6 - Uma explicação

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Bati a porta atras de mim e fui até meu carro, já saindo em certa velocidade com ele. O caminho até a casa do Victor foi o meu momento de tentar relaxar, teria minha filha nos meus braços novamente e era só isso que importava. Chefe nenhum estragaria meu dia.

Engoli a seco o bolo que se formou na minha garganta por ver o carro da atual namorada de Victor logo ali na porta. Estacionei o meu atras e tomei coragem. Caminhei devagar até o interfone do portão, toquei e logo abriram o mesmo. A porta da frente foi aberta e Angel apareceu, vindo correndo até mim e laçando minhas pernas em um abraço apertado. Peguei-a no colo e enfiei minha cabeça em meio aos seus cabelos, sentindo seu cheirinho de neném tão gostoso.

Victor apareceu na porta também, mas não demorou para Victoria envolver seus braços na cintura dele. Ela sempre fazia questão de tocar nele quando eu estava por perto, não sei o quanto ela sabe sobre o nosso termino, mas com certeza Victor deve ter comentado algo sobre eu não suportar mais essa troca de carinho íntimo. É estranho, demais até, mas eu sobrevivo.

Fui até eles, cumprimentando ambos e já pegando a bolsa de Angel, me despedindo em seguida e indo com ela, ainda agarrada a mim, para o carro. Ela foi o caminho todo até em casa contando como foi ficar com o pai e quão legal era a boneca que Vick deu de presente e que havia ficado no Victor. Não gostava muito de Vick ficar dando vários presentes pra minha filha sempre que a via, era como se tentasse comprar o afeto dela com futilidades, mas mesmo já tendo pedido pra Victor conversar com sua noiva, não adiantou de nada e ela continuou fazendo o mesmo de antes. Em casa, Angel me deu a mão pra entrar e eu me senti energizada, ter minha filha comigo sempre me deixava feliz e fazia-me sentir invencível.

Assim que abri a porta, Brian apareceu no hall de entrada e Angelina foi até ele que agachou pra pega-lá no colo.

— O que você ainda tá fazendo aqui?

— Esperando você.

— Por que?

— Porque ainda tô esperando uma explicação.

— Espere sentado. Você é só meu chefe, Brian, não esqueça disso.

— Mesmo assim, você surtou do nada Pietra, só porque eu te segurei.

— Sobe – me olhou sem entender – sobe pro quarto.

Eu não iria contar tudo pra ele, só dar uma dica do que ele não deveria fazer pra aquele surto não acontecer mais. Rumei até o quarto da Angel e ela logo se animou ao ver seus brinquemos, indo até lá. Já eu sentei em uma das mini cadeiras da mesinha de desenho dela que mal cabia uma banda do meu bumbum, Brian sentou no chão, mas ao meu lado. Próximo demais.

— E então? – deu início.

— Eu tenho uma espécie de trauma quando pessoas me seguram, puxam ou tocar com certa brutalidade sem a minha autorização. Às vezes, mesmo um toque delicado já me assusta – o que era meia verdade, não era só às vezes – por isso prefiro que não me toquem de maneira alguma.

— E qual a razão pra ter esse trauma?

— Algo que aconteceu uns anos atrás.

— Esse algo seria?

— Não quero falar disso, Brian. Você já sabe o motivo do surto, agora já pode ir.

Vi sua mão vir devagar até a minha que estava no meu colo. Ele encostou primeiro no meu dedinho e eu fechei os olhos tentando me controlar, mas quando ele colocou a sua mão inteira na minha com a intenção de entrelaçar nossos dedos, eu a puxei com força e sai de perto dele.

— Não faz isso, por favor, não pretendo ter outro surto na sua frente.

Disse com a voz embargada. Brian se aproximou, ficando na minha frente e senti sua respiração nos meus cabelos.

— Eu preciso te dar um abraço, Pietra, ainda mais se esse trauma for pelo motivo que eu tô pensando.

Deu mais um passo pra frente e eu coloquei a mão em seu peito, sussurrando um não.

— Por favor, Pietra. Eu não estaria te implorando se não sentisse essa necessidade de te abraçar.

Segurei o choro e senti a ponta de seus dedos em meu braço, subindo bem devagar, a outra mão foi até minha cintura de forma delicada e ele pediu que eu desse um passo pra frente, que não aconteceu, e por isso ele fez por mim. Sua respiração já tocava meu rosto como uma brisa leve, ele fez menção de erguer meu rosto, mas desviei de sua mão antes, depois pegou meus braços suavemente e ergueu até seu pescoço, os colocando lá. Minha respiração estava descompassada e eu mordia o lábio inferior na tentativa de conter o choro, mas falhei consideravelmente uma vez que uma lágrima e outra escorreram pelo meu rosto.

— Eu não vou te machucar Pietra, confia em mim.

Quando ele pousou as mãos na minha cintura pra me puxar pra ele, soltei um soluço e me afastei rapidamente, indo até Angel e sentando ao seu lado que quando me notou pulou no meu colo.

— Você tá cholando mamãe?

— Não meu bem, mamãe está bem.

Brian ficou parado no mesmo lugar como se não acreditasse que eu tinha mesmo feito aquilo. Mas qual é, qual a parte do "tenho trauma de toques" ele não entendeu?

— Acho melhor você ir, Brian.

(...)

Brian havia me dado a quinta de folga por ter ido com ele ao evento, por isso aproveitei pra curtir minha filha. Levei-a em um parque, onde brincamos a manha inteira, depois fomos almoçar no Mc Donald's e em seguida fomos em um cinema, assistir Procurando Dory. Foi um dia divertido onde pude esquecer dos meus problemas e focar somente no maior e melhor presente que já recebi, mesmo que tenha vindo de forma errada.

Angelina dormiu no caminho de volta pra casa, coloquei-a em sua cama e fui para o meu quarto, ligando uma das playlist no som num volume que não a acordaria. Sara me ligou nesse meio tempo, me chamando pra ir até o Cafee de La Lune junto com ela e Kevin.

— Angel está dormindo, não posso sair.

— Ah amiga, trás ela!

— Você entendeu o que eu disse? Dor-min-do.

— Como se você nunca tivesse saído com ela assim.

Quando fui responder, Angel apareceu na minha porta, coçando os olhos e me chamando.

— Que praga foi essa que você fez? Ela acabou de acordar!

— Sua filha sabe quando você precisa dos seus melhores amigos por perto. Quero vocês aqui em 15 minutos.

E desligou.

— Vem cá, meu anjo.

— Ela a tia Sala?

— Sara, bebê. Era sim, você quer ir ver sua madrinha e seu padrinho?

— Xim mamãe.

— Então vamos, antes que ela me ligue de novo.

Coloquei um casaco por sobre seu ombro já que começava a esfriar e saímos novamente, agora rumo a cafeteria que foi nosso "point" durante boa parte do tempo de escola. Passar em frente ao meu antigo colégio era ter a sensação de nostalgia apoderando meu corpo, fora uma época muito boa que eu até sinto falta. Pouco tempo depois já havia estacionado o carro e andava até o café de mãos dadas com Angel. Quando a porta foi aberta e o sino, já muito conhecido por mim, anunciou nossa chegada, minha filha avistou seus padrinhos e logo saiu correndo até eles, ignorando totalmente o fato de ter deixado sua mãe pra trás. Eu ri sabendo que ela estava morrendo de saudade de Kevin que estava viajando a trabalho.

— Sua mãe tá de tpm, meu anjo? – ouvi Sara perguntar quando me aproximei da mesa.

— O que é dpm dinda?

Sara gargalhou e disse que não era nada, sentei-me ao lado do Kevin, deitando minha cabeça em seu ombro e enrolando meu braço no seu. Era diferente quando eu tomava a iniciativa de tocar na pessoa, não sentia medo, por isso tanto ele quanto Sara sempre esperavam que eu os tocasse primeiro. Além de Victor, somente os dois sabiam sobre o estupro, mas não sabiam quem me fez isso e nem que Angel não é do Victor. Era um segredo que morreria comigo, se fosse preciso.

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