9 - Não precisa agradecer

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Meu pai entrou antes que Brian pudesse dizer o que pensava pra ter aquele sorrisinho no rosto, junto com ele vinha o médico que me fez milhares de perguntas e alguns exames rápidos sem que precisasse tirar Angelina do meu colo, logo depois veio uma enfermeira trocar o meu acesso – o acesso da agulha na veia pra tomar medicação – e ela quase derreteu com tamanha fofura ao ver minha filha daquele jeito comigo.

— Quantos anos ela tem?

— Três – respondi sorrindo.

— Vocês formam uma família linda!

Eu engasguei com minha própria saliva.

— Nós nã...

— Obrigada – Brian me interrompeu e agradeceu com um grande sorriso, enquanto eu o fuzilava com os olhos.

Meu pai ria do outro lado do quarto, tentando disfarçar, mas sem sucesso. A enfermeira fez algumas perguntas e depois se foi, me deixando com outra bolsa de soro pra tomar. Meu pai, ainda me olhando com um sorriso sugestivo, levantou, vindo até o meu lado.

— Filha, eu já vou indo. Tenho que resolver alguns problemas do serviço e sua mãe não para de me ligar porque quer ir jantar na casa de Helena. Inclusive, ela quer que você vá, avisei que você não pode, mas sabe como ela é. Já vou levar Angel, deixar na casa da Sarah, tudo bem?

— Mas ela não me viu acordada...

Olhei minha filha, ela dormia tão serenamente que dava um aperto no coração pensar em tira-la dali.

— Acorda ela, Angelina vai acabar dormindo no carro novamente.

Pensei rápido e achei melhor fazer isso mesmo, minha menina precisava me ver acordada pra saber que estou bem e que não precisa se preocupar, então a chamei e assoprei seu ouvido, do jeito que faço sempre quando tenho que acorda-la.

— Mais um poquinho, mamãe.

— Você precisa acordar, meu bem, não quer ver a mamãe acordada?

Ela levantou o rosto com aquela cara de sono deixando seus olhos ainda menores e sorriu quando me viu a observando.

— Mamãe! – pulou no meu pescoço, o circulando com seus braços e apertando com toda a força que tinha.

— Oi meu amor.

Olhei rápido pra Brian que sorria de um jeito que nunca havia visto antes, mas tinha gostado, era um sorriso diferente e ele ficava lindo sorrindo assim.

— Por que você não acordava mamãe? Eu senti sadade.

— Ôh meu bebê, eu precisava descansar, dormir bastante, mas eu tô bem, tá bom? – ela assentiu – Agora você vai com o vovô pra casa da dinda e amanhã vai pra festa do pijama da Laura. Tudo bem?

— E você, mamãe?

— Eu vou ficar aqui, te esperando depois da festa.

— Depois da festa, você me trás aqui, vovô?

— Claro que sim, meu amor.

— Eba mamãe.

Eu sorri pra ela e segurei as lágrimas.

— Agora você tem que ir, mas se comporte viu? Senão, o vovô não vai trazer você mais.

— Pode dexar, mamãe.

A abracei, beijei e esmaguei, até que ela pulou para o colo do Brian, o abraçando também, e depois foi com seu avô para casa. Senti um vazio ao vê-la indo embora, mas era necessário, hospital não é lugar de criança, ela não podia ficar aqui comigo o tempo todo.

— Sempre foram você e ela contra o mundo?

— Sempre. Acho que por isso somos tão apegadas uma a outra.

— Mas e o pai dela? Vítor, não é?

— Sim... Ele me ajuda em tudo, é um pai presente e amoroso, Angel ama ele demais, mas só nós duas sabemos o que passamos e o que enfrentamos.

— Eu achava que você era só mais uma filhinha mimada que o pai queria mostrar a realidade da vida e fazê-la trabalhar pra poder gastar, sabia?

Eu ri e coloquei a mão na barriga, doía um pouco.

— Sério? Eu acho que isso até poderia acontecer, se eu não tivesse a Angelina. Ela me fez enxergar o mundo de outra forma sabe? Eu sou uma pessoa muito melhor hoje graças a ela.

— Como foi... Como foi quando você descobriu que estava grávida? Ele te ajudava?

— Foi complicado... No começo, eu não quis aceitar, fiquei bem mal, mas Vitor nunca saiu do meu lado, nós ainda namorávamos quando Angel nasceu, nunca tive do que reclamar sobre ele.

— Foi você quem terminou?

— Foi. Uma das decisões mais difíceis que já tive que fazer.

Brian assentiu e abaixou o olhar.

— Você ainda o ama, não é?

Sua voz saiu baixa, mas eu escutei e sabia o quanto aquela resposta era esperada por ele, dava pra ver em seus olhos quando levantou o rosto novamente e me encarou.

— Sempre vou amar. Vítor é uma das pessoas mais importantes da minha vida, mas não é como antes. Eu o amo, mas...

— Ele está noivo de outra, não?

— Sim, Victoria...

— Você nunca mais ficou com outra pessoa?

— Nunca mais.

— Por que?

— É difícil explicar.

— Você pode tentar.

— Minha história não é um conto de fadas, Brian. Muito menos um clichê romântico adolescente.

— Nunca fui fã de clichês.

— Você é um.

— Essa doeu – se fingiu de machucado com a mão sobre o coração e eu ri.

Nunca havia conhecido esse Brian, mas gostava muito mais dele. Seus olhos tinham um brilho diferente e não desgrudavam dos meus.

— Me explica... Foi por causa daquilo que eu cheguei a conclusão na sua casa?

Abaixei a cabeça, o que o fez entender que sim, era por causa daquilo. Brian já tinha descoberto um dos meus segredos.

— Quem foi?

— Quem foi o que?

— Que fez isso com você.

— Brian... Eu, eu não falo sobre isso com ninguém.

Meu chefe deu um soco na cama, fechando o rosto em um das suas caretas de quando fica realmente bravo com algo, seus punhos estavam fechados e sua respiração mais pesada.

— Você não vai me falar mesmo?

— É pessoal.

— Eu posso te ajudar, você não entende?

— Você já fez muito por mim, eu tenho que aprender a me virar sozinha, eu tenho uma filha!

— Essa é a questão, você não precisa aprender a se virar sozinha, droga!

Sua voz subiu alguns tons acima do necessário e eu engoli a vontade de derramar algumas lágrimas ao lembrar desse passado. Brian respirava ofegante e agora olhava algo lá fora pela janela com as mãos nos cabelos, deixando-os ainda mais bagunçados. Eu juntei minhas forças, fechei meus olhos e prendi a respiração.

— Eu fui estuprada, Brian – soltei o ar em seguida e o encarei, agora de frente para mim – E essa pessoa ainda convive comigo.

— Não foi o Vitor – ele afirmou.

Neguei com a cabeça e ele voltou a colocar as mãos no cabelo, dessa vez os puxando com agressividade. Brian sentou na minha cama, pegando minha mão e colocando entre as dele, mas eu a puxei de volta.

— Eu sinto muito – disse ao olhar minha mão agora longe das dele.

Minha vida depois de você Onde histórias criam vida. Descubra agora