CAPÍTULO 23

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 Após levar a tripulação da Enir-7 para um breve passeio de reconhecimento pela rede subterrânea de túneis, que agora passara a ser a casa de milhares de pessoas, o velho chamou Zahra, Jad e Paki para uma reunião mais reservada. Além dele próprio e da Filha, Zétka, prima de Adeel, Ien também chamou os irmãos Oli e Stin, seus aprendizes. Na sala de paredes brancas, iluminada por lâmpadas incandescentes, livres de circuitos, arrumou cuidadosamente a mesa de jantar para que pudessem comer e se colocarem a par dos últimos acontecimentos.

— Essa é a coisa mais legal que já me disseram — disse Oli ao ouvir Paki contar toda a história que viveram até ali. — Vocês deram um salto quântico pra outro universo, viajaram no tempo e viram um buraco negro. Minha nossa!

— Não é tão legal assim — Paki respondeu ao garoto barbudo, que ainda refazia todas as contas nos dedos.

— Então você tem 52 anos — o menino apontou para Adeel —, e você tem 99 — apontou para Jad. — Isso é incrível.

Todos sorriam com a empolgação do rapaz, que realmente parecia entender o que foi dito. Seu irmão gêmeo, Stin, apesar dos mesmos genes e corte de cabelo, não parecia ter compreendido muito bem o que o imediato acabara de falar.

— Então — Adeel interrompeu as gargalhadas, seu rosto era sério —, contamos como chegamos aqui, meu tio. Como vocês conseguiram resistir à invasão?

— Nós? — balançou a cabeça. — Não teve nós nessa história. A nave chegou aqui como em todos os outros lugares. Primeiro o pulso, que apagou tudo, e depois a tempestade de raios vermelhos. Na hora, todos só pensavam em descer para o obrigo, mas o seu pai não. Seu pai foi para a Usina de Raios e ativou um dispositivo que ele mesmo havia inventado. Parecia que ele sabia que isso aconteceria.

— E onde ele está agora? Onde está a minha mãe?

— Ninguém soube direito o que aconteceu — continuou o velho —, mas muitos de nós viram um feixe de luz violeta atingir a parte de baixo da nave. Foi no momento em que aquele calor começou — olhou para os gêmeos e eles confirmaram com a cabeça. — Acho que eles estavam se preparando pra nos atacar. Eu ouvi uma explosão forte e de repente a nave foi embora.

— E o meu pai? Por que ele não está aqui?

— Encontramos o seu pai caído na Usina de Raios após os eventos daquela noite — o homem pôs-se a chorar. — Ele estava morto. Não suportou a radiação. Morreu pra nos salvar.

O Major não podia acreditar naquilo. Seu pai morreu. A pessoa que mais admirava no mundo morreu. Fechou os olhos e deixou a dor no peito e o bolo na garganta tomarem conta de seu corpo. Queria chorar, mas não o faria ali na frente de todos.

— E a minha mãe?

— Ela tinha a saúde frágil. Faleceu há dois meses de causa natural — Zétka respondeu pelo pai, que ainda chorava em silêncio. — Ela não sentiu dor, nem estava mais consciente.

A vontade de chorar aumentou. Olhou ao redor e viu os rostos sérios e pesarosos em sua direção. Ninguém diria nada se chorasse. Todos entenderiam a sua dor. Mas não conseguia. Não podia ser fraco agora. Todos perderam alguém e ele não era diferente. Engoliu a saliva que havia se acumulado na boca e continuou:

— Está bem — secou os olhos úmidos. — O que mais vocês sabem? — todos permaneceram em silêncio. Não era essa reação que esperavam. — Vamos lá, gente. O que mais nós não sabemos? — o silêncio permaneceu. — Vamos lá! — quase gritou.

— Bem... — Stin começou a falar — O pulso vem do norte quase que diariamente, antes dos cruzadores virem. Nós sempre os atacamos, mas são as naves mais rápidas que já vimos. Achamos que a nave gigante que o professor Denk acertou pousou no País 4 ou no 2.

— Mandamos alguns batedores pra lá, mas nunca retornaram — explicou Oli.

— E vocês descobriram a natureza do pulso? Sabem como proteger os equipamentos?

— Não — os gêmeos responderam juntos.

Todos ainda olhavam para Adeel com curiosidade. Como ele não se abalou com a morte do pai?

— Então acho que amanhã de manhã não teremos mais uma nave, né? — concluiu, pensativo.

— No que você está pensando? — Zahra perguntou ao ex-noivo.

— Acho que devemos ir pro norte agora.

— Você enlouqueceu? Não ouviu o que eles disseram? As naves deles são poderosas. Nós morreremos se formos pra lá.

— Eu sei. E essa é a melhor chance que temos de pegar uma nave dessas e descobrirmos pra onde foi o resto dos cidadãos de Sion.

— Você não está pensando direito, precisa descansar.

— Não. Precisamos atacar quando acham que estamos acuados. Voamos bem baixo até os sensores lerem algo. Seguimos por terra e roubamos uma daquelas naves. Elas devem ter um sistema de orientação parecido com o que vimos naquele planeta. Essa é a chave pra encontrar o nosso povo.

— Não acho que seja uma boa ideia, Adeel — sussurrou Jad em seu ouvido.

— Não. É uma péssima ideia, e é por isso que eu acho que pode dar certo. Eles não esperam algo tão estúpido.

***

Os gêmeos acoplaram o canhão à combustão na Enir-7 exatamente onde ficaria a arma de prótons, caso houvesse uma. Adeel convenceu Zahra a deixá-lo pilotar a nave, e todos partiram para o norte numa missão suicida que decidiria os seus destinos. Eles – Zétka, os gêmeos, Zahra, Jad, Paki e Adeel – eram a melhor esperança de Sion.

Voaram muito baixo, a ponto de Zahra querer pegar o manche algumas vezes. Adeel não pilotava uma nave há meses, mas parecia bem confortável no comando. Todos permaneceram na ponte durante a viagem. Paki recontava as histórias para Oli, que parecia se surpreender sempre com as mesmas coisas. Stin permaneceu sentado, observando as curvas de Zétka e imaginando obscenidades.

— Temos três armas, mas não pretendemos usá-las — explicou Adeel para todos mais uma vez. — O plano é pegar a nave. Zahra, você já pilotou tudo quanto é tipo de cruzador. O deles não deve ser tão diferente. Se tiverem dificuldades, sequestrem um deles.

— E se tudo der errado? — perguntou Stin sem muito interesse.

— As chances são grandes, mas eu estarei aqui se precisarem de ajuda. Desativem o pulso e poderemos revidar.

— Eu já disse que essa é a pior ideia do mundo? — comentou Oli.

Todos na ponte riram, exceto Jad, que aparentava estar com medo.

Voaram por quarenta minutos, até que os leitores indicaram a posição da nave invasora.

— Está no País 4 mesmo — Paki conferiu no computador. — A localização está no painel, Major.

— Muito bem. Vou pousar a duas milhas do ponto. Vocês seguem a pé até as naves. Qualquer coisa, me avisem.

Adeel assistiu aos seus companheiros sumindo no horizonte. Agora poderia colocar o seu plano real em ação.

— Agora é com vocês.



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VIA MATREA: Lua de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora