23 REALIDADE

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N I C O L A S

Eu sabia que era preciso tempo. Cada perda tem sua hora de acabar, cada morto seu prazo de partir, e não depende muito da vontade da gente.

- Lya Luft

- Théo, aonde você está? Você não pode fazer isso comigo e então fugir. Você não tem esse direito! Por favor, por favor, por favor... – respiro fundo várias vezes seguidas enquanto ouço o bipe da mensagem de voz ser encerrada. Encaro a foto na tela no meu celular e tento de alguma forma evitar a sensação de vazio que me consome. Jogo o aparelho do banco de carona e me concentro nas ruas do Rio. É madrugada e mesmo assim a cidade está acordada. O trânsito está barulhento, mas o som não parece chegar até mim. Mantenho os olhos fixos em cada canto da rua, como se pudesse vê-lo a qualquer momento.

Théo tinha simplesmente sumido do mapa desde a sua fuga da minha casa. Seu celular estava desligado, ele não estava em seu apartamento ou no de Alden e isso só me deixa ainda mais louco. Em algum lugar dentro da minha cabeça, uma voz grita que tenho que encontrá-lo, em parte porque preciso pedir desculpas e tentar entender o que de fato aconteceu e em parte porque preciso saber que tudo foi real, porque o que parece é que acabei de acordar de um sonho. Preciso ter certeza de que Théo não é apenas um conto de fadas e que não me apaixonei por um fantasma, mas à medida que as horas se passam, a amargura só cresce cada vez mais dentro de mim.

Quando finamente desisto, faço todo o meu percurso de volta para casa e um fio de esperança que tinha de encontrar Théo à minha espera se vai assim que abro a porta de casa e encontro Tia Isabel na sala, me esperando. Há toda uma movimentação do Buffet contrato por minha tia e a equipe de limpeza que estão dando uma geral no lugar enquanto Tia Isabel inspeciona tudo, até seu olhar me encontrar. Após a cena com Théo no jardim, tinha ficado em choque por tempo suficiente para que ele conseguisse fugir de mim e quando voltei a festa, ninguém sabia seu paradeiro. Eu estava em pânico e quase surtando. Meus tios e Beny foram os primeiros a notar minha agitação e apesar de ter fugido deles, o olhar de Tia Isabel nesse momento deixa claro o quão ruim ela sabe que algo aconteceu.

- Querido, aonde você esteve? Estávamos preocupados! – ela diz, se aproximando de mim e me encarando com preocupação. Tento respirar fundo e controlar a ânsia de chorar que sinto, mas é inútil. Os olhos da minha tia estão tão ternos e tão cheios de conforto que, assim que suas mãos tocam meus braços, me rendo completamente a minha dor e minha tristeza. – Ah meu Deus, Nico! O que aconteceu? – minha tia pergunta assim que a envolvo com meus braços e começo a chorar entre soluços. Ela afaga minhas costas e tento inutilmente manter o controle, mas a cada tentativa de tia Isabel de me consolar, a minha garganta dói ainda mais e meu peito parece uma bomba prestes a explodir.

- Ele foi embora. Ele me deixou! – digo, entre soluços, afundando meu rosto no ombro da minha tia que agarra o tecido da minha camisa amassada.

- Do que você está falando? – ela pergunta, me forçando a me afastar alguns centímetros para que possa me olhar de baixo. Sinto meu rosto encharcado de lágrimas e tento, sem muito sucesso, limpá-las de forma agressiva. Fungo antes de dizer algo e ignoro os olhares que recebo dos funcionários que estão rondando pela sala.

- Théo terminou comigo e sumiu. – falo, sentindo meus lábios tremerem. Sei que a qualquer momento vou cair em prantos novamente, por isso levo minhas mãos até o rosto e o escondo. Em seguida, caio de joelhos diante de Tia Isabel e aguardo calmamente que a sensação de dor me deixe.

- Como assim sumiu? O que houve? – Tia Isabel está ajoelhada na minha frente e suas mãos circula por meu rosto, mas me nego a tirar minhas mãos. Minha garganta dói demais para que eu consiga dizer algo, por isso apenas nego com a cabeça rapidamente. – Você precisa descansar um pouco, querido. Vai ficar tudo bem. Nós vamos dar um jeito nisso. Você só precisa dormir um pouco. – ela diz, passando suas mãos pelo meu cabelo enquanto permaneço onde estou, ainda com o rosto escondido entre as mãos, me entregando por completo a um choro intenso e silencioso enquanto Tia Isabel me faz companhia, velando minha tristeza e minha dor.

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