22- Livre

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Um mês se passou, para ser sincera quase não me permitiram depor, me julgaram incapacitada, os psicólogos diziam que eu estava muito abalada para poder falar sobre o que aconteceu, e mesmo que eu falasse a verdade parecia que as pessoas só queriam ouvir o que queriam, não aceitavam a verdade, Ryan não se defendeu das acusações e foi preso pelo assassinato de meu tio, de Julia e também por sequestro e por me manter em cativeiro, além de tortura e outras coisas. Me fizeram mudar de nome, mudar o corte de cabelo e as roupas, mudei de estado também, tudo fazia parte do programa de proteção segundo o que eles disseram, eu não tive muitas escolhas, mas as poucas que me permitiram fazer eu fiz, falaram tantas vezes que eu estava doente que por um momento eu quase acreditei, por isso aceitei tudo o que estava acontecendo. Colocaram meus documentos no nome de Louise o sobrenome eu pedi Joan, Louise Joan, meus cabelos longos agora estavam pela altura dos ombros, pedi para cortarem uma franja na altura de meus olhos e um corte perfeitamente reto em todo o cabelo, passei a usar muito mais maquiagem e mudei minhas roupas, muito mais preto, couro e roupas justas, algo mais sexy para uma mulher mais livre, foi primordial que apenas o programa de proteção à vítima soubesse minha verdadeira identidade e para ser sincera eu contava muito com isso. Soube que Ryan estava sendo um preso de comportamento exemplar, ele estava detido no estado onde eu morava, eu não poderia voltar até que se passasse no mínimo um ano e meio, e depois disso eu só poderia ficar durante um mês, eram as ordens, eles tinham medo que minha fascinação por Ryan me fosse destrutiva, mas nada me era destrutivo, o ponto era, eles não entendiam o quão livre eu me sentia. Coloquei dois piercings de argola na orelha, um para cada morte, escolhi a orelha para ter pouco espaço assim as mortes teriam que ser por um bom motivo é não só por prazer, por que devo admitir que depois avaliando bem eu senti muito prazer, eu entendi que o choque que sofri foi um rompante, separando um tempo do outro, um acontecimento que separava o antes do depois, e isso era muito importante, agora eu era uma nova pessoa, uma nova mulher, ou melhor, eu sou quem eu sempre quis ser.
Como atividade terapêutica me receitaram fazer lutas para aliviar o estresse e para estragar os maus pensamentos do tempo vivido, eu decidi fazer boxe, mantinha meu corpo saudável e rápido, e para mim era interessante, músculos resistentes e velocidade, nunca se sabe quando vai precisar. Eu já não falava com minha mãe  à mais ou menos quinze dias, disse que precisava de um tempo e assim foi, na verdade com todo o processo tudo era muito ressente, havia me mudado há menos de quinze dias e comecei a terapia ha três semanas, a mudança de visual veio há uma semana e meia e o boxe, bom essa era a primeira semana, tive que tomar muitas vitaminas para recuperar um peso saudável e agora eu estava focada em melhorar por fora para garantir o que queria por dentro. A verdade é que mesmo sendo fascinada por Ryan e o entendendo agora, nada me faria esquecer o que ele me fez, o que passei naquele lugar, as coisas que tive que passar, não era um página virada e às vezes durante o treino eu tinha lapsos de memória de tudo isso e mesmo com o tratamento eu pouco falei sobre o que aconteceu naquele lugar, mas nunca contei onde era, disse que não lembrava bem, o que era uma verdade, eu não sabia exatamente onde estava.
                   * Um ano depois*
Já se passou um ano sob essa condição, consegui um novo emprego em um escritório bacana e estava em um apartamento agradável no centro da cidade, mesmo assim eu me sentia inquieta, me sentia presa, algo estava me atravessando a garganta e não me permitia continuar, não me permitia explodir e transbordar. A sensação de satisfação que eu tive a um ano atrás se foi de alguma forma, e então eu percebi que meu corpo tinha um pedido não concluído, um clamor não ouvido e por isso eu me sentia tão presa, porque eu estava me prendendo novamente, era hora de me libertar então planejei meu esquema, em dois meses eu teria aquilo que eu queria, era muito simples, era só deixar as coisas nas entrelinhas, isso eu aprendi no tempo que estive com Ryan.
Nas sessões de terapia passei a deixar coisas no ar, eu não menti, disse que me sentia livre, claro que sentia as molduras da sociedade entrando me segurar, mas com tudo me sentia de certa forma livre, finalmente falei sobre meu tio e a ameaça que ele me representava, como ele se foi eu me sentia mais segura, me sentia capaz de seguir em frente finalmente e parar de me colocar em situações nas quais eu estava por baixo, disse que tudo o que passei não foi apagado, mas que de certa forma me ajudou a evoluir para alguém melhor, ao invés de simplesmente ficar dizendo que eu era responsável pela morte daquelas pessoas. Isso ajudou e agora eles queriam me ver totalmente reabilitada para poder me dar alta, sempre falava que sentia falta da minha cidade, queria voltar, que sentia que eu estaria melhor se eu concluísse o que deixei para trás, claro que como as pessoas só ouvem o que querem ouvir todos achavam que eu tratava da minha família, mas não era.
Um mês se passou e eu me vi livre daqueles remédios que me deixavam confusa e me faziam esquecer de quem eu realmente era agora, me empenhei no trabalho e comecei a fazer amizades, sair e me divertir, mas aprendi com Ryan que tudo deve ter um propósito para que nossas metas fossem cumpridas. Também comecei a mandar cartas par a minha mãe, disse aos psicólogos que me sentia melhor escrevendo, me sentia melhor com papel e caneta na mão, e então, como sabia que eles checavam as cartas que eu mandava tratei de deixar claro como minha vida estava bem e como eu sentia saudade de minha cidade, como eu estava feliz e falava sobre coisas fúteis como amigos e trabalho, como se eu fosse a velha Lizi, bom não menti em nada, endossei um pouco as coisas mas não menti em nada, mas minha cabeça maquinava em cada passo que eu dava, troquei o boxe por dança, não por gostar, mas para me sentir e ser mais leve, mais astuta, então fiz ballet clássico, movimentos precisos, disciplina, força e leveza, coisas realmente importantes, mas claro ainda o efeito que isso causava na minha imagem era muito eficaz, parecia que eles acreditavam que eu estava "voltando" de seja lá onde eles acham que me perdi, isso era ótimo, quanto mais pensassem isso melhor seria, eu me esforcei para ser sorridente e o mais tranquila possível, para mostrar que eu era bem melhor sem aquelas porcarias de remédios.
No mês seguinte alcancei meu objetivo, alta médica, agora eu era considerada sã, pedi como último exército me libertar de qualquer rancor escrevendo uma carta para Ryan a quem chamei de agressor para que achassem que eu conseguia ver o "lugar que ele deveria estar " minha psicóloga achou um ato autista mas disse que teria que dar uma lida antes de entregar para se certificar de que eu realmente estava bem com tudo isso, confirmei que não haveria problema nenhum, aprendi a fazer o jogo da maneira que deveria ser feito então não seria um problema.
Foi uma noite inteira só pensando no que escrever, eu tinha um jogo para ser em feito e concluído com destreza, e tinha muito mais que isso, tinha todas as coisas que eu queria dizer, as coisas que eu queria que ele soubesse, um ano sem ao menos trocar o mínimo de palavras, também não nos encontramos no tribunal, nem me permitiram ir para lá, coletaram meu depoimento em meu antigo apartamento e agora eu estava nesse em que boa parte foi paga por Ryan como parte de sua pena, e o engraçado é que este fato me fazia sentir mais próxima dele, como se na verdade nunca tivéssemos nos separado na verdade, era tudo uma questão de perspectiva, ele precisava de um estalo e eu precisava de um aval para dar este estalo discretamente, ele sabia o que fazer, ele sempre sabia, era como um daqueles bons jogadores de xadrez que te fazem acreditar que está ganhando a partida para depois mostrar que ele já previa todas as suas jogadas e por fim vencer o jogo com uma destreza inigualável, ele era assim, só que com a vida, e eu? Eu era uma aluna de sua grande inteligência. Eu olhava para o papel e pensava como ele faria isso em meu lugar, mas como ele dizia eu tinha que ser livre então começo a escrever e rabiscar coisas que eu realmente queria dizer, coisas que eu senti, depois de algumas horas eu tinha algumas coisas reunidas, re li e lá estava o que eu queria depois de alguns bons ajustes.
Pela manhã fui até minha terapeuta e entreguei a carta, ela leu pouco mais de duas vezes, deu de ombros e sorriu.
-Parece tudo muito bem Lizi, e parabéns pela atitude altruísta.- eu dei um sorriso e ela me devolveu a carta, agradeci e logo depois ela me entregou o atestado de alta médica, eu estava animada, e fiquei ainda mais feliz em ver meu verdadeiro nome no documento, ela me entregou uma outra via com o novo nome só para garantir e não haver qualquer problema, juntei todos os papéis e voltei para meu novo apartamento, lá enviei em anexo por e-mail para meu advogado o meu atestado pedindo que ele informasse as instituições governamentais necessárias, depois peguei um envelope e um selo, preparei a carta e fui até o correio animada.

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