Passando pela antiga Mariana - 02

33 0 0
                                    

Após alguns bons minutos, "Banguela" e "Fedido" voltam com o casal de prisioneiros e seus pertences. "Fedido" carrega duas mochilas grandes, enquanto "Banguela" puxa os prisioneiros que estão presos com cordas amarradas nos pulsos e no pescoço, limitando os movimento deles.

O chefe dos motoqueiros examina as mochilas com cuidado, retirando frutas, biscoitos e as garrafas de vidro antigo com água, deixando tudo encima de uma pedra de entulho maior, que fica perto da fogueira. Ele escolhe uma maçã e a limpa esfregando em sua própria camisa, que não estava exatamente... Limpa. Após sentar de volta na velha poltrona do quintal, ele pega uma faca em seu cinto e começa a descascar a maçã, sendo observando em silêncio pelos seus dois seguidores Banguela e Fedido e pelo casal de prisioneiros.

- Você, rapaz... Me fala de onde veio e para onde queria ir com esta garota. E seja bem breve... - ordena, enquanto corta uma pequena lasquinha da casca da maçã.

- S-sou do grupo que vive nos túneis da Praça da Árvore... A gente foi buscar frutas e caçar comida, mas acabamos nos distanciando demais.... - O rapaz não parece ter mais de uns 20 anos e tem cabelos castanhos, bem curtos e pele branca, quase pálida, e está com o rosto machucado. Talvez tenha apanhado um pouco para seguir com os dois motoqueiros. O garoto veste alguns trapos de roupa, já bem gastos e bastante sujos. Está descalço, com os pés sujos de lama já bem seca.

"Distanciado demais" era forma suave de mentir. Após o grande pulso, algumas pequenas comunidades passaram a viver nos túneis do antigo metrô da província de São Paulo. Seus moradores viajavam entre as comunidades dentro dos túneis, evitando problemas com o caos da superfície, só saindo para buscar comida e água. Para quem nasceu e viveu nestas comunidades, é raro se distanciar além de algumas dezenas de metros de sua própria comunidade. Quanto mais andar mais de alguns quilômetros buscando comida.

- Tsc... Acho que está mentindo, garotinho. O pessoal dos túneis raramente vão além da própria comunidade onde vivem. E se precisam visitar alguma outra comunidade, andam de baixo da terra, pelos túneis durante o dia. Eles plantam arvores de frutas aos montes ao redor das entradas de seus túneis... E sabem como acumular a água da chuva. Garotinha, qual é a sua história?

O chefe olha para a garota magra, de cabelos castanhos longos, a altura dos ombros. Ela veste uma camisa bege, já bem puída e com alguns buracos, bem gasta, além de uma saia e um par de sandálias. Diferente de seu amigo, ela é mais corada, provavelmente já acostumada a andar pelo sol a mais tempo que o outro.

- Somos da Praça da Árvore, mas estávamos seguindo para a vila da Sé... Pela superfície.

- E porque não foram pelos túneis? É bem mais rápido e nem perderiam um dia de viagem - Pergunta o chefe, saboreando um pedaço de maça, mais interessado no que a garota poderia falar.

- Houve um desmoronamento entre o túneis das comunidades do Paraiso e Vergueiro... Mas...

O chefe corta a explicação da garota com um sonoro "HEY", chamando a atenção de todos. Eu me ajeito melhor atrás da porta da sacada, observando pelas fresta toda a conversa.

- Na verdade, está mentindo também. Só poderiam andar entre as comunidades usando os túneis com permissão do líder de cada comunidade. Ir da Praça da Árvore a Santa Cruz precisa da permissão dos lideres de cada uma. Ir viajando em segurança por nove ou mais comunidades através dos túneis sem ter um motivo muito forte é algo bem raro.

O Chefe se levanta, puxando a garota usando as cordas que amarram as mãos e o pescoço dela, voltando a se sentar na poltrona velha, fazendo um gesto com a mão para o Banguela e o Fedido em direção ao garoto.

Em seguida, os dois avançam encima do rapaz, espancando-o por longos minutos, usando as mãos e um pedaço de madeira velha. Durante todo o tempo a garota pedia para que eles parassem, Só quando o rapaz caiu desmaiado no chão os dois pararam de bater, olhando em seguida para o chefe deles sentado na poltrona. Ele lança um olhar para a garota, sorrindo.

Nômade AdriOnde histórias criam vida. Descubra agora