Capítulo Vinte e Um

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Charlotte mal fechara seus olhos durante a noite, pois o medo de não acordar a impedia.

Seu relógio lhe dizia que eram três e meia da manhã quando levantou-se da cama trocando seu pijama por calça e blusa de manga longa. Observou a mochila no canto do pequeno quarto, enquanto fazia uma trança rápida para que o cabelo não atrapalhasse sua visão.

Com a mochila já nas costas, Charlie saiu do quarto com cuidado para não fazer barulho. Seu coração estava apertado, e sua boca seca. A sala/cozinha estava escura, mas a luz da rua iluminava o suficiente para que Charlotte não esbarrasse no pequeno e velho sofá e na mesa e cadeiras que se encontravam em lugares opostos do cômodo. A menina respirava pesadamente quando finalmente saiu de casa, e foi pega pelo frio da noite que a embalou pelo caminho. Ela seguiu por ruas conhecidas, entretanto caminhava pelos cantos mais escuros e olhava constantemente para os lados. O horário era extremamente perigoso, mas esperava não encontrar guardas pelo caminho, pelo menos não naquelas ruas, eles geralmente se concentravam nas laterais da comunidade e de hora em hora um saía para patrulha, isso claro, sem considerar os guardas que permaneciam na Casa.

Charlotte tentava não pensar. Não pensar nos riscos, na loucura, e principalmente, no medo. Caso fosse pega, nem imaginava sua punição e era isso que a perturbava.

Sua sombra seguia vagarosamente pelas ruas seguindo um caminho conhecido.

Por estar habituada, seus pés seguiam automaticamente pelo caminho com sombras a escondendo. "Como será lá dentro?" Charlotte se perguntava, imaginando o que havia dentro da Casa. A imagem de uma pilha de corpos veio à sua mente a fazendo balançar a cabeça negativamente tentando afastar tal pensamento.

Não notou nenhuma movimentação diferente até estar perto demais. Charlotte seguia por uma rua reta que era cortada por outra na horizontal, e desta rua à esquerda ela pode ouvir passos pesados. Era um guarda. Só podia ser. A menina parou imediatamente olhando para os lados em busca de uma alternativa, e sem melhor escolha, se escondeu na brecha entre duas casas, era escuro o suficiente para a acobertar.

O guarda finalmente cruzou a rua em que Charlotte estava, numa distância considerável mas ainda era possível distinguir sua forma, um homem alto e careca, com músculos definidos marcados por sua roupa. Ele parecia desconfiado e seguiu em frente com passos lentos, atento a qualquer barulho. Charlie olhou novamente ao redor em busca de auxílio encontrando uma pequena pedra no chão a observando por um curto tempo. Decidiu-se e num movimento estratégico a lançou na rua que seguia a direção oposta da qual seguiria. No mesmo instante, o guarda ao ouvir o barulho correu naquela direção se distanciando ainda mais da garota que em passos silenciosos e rápidos se afastou do local seguindo seu caminho com precaução.

Em pouco tempo chegou ao ponto principal, o Campo das Lamentações, a Casa se erguia distante e imponente, com um ar tremendamente perigoso. Não havia mais desculpas, não havia tempo para covardia ou desistência. Era ir ou ir. E, foi o que ela fez após respirar fundo. Charlotte caminhou com cuidado em direção à Casa, escondendo-se atrás da relva alta e seca que cercava o local, à noite tudo tinha um ar mórbido. Charlotte abriu sua mochila tirando de lá uma ferramenta que encontrara nas coisas de seu pai, envolvendo o martelo em sua mão como se sua vida dependesse disso. E de certa forma dependia, sendo a única coisa que poderia usar para se defender.

A garota sabia que não podia agir agora. Haviam cinco guardas visíveis que estavam ao redor da Casa numa conversa animada sobre as histórias que foram criadas sobre aquele lugar, desde fantasmas à assassinatos cruéis. Charlotte engoliu em seco e se agaixou para se esconder melhor, sabia que em algum momento eles sairiam para um intervalo breve, isso acontecia em toda a parte da Comunidade em certos horários, o que ela precisava era esperar. E isso era desesperador. Seus pensamentos começavam a lhe pertubar sem controle algum. Ela respirou fundo novamente. "Você consegue. Chegou até aqui." Pensava tentando não perder o controle de si.

Sua respiração fazia mais barulho que o esperado. Parecia alto demais, como se tudo estivesse amplificado, como se ela chamasse pelo perigo. A relva alta à sua volta era capaz de escondê-la, mas não bem o suficiente. Ela podia vê-los próximos. A Casa se erguia à poucos metros, e haviam cercas elétricas que demarcavam o caminho até lá, apesar de ser um espaço amplo o suficiente para a passagem de um caminhão, continha perigo na mesma intensidade do que se fosse um caminho íngreme.

Agora tão próxima podia ver com detalhes A Casa. Era madeira velha e podre e uma placa com os dizeres "Punição" estava pendurado sobre a porta. Havia uma escada de quatro degraus que levava à uma pequena varanda coberta por telhas quebradas, a semelhança com a casa de um menido era tão grande que Charlotte cogitou a ideia de que antes poderia ser o lar de um deles.

A garota enfiou a mão em um dos bolsos da calça e retirou de lá um papel dobrado diversas vezes. Ao abri-lo, observou a diferença entre a Casa à sua frente e o desenho que fizera da parte mais próxima que já chegara, o Campo das Lamentações. O desenho não possuía os detalhes como o tapete em frente à porta, a madeira quebrada e fraca, a sujeira que invadia o local e a pouca luz que entrava ali.

Charlotte encarou aquele lugar e pensou em seu pai. De repente, não conseguia mais mover seus pés, seu coração batia descompassado e suas pernas tremiam de tal forma que ela sentia que cairia a qualquer momento. Quando algo pior aconteceu.

Braços fortes a puxaram para trás, segurando firmemente suas mãos atrás das costas.

- O que pensa que está fazendo aqui? - O guarda lhe perguntou, jogando-a no chão.

Ao cair virou-se o encarando, ela sabia que era ele e isso doía muito, mas sua feição apenas demonstrava raiva. O martelo se encontrava no chão agora, e abruptamente Charlotte o capturou partindo pra cima de Steve que a impediu facilmente segurando seu pulso e retirando a "arma" de sua mão. Ela gritou frustrada e tentou se soltar, mas seu aperto que agora capturara sua outra mão era forte demais.

"Você precisa me soltar." Charlotte gostaria de dizer, mas não conseguia proferir uma palavra para aquele Steve.

- Olha o que temos aqui - Outro guarda se aproximou observando Charlotte tentando se soltar.

Suas emoções eram conflitantes e o medo de ter o mesmo destino de seu pai finalmente a atingiu.

- Deixe que eu cuido dessa, Donavan - Trustworth disse.

O guarda o encarou e sua feição era ilegível.

- Sabe que a punição não é a mais simples? - Donavan disse, mais como uma afirmação do que uma pergunta. - Levem-a para dentro.

Os olhos de Charlotte demonstravam seu desespero, eles corriam de um guarda para outro. Não. Ela tinha que fugir. Atingiu Steve com um chute e se desvencilhou correndo para longe deles. Achava que conseguiria escapar, seu coração batia tão rápido e o medo pulsava em suas veias, mas foi atingida por uma descarga elétrica e seu corpo foi ao chão se contorcendo, seus olhos arregalados e assustados. A fonte do choque era a arma do guarda Donavan que puxou Charlotte pelo cabelo a fazendo ficar de pé e algemando-a. Estava prestes a arrastá-la, quando uma voz distinta surgiu.

- Donavan, deixe-a - o guarda negro surgiu. - Ela não parece ter mais de 16, a punição é outra.

-Mas, general, ela estava prestes a invadir a Casa - Donavan se justificou, enquanto Steve permanecia calado.

- Eu disse deixe, obedeça às regras, Donavan- O General afirmou novamente com o que soou mais "Obedeça a mim". - Trustwoth a leve daqui, descubra seu nome e idade e daremos as punições corretas.

O guarda o obedeceu e puxou a garota para longe que ainda tentava se soltar, porém com algemas se tornou ainda mais difícil. A conversa entre os dois guardas continuou e por isso Charlotte parou de se debater.

- Senhor -Charlotte escutou Donavan.

-Não, Donavan, nós não colocamos menores de 18 na Casa de Punições. Será que preciso ensiná-lo as regras novamente?

Charlotte se esforçava para olhar para trás enquanto Trustworth a levava com brutalidade. Aquele homem, o general, pareceu familiar para ela, só não conseguia se lembrar. O observou uma última vez antes de se afastar demais.


Olá, conspiradores! Aí está a segunda parte do capítulo, espero que gostem. E agradeçam à Aless_Winchester por este capítulo, sem ela meu bloqueio não teria passado. Obrigada <3

A Menina da ConspiraçãoWhere stories live. Discover now