Quem eu sou?

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"De algum jeito, eu achei meu caminho, nunca é fácil, mas porque é tão difícil? Tudo que eu tenho querido é ser como eles, eu não entendo, porque eu tenho que ser quem eu sou? "
Madylin Paige - Irrepleceable

Helena

Bem, mais um dia se segue,estou de atestado por mais oito dias, tento encontrar forças para fazer algo para comer. Marcos não me ligou e ainda deixou aquela promessa indecentemente deliciosa no ar, que toda vez que vem a memoria, suas palavras roucas e cheias de excitação me deixam desejosa pra que suas promessas se tornem realidade. Graças ao excesso de medicação estou meio sonolenta. Com muito esforço levanto, sinto muitas dores de cabeça, como se uma faca penetrassem meu crânio.
Já em pé olho ao meu redor e sorrio, pelo fato de poder ver como a vida dá belas voltas. Quando eu era criança e eu e minha mãe morávamos na casa dos seus patrões, sem a menor liberdade, achava tudo tão bom mesmo não podendo levar amigos pra casa, nem tinha mesmo então, no fim eramos eu e duas cadeiras brincando de elástico. E não pense que olhava para situação como uma coitada, nunca me vi assim, preferia ficar sozinha no recrio a fazer amigos. Com o tempo passando e eu crescendo minha mãe viu a necessidade de ter nossa casa.

Posso ser bem sincera, começamos do zero, com uma única cama para nós duas, um fogão e um cómodo e um conjunto de barracões, com chão de terra. Para muitos parece ruim, contudo,era nosso. E olhando agora pelo que passamos até chegar aqui, que olhando para trás vejo que valeu a pena cada escolha. Eu comecei a trabalhar muito cedo, aos onze anos, como babá e ajudava em casa, e assim começamos a conquistar cada utensílio dentro dessa casa. O chão de terra, as baratas voadoras, as paredes sujas de outros moradores, o portão que não fechava direito, me levam a momentos que antecedem a perda do meu eu, daquela menina que sorria e ainda acreditava em finais felizes, dando espaço a uma adolescente violada e destruída por adultos que não entendem limites.

Tudo começou numa manhã que não tive aula, o pai da minha amiga e vizinha apareceu com seu pau para fora das calças se masturbando de maneira inescrupulosa. E ainda chamava meu nome, até aquele momento não entendia o que estava acontecendo,só me lembro dos sentimentos que emergiram o nojo, o asco e a repulsa que sentia. Entrei no nosso pequeno quarto e ainda assim podia o ouvir gemendo o pau em sua mão. Quando ele se foi chorei tanto, sem entender o motivo de tantos sentimentos. Os barracões ficavam lado a lado e do lado de fora só via os da frente e o nosso ficava na lateral ao lado do banheiro coletivo. Fiquei com tanto medo de sair de casa, um medo que sufoca e tira as forças que até aquele momento nem sabia que existiam.

Não entendia, e não contei pra ninguém, minha mãe sempre trabalhou muito e nem sempre estava presente, quer dizer natal, ou qualquer outra data importante eu estava sozinha, mais mesmo assim hoje eu reconheço o esforço que ela fez por nós, sempre fez questão que eu estudasse e a cada começo de ano ela sempre me deu material novo, com seus esforços me formei e faço pós – graduação. É tão lindo seu sorriso a cada conquista minha. Mas não ouve um dia das mães que ela compareceu, quem dirá no dia dos pais. Durante anos essa foi uma ferida aberta e que doía. Porem eu escolhi perdoa-lá não porque sou boa, mas para segui em rente e pra que possamos ter uma relação agradável hoje.

Passando muito tempo só, fui um prato cheio para os meus vizinhos, a primeira vez que fui tocada eu tinha treze anos, moramos nesse amontoado de casas durantes quatros anos. O cheiro de álcool vem as minhas narinas como se fosse hoje, aquela criança sendo tocada por mãos ásperas. Foi uma manhã das férias em que ele abriu a porta sem bater, me imobilizei, estática, com tanto medo que não fiz nada além de chorar, ele me puxou pelos cabelos e dizia coisas desconexas pelo fato de estar bêbado. Ele vivia bêbedo, lembro - me da dor que sentia entre as pernas, por algum motivo minha mente bloqueou as piores partes, mas a dor eu sentia, com a força que tentava me penetrar, dos tapas e do sangue na minha calcinha. A única coisa da qual lembro era ameaça que se falasse para alguém ele mataria eu e minha mãe, como lutar contra isso. Fui deixada na cama tantas vezes, machucada fisicamente e emocionalmente mais vezes do que achava ser possível suportar.  Conseguia enganar minha mãe muito fácil, só a mim mesma que nunca pude enganar.

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