixar que Regina morresse. Tinha que lutar por ela até o último segundo.

– Não é o único jeito – insistiu ela. – Nós podemos sair da cidade.

– Eu já disse que não quero que todos percam suas memórias por minha causa mais uma vez. Não conseguiria carregar mais essa culpa em meus ombros.

– Mas talvez haja alguma forma de fazer com que eles saiam com suas memórias intactas. Podemos ir até a sua cripta e encontrar algum feitiço, alguma coisa...

– Isso levaria tempo e muito trabalho. Dois luxos aos quais não podemos nos dar agora. O raio vai chegar em trinta minutos. Essa é a única opção restante.

Emma ajoelhou-se no chão, chorando como uma criança conforme a terrível conclusão de que Regina estava certa sobrepunha sua negação. Ela nunca imaginou que um dia as coisas chegariam àquele ponto; ao ponto de ter que deixar Regina morrer, sem poder fazer nada para impedir. Recusava-se a acreditar que aquilo fosse verdade. Fechou os olhos, desejando que aquilo fosse apenas um pesadelo, que ela pudesse acordar e ter Regina ao seu lado para sempre... Mas quando abriu os olhos, tudo continuava igual.

– Onde está Neal? – perguntou Regina, e Emma olhou para ela, confusa. Neal andou até perto da prefeita, com a camada mágica separando-os.

– Você promete que vai cuidar de Emma e Henry por mim? – pediu ela, os olhos vermelhos.

– Regina, você não tem que...

– Promete? – repetiu, com uma leve irritação na voz.

Neal olhou para Emma, entristecendo-se com a dor dela.

– É claro. – disse ele – Eu prometo.

Regina olhou para Emma, sentada no chão, e para Henry.

– Vocês dois mudaram minha vida. – disse ela, sorrindo. – Obrigada. E, por favor... Tentem seguir em frente sem mim.

Emma balançou a cabeça em negação. Como ela poderia seguir em frente sem Regina?

– Eu atravessei o inferno por você, Regina. Não posso simplesmente seguir em frente sem você do meu lado.

Mas Regina não a respondeu.

No céu, uma tempestade de raios teve início, luzes piscando nas nuvens escuras antes do esperado, como que para adiantar o sofrimento de Emma. Emma levantou-se, dizendo "não, não, não" repetidamente.

– Para todos vocês que, algum dia, sentiram dor ou perderam entes queridos por minha culpa – disse Regina enquanto olhava para o céu, seus olhos marcados pelo temor. – Eu sinto muito.

Logo após Regina dizer aquilo, um relâmpago enorme cortou o céu e desceu até o chão. Eles foram atingidos por uma luz ofuscante e um som ensurdecedor, acompanhado por um grito de Emma – um grito desesperado e rouco de dor e desespero infinito. Um grito que ecoou pelo ar quando a luz se dissipou, mostrando o corpo de Regina caído no chão adiante, sem vida.

Emma correu até ela, como se ainda acreditasse que ela pudesse estar viva, seu coração recusando-se a aceitar o fato insuportável que ela encarava.

Tocou o rosto branco de Regina enquanto chorava como nunca chorara antes. Era de se esperar que seu corpo fosse carbonizado pelo raio, e, no entanto, ele estava intacto, como que para tornar tudo ainda mais doloroso.

Emma perguntou-se porque seu coração ainda estava batendo, enquanto tocava o vazio no peito de Regina. Não parecia lógico, não fazia sentido que ela ainda estivesse respirando quando nunca mais sentiria a respiração de Regina. Como seu coração poderia estar pulsando se a sua alma estava morta sob ela?

De repente, tudo de doloroso que Emma já vivera até aquele momento parecia tolo. Crescera em um orfanato, sentira-se abandonada por Neal, passara anos na cadeia, mas tudo aquilo não era absolutamente nada comparado ao sofrimento que sentia agora.

Emma começou a chorar alto, como uma criança que cai de um brinquedo em um playground, seu rosto completamente tomado pelas lágrimas e secreções de sua dor. Seus pais se aproximaram, mas ela afastou o toque deles. Virou-se para o lado e viu Henry, que também chorava desesperadamente. Os dois se abraçaram fortemente; Henry era a única coisa que podia oferecer-lhe algum resquício de conforto naquele momento. Enquanto ouvia o choro de Henry, vendo o garoto devastado por perder a mãe, seu sofrimento aumentou ainda mais, bem como a sua dúvida de que um dia fosse superar aquilo. Não era somente Regina que havia morrido; algo no coração de Henry certamente morrera junto com ela, e por isso, duas metades do coração de Emma estavam completamente despedaçadas. A família deles jamais estaria completa novamente, pensou. Meses antes, ela estava com uma sensação de vazio, como se houvesse algo faltando em sua vida. Agora, aquele sentimento voltara, mas não havia mais nada para preenchê-lo. Dali para frente, a sensação de que algo estava incompleto iria acompanhá-la para sempre.

Neal aproximou-se de Henry e tocou o ombro do garoto. Emma permitiu que o garoto abraçasse o pai, entre soluços. Aproximou-se mais uma vez de Regina, encarando o vazio em seus olhos que outrora foram cheios de glória. A única vez em que ela sentira uma dor comparável àquela foi quando pensou que Henry iria morrer. Mas ainda assim, aquela dor havia sido temporária; Henry logo acordara para descobrir que a maldição se quebrara. Mas agora, não havia como desfazer a ausência de vida em Regina. Ela não iria acordar com um beijo de amor verdadeiro. Não acordaria nunca mais.

Emma aproximou-se de seu rosto e deitou-se sobre ele, abraçando o corpo de Regina. Ela poderia beijar seus lábios, mas nada aconteceria – já não sentiria mais o calor de seu beijo em resposta, a eletricidade de sua boca, seu hálito quente. Não ouviria mais sua voz reconfortante, sua risada tão prazerosa. Nunca mais veria aquele sorriso jubiloso. Jamais receberia o calor de seus braços como resposta àquele seu abraço insistente.

Emma continuou a chorar, perguntando-se se, algum dia, as lágrimas cessariam. Parecia impossível conseguir viver sem ela, e se não fosse por Henry, Emma poderia continuar ali para sempre, abraçada a Regina, fingindo que ela estava dormindo e que logo acordaria com seu sorriso maravilhoso. Emma demorara tanto tempo para encontrar o amor verdadeiro, e agora a melhor parte de sua vida não era nada além de lembranças dolorosas e fantasias distantes.

O pior de tudo era saber o quanto ela havia lutado por Regina, o quanto sofrera e fizera de tudo para tê-la de volta, apenas para aproveitá-la por alguns dias e depois vê-la morrer. Para deixar que Wilma vencesse.

Bem, mas Wilma não tinha vencido em tudo, concluiu. A bruxa dissera que Regina não iria se sacrificar, que ela iria ceder ao seu egoísmo, que Emma morreria com a certeza de que Regina não a amava. E no entanto, ela se sacrificara por todos eles. Mas aquilo só servia para tornar tudo ainda mais doloroso - ela tinha a certeza de que Regina sempre a amara, mas de que isso adiantava se nunca mais conheceria aquele amor? Naquele momento, a derrota lhe parecia muito mais sedutora.

Perguntou-se como tinha sido capaz de abandonar Regina, dois dias antes. Emma tivera aquela mulher ao seu lado, pudera usufruir todo o seu toque, seu carinho, o amor daquela pessoa maravilhosa capaz de sacrificar a própria vida por sua família, e lhe dera as costas – como fora capaz? Como pudera abandonar aquela pessoa tão inacreditavelmente especial? Como pudera permitir que ela partisse desta vida considerando-se culpada?

Emma ergueu a cabeça e separou-se de Regina. Começou a bombear seu peito, em tentativas nulas e levianas de trazê-la de volta.

– Façam algo! – gritou ela, agonizando de dor. – Façam algo! Temos que trazê-la de volta, rápido!

Regina dissera para Emma seguir em frente sem ela, mas naquele momento, ela não queria seguir em frente. Queria tê-la consigo bem ali, para sempre. Qualquer outra opção parecia insuportável e inaceitável. Seguir em frente sem Regina, viver sem ela, tentar esquecê-la, parecia quase desrespeitoso.

Emma ouviu passos atrás de si, e virou-se para encarar, entre suas lágrimas, a Madre Superiora em um vestido azul. Ela não disse nada – apenas olhou para Regina caída no chão e para a expressão dolorosa de Emma. Em seguida, tirou sua varinha mágica do bolso interno do casaco.

– O que você vai fazer? – questionou Emma, com sua voz embargada e impaciente.

A mulher não respondeu; apenas ergueu a varinha sobre Regina, e uma luz forte irradiou do objeto. Por um segundo, Emma teve uma leve esperança de que ela fosse trazer Regina de volta – mas logo se lembrou, pesarosa, de que era impossível trazer os mortos de volta à vida.

Continuou chorando sobre seu verdadeiro amor, sobre a mulher que mudara sua vida, suas últimas palavras permanentemente marcadas em sua mente, enquanto observava aquela luz mágica aumentar gradativamente, seu coração sendo consumido por uma dor que nunca desapareceria.

Give Me LoveWhere stories live. Discover now