Capítulo VIV

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Até que não foi tão ruim passar a tarde na casa de Ian. Ficamos deitados no carpete da sala, cercados por vários travesseiros e alguns saquinhos de pipoca. Assistimos a alguns filmes: *Frozen*, *Carrossel* e *Tartarugas Ninja*. Miguel dormiu na metade de *Carrossel*. Ele amava aquela Maria Joaquina. Terminamos de assistir aos filmes e Miguel ainda estava dormindo. Fiquei olhando para ele ao meu lado. Estava tão tranquilo.

Levantei-me e fui até a cozinha para tomar água. Ian veio logo atrás. Fiquei um pouco nervosa por estar tão perto dele. Sabia que meu autocontrole poderia desabar a qualquer momento e lembrei dos velhos tempos. A primeira vez que ele me deu um presente foi um ursinho com a frase "Te amo". Eu amava ursinhos, mas, depois que me mudei para São Paulo, joguei todos fora, já que Ian tinha me dado a maioria.

Parei na janela que dava para o jardim e tentei evitar Ian.

-- O que está pensando? -- Ian perguntou tão baixo que, se ele não estivesse perto, eu não teria escutado.

-- Em nada, Ian. -- também falei baixo.

-- Que horas nosso filho acorda? -- ele parecia orgulhoso ao usar "nosso". Tentei ignorar o quanto isso me deixava feliz.

-- Bom, já são quase vinte horas. O tempo passou rápido. Não sei se ele vai acordar hoje. -- falei, ainda olhando o jardim.

-- Você gostou do jardim? -- ele disse, se aproximando.

Senti o cheiro dele, uma mistura de chuva fresca com lavanda. Tentei ignorar, mas meu coração, teimoso, começou a acelerar.

-- Você está linda. -- ele disse baixo, com a voz rouca.

Céus! Preciso de força. Onde está meu autocontrole? Acho que foi embora e se esqueceu de se despedir.

Ian se aproximou ainda mais e me abraçou por trás. Senti sua boca em meu ouvido e depois percebi que ele estava cheirando meu cabelo. Eu não conseguia pensar direito com ele me acariciando. Ele voltou a beijar minha orelha. Estremeçi.

-- Ian. -- falei, rouca.

Ele continuou, começando a passar as mãos em minha cintura. Ele me virou e começou a me beijar no pescoço, depois subiu para minha boca. Isso mesmo, beijando minha boca com desespero. Nem percebi que estava devolvendo os beijos com a mesma voracidade. Parecíamos dois selvagens, como se nunca tivéssemos nos beijado antes. Acho que, na verdade, era apenas saudade.

O celular de Ian começou a tocar, ele ignorou. Mas eu me afastei assustada, finalmente percebendo o que estávamos fazendo.

Céus... Não posso ficar nem cinco minutos com ele e acontece isso. Fiquei com raiva de mim mesma. Estava tentando mostrar que era forte, mas na primeira oportunidade me joguei em seus braços.

-- Oi. -- Ian atendeu o telefone, parecendo mal-humorado. -- Não, não irei... Eu sei que combinei, mas pensei melhor e não vou... Sim, ela voltou... E por causa dela mesma. Tchau.

Ian desligou, colocou o celular no bolso e ficou me olhando. Eu ainda estava tentando entender a ligação. Quem era essa "ela"? Acho que era eu, e isso me deixou confusa e um pouco feliz com a demonstração.

-- Quer me falar algo? -- indaguei, olhando para sua boca. Que linda.

Lembrei que aquela boca estava me beijando há pouco tempo. Nem percebi que Ian me respondeu.

-- Entendeu, Mari? -- ele me olhava com um sorriso travesso.

Ele sabia no que eu estava pensando. Abaixei a cabeça e senti meu rosto esquentar. Era assim quando ficava ruborizada.

-- Mamãe, quero tomar banho. -- olhei para Miguel. Ele estava com o cabelo bagunçado e o rosto meio avermelhado.

-- Sim, meu amor. -- parei, lembrando que não tínhamos roupas na casa de Ian.

-- Não se preocupe com roupas, Mari. Quando saí com Miguel, passei na sua mãe e peguei algumas roupas para vocês. -- ele parecia satisfeito consigo mesmo.

Levei Miguel para o banho. O banheiro era no quarto de Ian. O quarto dele combinava com seu estilo: era de um azul claro e tinha um guarda-roupa enorme. Havia uma janela em frente a uma mesa com alguns livros. Achei *Orgulho e Preconceito*, de Jane Austen, e achei estranho. Pelo jeito, ele tinha mudado mesmo. Depois encontrei *Harry Potter e o Cálice de Fogo*. Esse era meu livro preferido da série.

Depois do jantar, deixei Miguel assistindo TV e fui tomar banho. Ian também foi tomar banho. Estava sentada assistindo com Miguel quando Ian apareceu apenas de short.

Nem preciso dizer que ele estava parecendo um deus grego, com um corpo um pouco musculoso. Olhei para seu peito, onde já havia dormido várias vezes, e depois para sua boca.

Marina, cadê seu autocontrole?

Meu autocontrole tinha sumido, mas minha razão ainda estava viva.

Olhei novamente para sua boca. Sua boca ficava exatamente na altura da minha testa quando nos abraçávamos. Isso era antes. Agora, não mais.

Ian sentou no sofá ao meu lado.

-- Vai dormir, eu, papai e mamãe. -- disse Miguel.

-- Venha, Miguel, vamos deitar. -- disse Ian.

Ian pegou a mão de Miguel e o levou para o seu quarto. Fui atrás.

-- Ian, você vai dormir comigo ou com o papai? -- perguntei, agachando-me para ficar na altura de Miguel.

-- Todo mundo vai dormir aqui. -- Miguel subiu na cama e deitou no meio da cama. -- Aqui é mamãe -- disse ele, apontando para o lado esquerdo da cama. -- E aqui é papai. -- e o lado direito era de Ian.

Olhei para Ian aflita e pedi ajuda com o olhar.

-- Acho ótima ideia, Miguel. -- disse Ian, sorrindo e se deitando onde Miguel apontou.

Acho que não vou ficar só na vontade de quebrar o nariz de Ian.

Meu celular começou a tocar. O toque vinha da sala, então fui atrás. Estava em cima do sofá.

-- Alô. -- tentei falar baixo. Era Alisson.

-- E aí, deu tudo certo? -- Alisson me perguntou.

-- Bom, estava, mas Miguel teve a brilhante ideia de me fazer dormir aqui. -- tentei soar séria.

Escutei a risada de Alisson e comecei a rir também.

-- Que dia você volta para casa? Vou voltar para casa em alguns dias e queria me despedir da minha amiga.

-- Oh, Alisson, que fofo. Volto para casa amanhã. Pode me visitar.

Virei-me para ir para a cozinha e vi Ian parado, me fitando muito sério. Parecia com raiva. Não entendi o motivo. Não falei nada demais para Alisson.

-- Alisson, melhor eu desligar. Até amanhã.

Encerrei a ligação e devolvi meu celular ao sofá.

-- Mari, não quero outro homem ocupando o meu lugar. -- ele estava tentando não gritar.

-- Ian, não sei se já te falei, mas vou falar novamente. Alisson é apenas meu amigo. Ele se importa comigo. E só isso. Amizade. Você sabe o que é isso? -- falei, tentando conter a raiva.

-- Amizade. Não foi esse cara que uma vez pediu você em casamento?

Fiquei sem argumento. Isso era verdade. Alisson dizia que me amava. Assim que comecei a namorar Ian, ele foi lá em casa, levou flores e chocolate e implorou para que eu me casasse com ele. Foi uma noite muito desagradável.

-- Ian, isso é passado. Ele mudou e percebeu que somos apenas amigos. -- demorei um pouco para responder.

Passei por Ian e fui para o quarto. Logo em seguida, Ian também veio, mas ainda parecia chateado.

Desliguei a luz e me deitei ao lado de Miguel. Adormeci rapidamente e acordei com a luz do sol entrando pela janela. Me virei para procurar Miguel e meu coração disparou loucamente.

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