31 SEQUESTRO

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N I C O L A S

A esperança seria a maior das forças humanas, se não existisse o desespero.

- Victor Hugo

Ignoro totalmente a sensação de dor que sinto no meu nariz. Minhas mãos estão agarradas firmemente no volante do carro enquanto encaro a escuridão do estacionamento do hotel. Agora minha respiração está calma, mas continuo imóvel, deixando que o excesso de informações na minha cabeça trabalhe para que façam algum sentindo. Lembranças da minha discussão com Théo... Bernardo... As cenas penetram minha mente como borrões e preciso respirar fundo várias e várias vezes para não perder o controle novamente.

Não sei por que fugi ou porque não segui com meu plano de trazê-lo comigo. Tudo aquilo tinha sido demais para mim, como se o resto de dignidade que ainda me resta tivesse dado de cara com um iceberg. Ele não me entende! Bernardo não é capaz de entender a confusão e o quão conturbado as coisas estão na minha cabeça. Desde que descobri a verdade, é como se eu não estivesse mais no presente, e sim num passado muito distante, onde há qualquer momento papai aparecia para nos colocar na linha. É como se cada expressão no seu rosto estivesse em cada parte da minha memória, como se eu não tivesse ficamos vários anos da minha vida sem vê-lo.

É difícil vê-lo como Théo agora... Tão difícil como absorver que ele não está morto e que nos últimos meses esteve tão perto. Perto o suficiente para que eu.... Não! Empurro o pensamento para longe, limpo minha garganta e deixo minha cabeça cair sobre o volante do carro por um instante. Um frio ainda toma conta da minha barriga e sinto uma pontada de dor ao relembrar as duras palavras que trocamos há algumas horas. O dia está amanhecendo e pelo espelho retrovisor, posso ver que o hotel já está em atividade.

Minha chegada aconteceu no dia anterior, pela tarde, e durante o intervalo de horas que tive após minha chegada, usei todo o tempo para seguir as instruções que tinha conseguido com Stella. Não era difícil saber onde um dos homens mais ricos do país morava e isso só me fez ficar ainda mais irritado, pois teria sido tão fácil encontra-lo se soubesse que durante todos esses anos ele estava vivo. Stella não conseguiu descobrir como eles conseguiram esconder tudo isso durante todo esse tempo, mas os D'Ávila são capazes de qualquer coisa e ao pensar nisso, começo a me dar conta do que realmente pode estar em jogo. Não do perigo que eu possa estar correndo, pois é isso que meus tios e Stella ficaram repetindo o tempo todo, sem falar das revelações de Alden sobre as ameaças que Bernardo sofreu.

Meu plano era chegar à cidade, me hospedar num hotel simples onde essas pessoas não pudessem notar minha presença, alugar um carro e então aguardar. Estive desesperado o suficiente para decidir que quando chegasse naquela casa, eu simplesmente colocaria tudo a baixo e o tiraria daquela prisão. Moveria céus e mundos para isso, mas quando estacionei o carro diante da propriedade, à meia noite, foi como se minha mente tivesse simplesmente parado de funcionar. Entrei num estado de pânico que não fui capaz de sair, por isso circulei pela cidade e quase voltei para o hotel, mas algo fez com que eu voltasse até a casa e foi quando o encontrei dentro daquela coisa, com aquele cara.

É essa lembrança que faz com que eu finalmente desperte e saia do carro. Percebo que não é apenas meu nariz que está dolorido. Minhas pernas também latejam de dor enquanto me arrasto em direção ao hotel. Alguns hospedes passam por mim e encaram abertamente minha camisa manchada de sangue e meu nariz machucado, mas os ignoro. Tiro o celular do bolso quando chego à recepção, afim de (a fim de) checar as mensagens e descobrir se Stella tem alguma novidade que possa me ajudar, mas antes que eu alcance as escadas, uma rápida olhada em direção ao pequeno saguão faz com que eu detenha meus passos e fico imóvel enquanto encaro as figuras acomodadas nos dois sofás.

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