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Raymond Ernest pressionou o cigarro contra o fundo sujo do cinzeiro, bufando enquanto tentava manter os olhos abertos. Seu rosto emanou uma expressão de puro desgosto quando notou já ser três da manhã. O gosto do chá gelado que tomara mais cedo ainda impregnava o seu paladar, deixando-o um tanto zonzo, e o seu nível de agonia e tédio aumentava cada vez que olhava o arquivo em branco na tela de seu computador.
Raymond, como todo bom escritor Irlandês, era viciado em chá e sofria de insônia. Seus cabelos castanhos estavam sempre bagunçados e sua cabana no meio da floresta parecia um grande depósito de móveis velhos e empoeirados. Se tornou escritor porque tinha uma mente que sempre divagava para lugares além dos reais e situações incompreensíveis para pessoas comuns. Deu certo por um tempo, afinal ele vendeu vários livros de terror, mas quando se separou da esposa e entrou na justiça para tentar vencer uma ordem de restrição tudo na sua vida começou a desmoronar.
O pior de tudo era que Raymond não conseguia mais escrever.
Formular frases e elaborar roteiros viraram complexos desafios sem soluções. Nem mesmo os títulos que pensava pareciam representar o que ele queria, assim como qualquer história nunca era boa o suficiente. Com o tempo, Raymond aceitou que sua fonte de inspiração havia acabado e que ele deveria arrumar outros meios de conseguir sobreviver, mas era realmente difícil. Sentia que era a única coisa que sabia fazer direito.
Raymond fechou o notebook e massageou o espaço entre suas sobrancelhas. O pesar incômodo nos olhos, como se estivesse cansado da luz insistente do computador, causava sono. Sua cabeça não doía, mas transportava sensações de enjoo e exaustão através do seu sistema nervoso que, para o resto de seu corpo, caía como veneno. Era pura exaustão.
O retrato quase surreal de uma floresta calma e escura, repleta de corujas e árvores, aparecia atrás da janela à sua frente e também não ajudava. A cabana na qual o escritor gostava de se esconder do mundo ficava no coração de uma floresta, onde não existia movimento. As coisas eram sempre calmas. Raymond e sua cabana feita de madeira eram os únicos sinais de civilização dentro de um raio de dez quilômetros. Seria preciso uma picape e um senso de localização tão bom quanto o do próprio escritor para alcançar o refúgio do homem, e por causa daquilo nenhum fã ou paparazzi se arriscava a incomodá-lo.
Odiava o fanatismo, as conversas em talk-shows e as entrevistas a programas de TV. Orações e parágrafos eram as únicas formas de comunicação que ele entendia. As únicas coisas que faziam sentido e eram agradáveis. Uma pena que o agradável não era gentil com ele; seu ponto forte, o refúgio de sua imaginação fértil, estava acabado: ele era um escritor que não tinha mais como escrever.
Raymond girou na cadeira de computador. Olhou para a sua mesa de trabalho e encontrou o jornal local que coletava todas as manhãs no posto de gasolina. Colocou os óculos de volta no rosto e leu a manchete acompanhada de foto e fontes que dizia Garota desaparecia em Northern Lake — uma menina que saiu para ir à escola e nunca mais voltou.
Ele não ligou muito para aquilo. Ela devia estar bem, apenas perdida.
Nada de ruim acontecia ali, em sua pequena cidade.
Nothern Lake era um lugar seguro.
Afetado por aquela notícia, naquela noite, no meio da floresta silenciosa e dentro de sua cabana fria, ele resolveu se deitar mais cedo e, observando a madeira do teto de seu lar, dormir.
Talvez a inspiração um dia voltasse para lhe abençoar.
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7 Psicopatas (COMPLETA ATÉ DIA 25/11)
TerrorRaymond Ernest é um escritor decaído. Depois de criar um thriller que vendeu milhares de cópias pelo mundo, ele se encontra em um profundo bloqueio criativo, não tendo inspiração nenhuma para escrever. Enquanto tenta superar a crise literária...