Trabalho

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Meu celular tocou, me avisando que estava na hora de beber água. Como estava em uma fase ligeiramente mais viciada em trabalho do que o usual, eu precisava de aplicativos que me lembrassem de me hidratar e, dependendo do serviço, de comer. Eu sei, é ridículo, mas o que fazer quando o bichinho workaholic te morde e não te larga mais?

Levantei da cadeira e me espreguicei, girando os pulsos, enquanto dava uma olhada no cômodo que eu estava utilizando de ateliê. Era um quarto menor, mas com espelhos em todas as paredes, o que tornava o ambiente menos claustrofóbico — caso isso fosse um problema para mim. Estava uma bagunça, cheio de retalhos, aviamentos, tesouras distintas, fitas métricas e papéis espalhados de croquis, desenhos técnicos e moldes.

Dei uma olhada no meu celular e subtraí as três horas de diferença que o pobre e danificado aparelho insistia em acrescentar. Anotei na agenda um lembrete para comprar um modelo novo na viagem e me levantei para finalizar o trabalho do dia.

— Ok, Lena, hora de arrumar essa loucura.

Organizei um pouco o ambiente, separando as peças ajustadas em montinhos de seus respectivos donos, e arrumei a papelada enquanto chutava os retalhos para debaixo da mesa em que coloquei a Magic Manson.

Peguei meu celular e mandei uma mensagem para Betty, perguntando se os outros membros da banda já haviam voltado do almoço. Ela respondeu rapidamente que todos estavam no estúdio, no porão, então eu desceria em breve com as roupas, já que precisava provar os modelos.

Dobrei as trinta peças, fruto do trabalho de ajuste das últimas horas, coloquei em duas pilhas imensas e fui até o estúdio, feliz da vida por poder finalmente reencontrar os integrantes da banda. Assim que entrei, fui recebida por todos com cumprimentos animados. Alguns, como Diego, o guitarrista engraçadinho, e Aline, a baterista que mais parecia atriz de novela, de tão linda, vieram me abraçar, e eu retribuí o gesto de carinho, ainda que estivesse com as pilhas de roupas nas mãos.

— Piranhaaa! — uma voz rouca ressoou pelo estúdio, e eu quase larguei as roupas no chão.

— Menina, não grita, deixou todo mundo surdo! — exclamei enquanto me abaixava para que ela me abraçasse. Era difícil retribuir com aquele monte de roupas na mão, mas eu fiz o meu melhor. Estava azul de saudades da pequena.

Gabriel estava encostado num canto, conversando com uma mulher desconhecida, que eu logo imaginei ser a tal da Erika, a outra segurança. Ela era muito bonita. Tinha o mesmo estilo da minha irmã: alta, esbelta, e dona de belos olhos de peixe morto — olhos que, assim como a pele negra, eu não herdei. Se ela e Júlia tivessem uma filha, seria, sei lá, a Rihanna. Ou a Joan Smalls. Um ser humano desnecessariamente atraente.

Uma pequenina pontada de algo me cutucou ao ver a proximidade dos dois, mas eu logo ignorei. Não fazia meu estilo sentir ciúmes de ninguém, ainda mais um colega de profissão.

— Aline, suas peças estão todas ajustadas nas medidas que você passou para o Pierre. Você pode experimentar quando der e me dizer se ficaram boas? Diego, para você falta aquele colete e uma camiseta. Tony, amoreco, suas roupas estão prontas, não tinha muito que acertar nelas... E Jim... — peguei a agenda no bolso do vestido e conferi as roupas do tecladista da banda, um irlandês com cara de velho, apesar de ser novo. — Não, você está com tudo pronto também. Experimentem, por favor.

Betty ergueu as sobrancelhas.

— Você ajustou essas peças em uma tarde?

Jim e Tony pegaram sua parte das roupas, me fazendo suspirar de alívio. Estava difícil equilibrar aquilo tudo nos braços. Só aí pude abraçar minha amiga e a erguer no ar, como sempre fazia. Assim que a soltei, ouvindo suas risadas, perguntei para a baixista da banda:

Amor nas AlturasOnde histórias criam vida. Descubra agora