Porque o rio continua, com água ou sem ela

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Chove, chove lágrimas salgadas

E a terra seca e queima-se ao seu toque

O povo foge com medo

E o rio enche-se de nada para tudo levar


O passado fica como um vinco

O futuro enche-se de nevoeiro

A dor destrói os campos desertos

E a solidão cega os olhos cansados


Mas no fim do dia, com água ou sem ela,

O rio acaba sempre no mar

E a noite vem com o adeus do Sol

E a Lua vem com o fim da luz


Arrasto-me pelo deserto de um rio que flui

Nada me surpreende, nada me entristece

Nada me alegra, nada me distrai

A água que não corre não me molha

E a ansiedade não sai


Esqueletos sem rosto passam na sua atarefada vida fútil

Vidas sem cor que não me vêem

Conversas sem conteúdo que não têm fim

Interações repetitivas e sem destino


Mas no fim do dia sou osso sem carne

E o rio continua sem mim

E a montanha fica serena

E a planície nem se vê


Arrasto-me pelo sonho que tive e que deixei morrer

Nada me dá prazer, nada me dá vida

Nada é verdadeiro, nada me faz ser

O rio sem nome não acaba e a água há muito secou

A chuva cai salgada, e a terra salgou


Universo-Todo-Poderoso, não vês a falha que cometeste?

Em criar vida sem razão, em criar rio sem fim?

E quando a última estrela apagar-se e o último ser morrer

O rio continuará sem água e sem parar

Sem nunca se ver

-JM


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