Capítulo 17

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À frente da penteadeira do camarim principal do Palais Garnier, Melissa apoiava sua cabeça com a mão direita, sobre a bancada. De olhos fechados, fazia uma prece a Deus para que lhe desse voz e força durante essa noite em que seria a estrela do espetáculo anual da páscoa. Pedia que sua música aquecesse o coração dos ouvintes e que, através dela, sentissem o amor de Cristo em suas vidas. Enquanto estava em estado de meditação e concentração, notou passos se aproximando. De súbito, abriu os olhos e sorriu ao ver pelo espelho o reflexo do belo rosto de Tom. Virou o corpo, admirada.

- Tom, estou surpresa! - sorriu enquanto abria os braços para cumprimentá-lo - Achei que estivesse na comemoração da páscoa judaica! - o abraçou, em seguida o encarou - O que faz aqui? - Ela sacudia a cabeça com um sorriso ao mesmo tempo zombeteiro, ao mesmo tempo incrédulo.

- Oi, Melissa! - Ele por outro lado, sorria de forma comedida, embora encantadora - Pra você ver como por você eu faço qualquer sacrifício. - Fechou ligeiramente a pálpebra direita em uma piscadela.

- Por mim?

- Sim, deveria estar em Londres com a minha família para comemorar o feriado, mas jamais perderia essa apresentação. Sei o quanto é importante pra você.

- Obrigada. Nem sei o que dizer! - coçou o pescoço, um tanto embaraçada - sua mãe deve estar furiosa comigo.

- Não, não está. Ela a adora - Ele fez uma pausa - assim como eu - a beijou na testa.

Melissa se afastou, levemente ruborizada. A única vez que estivera com a família de Tom foi no réveillon anterior, quando ela e Amanda passaram a virada de ano em uma propriedade dos pais dele ao sul da França, na Riviera Francesa. Apesar do inverno, a região garantia aos visitantes muito do luxo e sofisticação que o mundo pode oferecer. Após conhecê-los, surpreendeu-se com a simplicidade com a qual o casal se portava - bem diferente do filho. Talvez por essa razão ela tenha desenvolvido um ótimo relacionamento com a mãe dele, que desde então sempre a tratou de forma muito cortês e respeitosa.

- Faltam apenas dez minutos, preciso terminar a minha... - ela girou o indicador sobre sua face - ... a minha, você sabe... maquiagem!

- Está certo - segurou-lhe as duas mãos - vou deixá-la agora. Brilhe esta noite e mais uma vez me encha de luz - beijou-lhe as mãos.

Melissa o viu distanciar-se e fechar a porta. Fechou os olhos e deu um longo suspiro. Sacudiu os ombros em movimentos circulares em busca de relaxamento. Depois de reforçar o pó facial, solfejou algumas notas para manter a garganta aquecida.

Não demorou e alguém bateu à porta. Concentrada, assustou-se. O assistente de palco avisava que estava na hora. Seu coração disparou! Chegara a hora do espetáculo. Saiu do silêncio do camarim e entrou em um corredor barulhento cheio de coralistas, atores e dançarinos que atuariam no grande recital. Vestia-se com o longo vestido branco com detalhes em rendas e paetês que cobria os pés e os braços. Ainda que fosse justo na cintura e nos quadris, ganhava volume à medida que se aproximava ao chão. Como parte da sua vestimenta e do espetáculo tinha nas costas duas belas asas de anjo, simbolizando os mensageiros celestiais que apareceram a Maria Madalena diante do sepulcro vazio. Ela estava, sem dúvidas, belíssima.

O mestre de cerimônia anunciou o início do espetáculo. Conforme a coreografia, dançarinos entraram no palco e dançaram segundo o ritmo da música executada pela orquestra de Paris. Depois de alguns instantes, com a adrenalina a mil por hora, Melissa Davis entrou no palco daquela que era a principal casa de ópera da Europa. Seu sonho se realizara.

Quando era adolescente, leu o romance mundialmente famoso de Gaston Leroux e desde então sempre se imaginava cantando no palco que servira de cenário para a bela estória de Christine Daaé e Visconde Raoul de Chagny, além do misterioso Érik e seu amor impossível. O futuro de repente chegara, e, agora, ela estava a apenas alguns passos daquele tablado tão cobiçado.

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