Capítulo 4

75 7 3
                                    

Izzat desligou o telefone sentindo o seu coração pulsar acelerado. Sentia uma mistura de raiva e gratidão. Não se passaram nem 48 horas desde de que saíra da prisão e já fora convocado novamente para a guerra. Respirou fundo tentando se acalmar. De repente, um sorriso contido surgiu em seus lábios. Como se, por um pequeno instante, tivesse esquecido de Gabriel.

Sua mente voltou aos instantes que desfrutara a visão do rosto mais doce e belo que seus olhos desprezíveis puderam apreciar. Há muito tempo não tinha essa sensação arrebatadora diante de uma mulher. Quem será ela? Questionou-se como um adolescente inexperiente. Infelizmente, seus ingênuos devaneios foram desaparecendo na imensidão obscura de sua mente, tal como fumaça que se esvai diante da ventania. Balançou a cabeça lentamente, como se não desejasse voltar para a realidade. Para a sua realidade: incerta e vil. Não tinha tempo para esse tipo de futilidade; não tinha tempo para si ou seus sentimentos. Tinha uma missão e precisava cumpri-la. Esse era o plano no qual deveria está focado cem por cento. Ligou o carro e saiu da vaga mais rápido do que quando entrou.

Enquanto dirigia, sua mente voltou ao passado; ao fatídico dia em que viu Gabriel pela primeira vez...

***

Estava quente e suas roupas pregavam em seu corpo com o suor. Ele estava tonto e enjoado. Não sabia ao certo onde estava e nem mesmo como foi parar lá. Era uma sala escura e úmida, cuja única lâmpada mais parecia uma lamparina. Sentia um vapor vindo do chão, formado por uma extensa grade metálica. O barulho perturbava sua cabeça, que aliás, estava dolorida demais em razão dos pontapés e coronhadas sofridos. Parecia estar perto de alguma sala de máquinas que emitiam todo aquele calor e aquele barulho. Estava em pé, de braços levantados, com as mãos acorrentadas a um cano de ferro. Ele não conseguia mais sentir suas mãos e suas pernas já não o sustentavam. Não sabia, ao certo, há quanto tempo estava lá, mas podia apostar que já se passara 24 horas desde a sua prisão.

Desde então, não tinha comido ou bebido nada. Pelo contrário, toda a comida que havia em seu estômago estava, agora, espalhada em suas roupas e no chão. Depois de tanto apanhar, não conseguiu segurá-la na barriga e seu suco gástrico irrompeu em sua garganta. O mau cheio tomava conta do ambiente, o que o deixava mais tonto e nauseado.

De repente, ouviu o barulho de uma porta abrir distante. Em seguida, passos firmes que se aproximavam. Sem demora, a porta da pequena sala foi aberta e dois homens entraram. Um se aproximou e o examinou. Com sua pequena lanterna, checou os olhos, o nariz e a garganta. Auscultou o tórax e sem falar nada, fez um sinal com a cabeça para o outro. Depois disso, saiu da sala deixando Izzat em companhia de um soldado forte e mal-encarado, que se aproximou e abriu as correntes.

Com as mãos livres, ele caiu no chão feito um defunto. Não sentia suas mãos e suas pernas. Seus músculos pareciam se recusar a se movimentar. No chão, foi puxado violentamente pelo soldado, que o jogou em cima de uma cadeira no canto da sala. Aparentemente, o médico atestou que ele ainda era capaz de suportar mais uma sessão de interrogatório. Izzat mal conseguia abrir os olhos inchados. Sua respiração estava fraca e irregular e sentia que poderia vomitar mais uma vez a qualquer momento.

O soldado o encarou por alguns instantes e então aproximou seu rosto ao dele.

— Podemos conversar mais um pouco, Dr. Hassan? — debochou do título que o rapaz nunca conseguiu. Izzat não se intimidou; o encarou fazendo penetrar-lhe todo o seu ódio. — O que ia fazer e para onde levaria o ácido pícrico? — o silêncio continuou. — Sabemos que existe mais ácido além do que portava quando o prendemos. Onde você escondeu? — apontou-lhe o dedo rangendo os dentes — Você é muito teimoso, doutor... não seria mais fácil se colaborasse? — ele não disse nada — quer morrer, assim como seu irmão... feito um porco estúpido?

IZZATOnde histórias criam vida. Descubra agora