Capítulo 13

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Os raios do sol ainda tímidos do início da manhã refletiam sobre as pirâmides encravadas no pátio central do museu do Louvre. Uma pequena fila começava a si formar na entrada da pirâmide principal, que dava acesso ao museu. Pessoas de todas as nacionalidades cruzavam o lugar, admirados com a imponência do edifício clássico, em contraste com a estrutura arquitetônica contemporânea composta de aço e vidro, que reluzia em meio aos vários espelhos d'água.

Izzat estava de pé, diante da pirâmide maior, com as mãos no bolso. O vento gélido chicoteava-lhe os cabelos ainda compridos. Vestia uma jaqueta de sarja verde-oliva, levemente desbotada e por baixo, uma camisa de malha cinza, calça jeans e tênis preto. Um típico universitário que parecia indiferente à magnitude do cenário. Sua mente voava longe enquanto repassava toda a conversa que havia tido com o Shaykh no dia anterior.

- O que tem a me dizer, Izzat?

Ele virou o rosto ao ouvir a voz de Gabriel, que ficou parado ao seu lado, também contemplando o espelho d'água em formato triangular. Pelo horário, uma grande sombra ainda cobria todo o perímetro. O céu tinha um tom prateado, vivo e intenso, que servia de fundo para os flocos de nuvens cinza, com extremidades iluminadas, que pareciam ter sido pinceladas no firmamento ao estilo Monet, com toda a leveza e suavidade características do impressionismo. Izzat voltou seus olhos para os vidros de algumas janelas da ala oeste daquele suntuoso prédio. O reflexo dos raios nas vidraças pareciam pequenas explosões de soberba vindas do interior do edifício.

- O Shaykh quer que eu trabalhe no Laboratório de Ibraim Kalache.

- O laboratório de genética avançada?

- Sim.

- Então o homem da paz está envolvido com a Resistência Unida?

Homem da paz. De fato, era assim que o multibilionário saudita Ibraim Kalache era conhecido. Dono de usinas de petróleo na Arábia Saudita, era visto como o exemplo de muçulmano moderado por se empenhar arduamente no sentido de estabelecer a paz na região. Para tanto, diziam os jornais que já doara mais de 100 milhões de euros e que trabalhara junto aos governos para tentar apaziguar o ânimo dos religiosos mais radicais. Dentre seus maiores empreendimentos e investimentos em prol da raça humana, estava o seu Laboratório de Genética Avançada. Anualmente, milhões de euros eram utilizados em busca de descobertas que aliviassem a dor e sofrimento das pessoas através de curas, antídotos e vacinas contra as piores doenças.

- Não. Na verdade, o Shaykh parece ter grande ressentimento a respeito dele. Para ele, Ibraim não passa de um hipócrita.

- Entendo, mas... o que ele quer que você faça?

Gabriel começou a caminhar e fez sinal para que ele o seguisse. Estava com as mãos dentro do seu sobretudo preto, e em volta do pescoço, usava um cachecol de cashmere cinza no qual dera apenas uma volta. Andavam lado a lado, como dois amigos que se encontraram para trocar ideias em um encontro cultural. A atmosfera estava tranquila e suas diferenças pareciam ter sido esquecidas. Pelo menos, naquele instante.

- Não sei ao certo... ele só disse que tinha algo a ver com um cordeiro judeu. Citou o livro de Êxodo do Velho Testamento - deu um longo suspiro como se a resposta estivesse perto, mas uma névoa impedisse que enxergasse com nitidez. - Ele falou sobre o juízo final para os europeus; um atentado final. - suas palavras soaram com a seriedade necessária para o que anunciava. - Tem algo naquele laboratório que é importante para o sucesso desse ataque final. E... minha missão será levar isso até ele.

- Tem razão - Gabriel comprimiu o maxilar apertando seus lábios a ponto de mudarem de cor. Podia-se quase que visualizar sua arcada dentária fechada com certa intensidade. Sabia que o cerco estava se fechando e que lhe restavam poucas jogadas nesse tabuleiro. Olhou para os lados e pareceu consternado. Ver todas aquelas pessoas andando com uma tranquilidade inapropriada o fazia temer, mais do que nunca, o fracasso. O mundo tal como conhecia poderia deixar de existir a qualquer momento. Não podia permitir que isso acontecesse.

- Fiz as malas. Se for admitido, ficarei no alojamento do laboratório.

- Sei... o laboratório fica em uma fazenda, não é mesmo?

- Sim. Fica ao lado da propriedade em que Ibraim Kalache reside com sua família, a quase duas horas de carro daqui. A maior parte dos cientistas, sobretudo os estrangeiros, ficam instalados no alojamento anexo ao laboratório.

Izzat conhecia detalhes sobre o lugar desde que ele fora fundado, há 7 anos. Algumas vezes se imaginou trabalhando lá depois de formado. Com equipamentos de ponta e grandes somas de recursos, o laboratório reunia os maiores cientistas muçulmanos da atualidade que desenvolviam pesquisas louváveis e premiadas no mundo todo. De certa forma, parecia estar ansioso em conhecer aquele centro de pesquisa de perto.

- Fará bem o seu papel.

- Atuar é tudo que tenho feito nos últimos tempos.

Um pequeno sorriso delineou o canto esquerdo da boca de Gabriel.

- Ele caiu mesmo na conversa de agente duplo?

- Totalmente... na verdade, acho que esperava que eu fosse aliciado na prisão. Só não imaginava que eu confessaria.

O tórax de Gabriel vibrou em um sorriso contido. Sabia que correram risco, mas acertou em cheio ao ordenar que Izzat confessasse isso na reunião. O fanatismo e a lealdade cega sobejavam entre os membros da RJU, o que fazia a história de Izzat parecer bem convincente e apropriada.

- Ah... tem mais uma coisa: o Shaykh quer forjar um ataque apenas para que eu entregue os planos ao governo e ganhe a confiança do serviço secreto.

- Sério? E o que vão explodir?

- A Sinagoga de Paris, na rua Victoire.

- Muito ousado!

- Sim... ele quer que a polícia se sinta muito satisfeita com o seu novo informante, depois de desarmar as duas bombas que colocarão horas antes do início da comemoração da páscoa.

- Certamente o secretário de segurança vai adorar ir aos jornais e se gabar da inteligência do governo.

Izzat sorriu, satisfeito. Percebeu que Gabriel estava um pouco mais animado.

- Também tenho boas notícias. - disse Gabriel - Nossos amigos invadiram o sistema da operadora de telefonia. A polícia não conseguiu um mandato contra você.

IZZATOnde histórias criam vida. Descubra agora