Capítulo 7

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Quando entrei no carro, me dei conta de que os homens não usavam capuz nem nada que escondesse seus rostos. Ou seja, dificilmente eu sairia viva daquela situação. Não quis encará-los, mas nem foi preciso. Com uma olhada rápida, percebi que seus rostos tinham traços muito semelhantes aos de Simon. Seriam eles da organização criminosa que o havia recrutado? Em minha cabeça, apenas a palavra sim. Fiquei ainda mais nervosa. Eles não disseram nada. Pelo menos não para mim. Mantinham entre si uma conversa bastante agitada em um idioma totalmente novo para meus ouvidos. Acho que levamos mais de uma hora para chegarmos ao nosso destino. Eles também não se preocuparam se eu iria reconhecer o lugar para onde estávamos indo ou o caminho que nos levava até lá. Um pouco distante de onde paramos, havia uma enorme casa. Estávamos numa espécie de sítio. À minha frente, uma espécie de cabana. Um dos homens segurou meu braço e me arrastou para dentro daquele lugar. Havia apenas uma cadeira. Nada mais. Ele me forçou a sentar nela e me amarrou. Não entendi bem o motivo, mas esse homem também vendou os meus olhos e me amordaçou. Não fez muito sentido porque eu já tinha visto seus rostos. Eles saíram da cabana e fecharam a porta. Aquele era o meu cativeiro.

Mesmo vendada pude sentir quando o dia amanheceu. Passadas algumas horas, senti algo encostando em minha pele e uma dor quase insuportável. Não demorou muito para que eu sentisse minha pele queimar. Pelo cheiro, parecia alguém apagando um cigarro em meu braço. Ele repetiu o gesto por algumas vezes e, em todas elas, senti uma dor muito forte. Depois, alguém colocou algo sobre meu colo e, em inglês, pediu que eu falasse algumas coisas. Pela situação, imaginei que ele estaria me filmando para mandar o vídeo ao Simon. Provavelmente, o objeto em meu colo era um jornal daquele dia. Nunca esqueci as palavras que fui forçada a dizer: "A morte de uma pessoa querida dói mais do que a própria morte. Você deveria ter continuado sozinho." Eles queriam machucá-lo e, com certeza, conseguiriam. Fiquei imaginando como ele se sentiria quando assistisse àquele vídeo. Mais uma vez, eles saíram e me deixaram sozinha naquele lugar. Passei o dia todo sem comer e sem beber absolutamente nada. No segundo dia, eles repetiram o mesmo ritual que fizeram no primeiro, mas, dessa vez, além de apagarem o cigarro em minha pele, eles também me cortaram. Eram cortes pequenos e superficiais, mas foi suficiente para aumentar o nível da dor que eu sentia. Entendi que a intenção deles era causar marcas em meu corpo. Marcas que Simon poderia ver através dos vídeos que eles lhe enviavam. Por isso, a partir do terceiro dia, também fui agredida com alguns socos em meus braços, que, provavelmente, causariam marcas roxas. Entre o segundo e o terceiro dia, eles me deram um pouco de água. Apenas o suficiente para eu continuar viva. Era impossível saber quanto tempo aquela situação ainda iria durar, mas de uma coisa eu tinha certeza. Simon estaria me procurando. Ele não descansaria até me encontrar. Só não sabia se ele chegaria para me salvar ou para me ver morta. Irônico imaginar que alguns dias atrás era ele quem estava decidindo se eu viveria ou não. Eu já não me importava mais com o que me aconteceria. A única coisa que eu queria era ter a chance de ver Simon mais uma vez e me desculpar pelos absurdos que havia lhe falado.

~

Quando fui sequestrada, pensei que morreria em poucos minutos. No máximo horas. Mas alguns dias já haviam se passado e eu não sabia mais o que pensar. As dores físicas já haviam sumido. Eu estava anestesiada. Não por uso de alguma medicação, mas, após os primeiros dias, eu havia me desconectado do meu corpo. Estava em outra dimensão. A única coisa que continuava me machucando era pensar no Simon. A saudade também já havia diminuído. Já havia me conformado com a ideia de não vê-lo mais. Tentei, então, ficar com os momentos bons que tivemos. Estranhos, é verdade, mas reais. E incríveis. Era isso que me mantinha viva. Me doía imaginar o quanto ele estaria sofrendo. Tinha certeza de que Simon estaria se sentindo culpado. Todo o tempo em que ele esteve ao meu lado, todo o tempo em que ele me protegeu e me escondeu de quem queria me ver morta, tudo em vão. Por tantas vezes, ele passou por cima de si mesmo só para estar ao meu lado. E, agora, tudo estava perdido. Não que eu pensasse assim, mas sabia que seria o pensamento dele. Simon havia me perdido e eu sabia o quanto isso o faria sofrer. Do jeito torto dele, ele havia me amado. Eu tinha certeza disso. De alguma forma, consegui encontrar o Amin que há muitos anos estava adormecido dentro dele. Talvez Simon buscasse por isso. Talvez precisasse que alguém fizesse isso por ele. Ou não. Talvez eu precisasse dele. Talvez fosse eu quem estava acordando na nossa relação. Acordando para a necessidade de ter alguém cuidando de mim. Como era boa aquela sensação de me sentir amparada. Eu me sentia segura ao lado do Simon e isso me fazia bem. O tempo todo acreditei que era eu que o havia mudado, quando, na verdade, foi aquele "coração de gelo" que havia me transformado. Sempre fui independente. Aprendi cedo a cuidar de mim mesma, a não contar muito com os outros, porque, uma hora, eles poderiam não estar mais lá. E com Simon acontecia o oposto. Eu me entreguei por completo a ele. Entreguei minha vida em suas mãos. E foi a melhor sensação que poderia ter experimentado. Tudo que eu havia vivido desde que meu caminho se cruzou com o de Simon já tinha valido a pena.

ANNIE [Português]Onde histórias criam vida. Descubra agora