6- Lição um

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Eu já estava quase soterrada, e praticamente sem voz para gritar, eu suava tanto e chorava tanto que minha pele ardia, eu sabia, eu provavelmente seria sufocada, algum daqueles bichos asquerosos entraria em minhas vias respiratórias e eu encontraria meu fim, ou pelo menos chegaria bem próximo e ele estaria lá vendo tudo.

-Seja forte menina, não decepcione- ele dizia entusiasmado como se aquilo fosse um tipo de jogo.

-Por favor... por favor...- minha voz agora era fina, quase não a tinha, e as lágimas pareciam perto de acabar, eu não tinha mais a capacidade de chorar, e as baratas estavam perto do meu rosto, meus braços estavam estendidos e eu tentava me agarrar ao ar, me debatia constantemente, meu estômago se embrulhava e eu sentia vontade de vomitar, quase vomitei, mas precisava respirar, então me segurei. Elas já estavam muito perto, então fechei meus olhos e segurei minha respiração, aceitei e uma ultima lágrima rolou do meu olho esquerdo,  chega, acabou.

Quando meu corpo foi tomado por aquelas baratas, nenhuma tinha entrado nas vias respiratórias, mas eu não conseguiria segurar meu ar por muito tempo, enquanto imagens rodavam minha mente e frases me lembrando o quanto eu  nunca mais veria minhas amigas, como eu nunca conseguiria aquela promoção, ou como eu nunca mais veria minha mãe, ou mesmo ter filhos, eu nunca conheceria um cara que me amasse ou como eu nunca chegaria aos 30, mas algo bem sutil dentro de mim e quase sufocado dizia "seja mais, é isso que ele quer, seja mais" como eu seria mais? eu estava fadada a morte e meu pavor estava me submergindo, era mais que ser forte, era mais que  suportar, era ser maior que eu mesma, e isso eu ainda não sou, mas a voz, ela continuou, ela tentou de novo, dizia para que eu fosse forte, eu seria mesmo destruída por pragas? eu estava aceitando, na verdade já estava aceito, o que eu iria fazer? "comer as droga das baratas e arranjar um jeito de sair de lá", comer baratas? acho que a morte é mais aceitável. Não! onde estou com a cabeça? iria desistir de mim tão fácil? isso é sobrevivência, comecei a me agitar e com algum esforço consegui emergir, ele ainda tinha seus olhos em mim, ainda me fitava, vidrado como quem via um bom filme.

-Ryan!

-Que bom que emergiu meu bem, está começando a sobreviver.

-Ryan, já chega estou aqui, viva e já deixei o pânico- tentei parecer o mais segura possível.

-Não fez tudo o que pedi, vamos seja valente! se você come carne de vaca você come de barata, são bichos. - ele parecia estar falando sério e eu fiquei chocada, sério que ele queria mesmo comparar? Eu sinalizei com a cabeça que não meu rosto estampava o nojo que sentia só de imaginar.- Viu só? você não superou nada, e se eu fosse você seria rápida, elas estão ficando impacientes, logo vão começar a entrar em suas vias respiratórias.- senti uma sensação estranha na parte interna da coxa e aquilo me acordou, elas começariam a buscar uma saída por todos os orifícios do meu corpo, e então o desespero me domou, chorei novamente, o nojo tomou conta de minha face e em um ato de sobrevivência tomei uma das baratas na mão, eu a aproximei do rosto, um refluxo me veio, mas eu engoli, ele surgiu de novo e por questão de segundos eu não vomitei, fechei meus olhos, respirei fundo, e com meus músculos do rosto contraídos abri a boca, mas.. repudiei, engoli seco e repeti o processo, e finalmente mordi aquele corpo que se debatia entre meus dedos, quase vomitei com as sensações que tive, ouvir o som como se algo "crocante' estivesse sendo mordido, uma especie de gosma se dissipando em minha boca e lábios e as antenas que se moviam, ah... que pavor, mas eu engoli, respirei novamente, abri meus olhos e vi Ryan me olhando sorridente, aquele sorriso me possuiu de ódio e meu corpo fervilhou, olhei para ele fixamente e enfiei o resto da barata em minha boca e mordi outra olhando para ele com toda minha raiva em meus olhos, para ser sincera eu nem ao menos senti o gosto ou as sensações, a ira em mim falava muito mais alto.

-Feliz Ryan? Feliz? comi essa droga na sua frente seu palhaço!- falei com a boca cheia e enquanto mastigava, fiz questão que ele visse aquilo, joguei o pedaço de uma das baratas que comia violentamente contra o vidro.
-Viu? uma pressãozinha faz milagres, fique tranquila você vai sair daí- ele parecia sereno, caminhou até o fundo da sala e trouxe com ele uma corda e uma escada, ele subiu pela escada até o gancho que me pendia no teto e amarrou a corda, em seu comprimento tinha alguns nôs e ela era longa, quando ele a soltou quase tocava minha cabeça. - Vamos, suba, a e se eu fosse você seria rápido. - ele sorriu e desceu as escadas, tirou um controle do bolso e apertou um botão e ouvi uma voz robótica "Processo de incineração iniciado, 20 segundos para total incineração", eu ouvi certo? Sim eu ouvi,céus, ele iria me matar! o que eu faria agora? eu me debatia em desespero e pânico e então me lembrei da corda, sim a corda, eu sabia muito bem que não tinha força suficiente, mas eu tinha que tentar me salvar e,tão estiquei meus braços para cima e agarrei a corda tentei puxa-la buscando elevar meu corpo, meus músculos tremiam de tanto fazer força e minhas mão começaram a escorregar, e quando eu consegui me mover poucos centímetros lancei uma das mãos tentando alcançar o primeiro nó, me agarrei a ele, mas claro, melhor seria se minhas mãos estivessem a cima dele, tudo bem, comecei a suar frio, olhei para baixo e vi algumas baratas em minhas pernas e comecei a sacudi-las tentando fazer com que saíssem de mim, mas devo admitir que estava mais resistente ao sentimento que geralmente tenho por elas, meu proposito era sobreviver. Flexionei suavemente meu braço até onde minhas forças aguentavam e naquele momento eu lancei meu outro braço e me agarrei a corda a cima do nó, finalmente mais firme coloquei minha mão sobe a outra e flexionei meus braços me elevando e finalmente meus pés estavam fora daquelas baratas, novamente eu sacudi minhas pernas para despende-las de meu corpo e logo depois estendi minha mão para alcançar o próximo nó e me agarrei a cima dele, então escutei a voz robótica novamente "10 segundos para incineração" meu sangue gelou e uma força anormal surgiu em mim, eu sei de onde ela surgia, do medo, e então coloquei meus pés sob o primeiro nó e fui avançando totalmente desajeitada e por vezes minha mão ou pé escorregavam, e olhava para baixo constantemente.

-Vamos querida, você está quase segura, vamos.- ele me encorajava como se estivesse me fazendo um bem, mas eu não tinha como responder ou dizer qualquer coisa, aquilo ia pegar fogo e eu não sei que altura eu deveria subir para conseguir estar segura, a voz robótica alertou-me novamente: " 3 segundos para incineração total." Meu coração disparou, senti como se fosse sair pela boca, faltava apenas mais dois nós e eu estaria próxima ao gancho subi mais um, mas já tinha começado, vi as baratas queimando diante de meus olhos, algumas tentando fugir, mas o fogo era consumidor e veloz, ele começava a subir e todas iam morrendo exceto algumas que tinham sucesso em fugir, o fogo não ia até as superfície da caixa de vidro, ele subiu até dois terços da caixa e estava á alguns centímetros da corda, e o fogo simplesmente não subia, ele era azul, o que indicava gás, ou seja, era controlado, olhei para Ryan, o odor era a menor das coisas, o que me enojava era a face serena que ele tinha com um sorriso suave que deixava bem claro que ele sabia muito bem que não precisava que eu chegasse naquele ponto, que eu não tinha que ter todo aquele pânico e ainda o medo de o fogo pegar na corda e começar a encendia-la, minha respiração era pesada, meus músculos tremiam, e eu sentia o suor escorrer pelo meu corpo e olhava para Ryan indignada, não era possível que a mente dele fosse tão doente assim, que ele fosse tão mal e sua mente tão deturbada.

Ele colocou uma escada grande de metal perto de mim para que eu pudesse descer, estiquei minha perna e estabilizei meu pé no primeiro degrau, logo depois fiz o mesmo com o outro, e apenas quando desci o primeiro degrau soltei a corda, tive cautela com os degraus, eram muitos, tinha de ser prudente, eram muitos sentimentos e nenhum pensamento em minha mente, os sentimentos eram fortes de mais para ter barulhos de pensamentos na minha cabeça.

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