Capítulo 10

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"O tempo amortece as aflições e desavenças porque mudamos e quase nos tornamos outros homens."

Blaise Pascal.


Quando um mago abre um portal, seja ele para outro mundo ou dentro do próprio, uma pequena camada de energia forma uma barreira que impede a troca de ar ou qualquer outra coisa, como uma película transparente separando os dois lugares. O mago, ao atravessá-la, não sente qualquer dificuldade e apenas muda de lugar sem transição, sem sentir nenhum efeito, além de ser instantâneo.

Por isso, Igor não demorou a descobrir que havia algo de muito errado naquela perseguição, uma vez que a passagem através do portal não ocorreu da forma usual. Pela primeira vez, teve a impressão de flutuar no nada e também começou a sentir um mal-estar estranho que foi acompanhado de uma tontura e, logo a seguir, uma forte sensação de privação sensorial que o assustou muito. Ele não saberia explicar quanto tempo passou nesse processo, porque bem podia ter sido dez segundos como uma eternidade e já beirava o desespero quando voltou a sentir o corpo, descobrindo que caía, para sua sorte em algo macio.

Nem dois segundos depois, soltando outro palavrão, o pássaro veio parar em cima dele e o jovem agradeceu à Deusa por ele não se ter transformado no dragão antes de entrar no portal, porque teria acabado esmagado pelo peso do gigante.

Zonzo demais para se levantar, Igor permaneceu quieto até ter a certeza de que era seguro erguer-se. O primeiro foi Gwydion, que levantou voo para uma árvore próxima, empoleirando-se em um galho.

– "Estamos em algum lugar aberto, com casas baixas de aspecto primitivo e tu estás caído num monte de feno. Isto deve ser uma fazenda ou algo similar" – explicou o dragão, ainda na forma de ave. – "Vem gente aí e não parecem nem um pouco amistosos, então é melhor que te recuperes logo."

O jovem ergueu-se devagar, ainda incapacitado, e viu os homens à distância, mas permaneceu sentado no feno.

– Estou muito tonto para ficar de pé e aconteceu alguma coisa comigo, porque não posso invocar os meus poderes nem mesmo para melhorar ou me curar – disse Igor, preocupado. – Deve ter sido alguma coisa deste portal maluco que me afetou e espero que seja temporário. Não te transformes nem faças nada a menos que me tentem matar porque, conforme for, dependerei das tuas habilidades. Com toda a certeza isto aqui está pra lá de estranho.

– "Sem dúvida" – concordou Gwydion. – "Nunca senti essas coisas antes e foi muito desagradável."

Os homens que se aproximavam, vestiam túnicas rústicas, amarradas na cintura com uma espécie de corda de sisal. Nas mãos, carregavam forquilhas ou pedaços de pau e, fora isso, eram semelhantes a qualquer camponês caucasiano.

Um deles, que parecia o líder, aproximou-se e falou para os amigos. Quando abriu a boca, Igor ficou perplexo porque entendia o idioma com perfeição, apesar das nuances que se apresentavam, mas concluiu que se tinha encrencado e muito, já que a língua celta estava morta há quase dois mil anos exceto pela Cidadela.

– Não é um romano – disse, olhando para os companheiros – as roupas são estranhas, mas parece um druida guerreiro.

– É, só que pode ser mais um dos truques romanos para nos destruírem – afirmou outro, desconfiado. – Esse sujeito caiu do céu e deveria estar morto, sem falar que não tem um bordão!

– Com certeza que não. Os romanos não têm roupas assim tão boas, olhem a qualidade dessa capa!

Igor absorveu depressa o choque inicial e, com as observações obtidas, tirou suas conclusões. Como ainda estava fraco e tonto, ergueu-se com toda a cautela, para não cambalear, e começou a limpar as roupas, batendo nelas com as mãos. Sorriu para os homens que recuaram um passo e empunharam as armas improvisadas, a maioria forquilhas ou porretes.

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