Reencontro

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Quando fiquei sozinha, me senti oprimida com o tamanho da casa, lá fora o dia já estava se despedindo deixando uma cor alaranjada que fazia os vitrais da sala brilharem com extrema beleza.

Novamente girei o corpo olhando os detalhes das almofadas, o tapete enorme no chão, os quadros opulentos na parede e o dourado em excesso nos enfeites das molduras. Não era uma casa que combinava conosco e me senti incomodada ao lembrar o pequeno grupo de famigerados que nos bloqueou na rua, uma discrepância tão grande de distribuição de recursos. Tão injusto ver uns com tanto e outros com nada.

A batida urgente me arrancou de meus pensamentos. Andei silenciosa até a porta, estava receosa de quem poderia estar batendo. Comecei até cogitar o que eu faria. Se fosse outro assassino eu conseguiria pelo menos ganhar tempo para alertar meu pai? E se fosse um dos soldados dele preocupado com seu estado?

Não querendo arriscar ser pega de surpresa, puxei um pouquinho a cortina da janela e espiei na direção da porta. Meu coração disparou ao ver os cabelos negros e lisos caídos naquele rosto. Não pude deixar de reparar que ele estava ainda mais forte do que eu me lembrava, pois seu corpo largo e os braços fortes se exibiam soberanos mesmo por cima do tecido da fina camisa.

Novamente ele bateu soltando um suspiro pesado, sua postura demonstrava impaciência e soltei uma imprecação baixinha. Não tinha como fugir, tinha que abrir a porta. Andei quase sem fazer barulho até a maçaneta, não sabia como agir diante da visita inesperada. Por fim respirei fundo para juntar coragem, virei a chave e abri de uma vez.

Tiago ficou surpreso, seus olhos negros muito abertos se estreitaram confusos para mim, suas narinas dilataram e ele soltou o ar devagar pela boca semiaberta. Era compreensível visto que eu não tinha avisado ninguém que viria, mas ainda assim não esperava que ele ficasse tão afetado em me ver e não consegui interpretar se ele estava feliz ou não, de todo modo eu fiz uma vênia respeitosa.

— Majestade.

— Não faça isso. — Pelo tom de sua voz ele parecia chateado e levantei os olhos cheios de confusão para ele. Ele já devia estar acostumado a esse tratamento que o título lhe conferia.

— Como?

Evitei olhá-los nos olhos, ele podia até dominar meus sonhos, mas ele era o rei e eu não podia esquecer isso. Constrangida ao extremo prendi o ar quando senti seu dedo em minha pele e levantei o rosto quando ele segurou meu queixo. Não foi fácil manter a respiração regular quando o encarei. Ele realmente parecia chateado.

— Peço que não se curve, não quando não tenho os malditos corvos me observando. Vim como homem e não como rei.

Fiquei sem reação. Me lembrei que deveria tê-lo convidado a entrar há vários minutos, na verdade acho que minha surpresa e minha confusão com a aproximação excessiva de nossos rostos ficou muito clara porque um lado de seus lábios subiu em um sorriso torto e malicioso.

— Mas se não for pedir muito, gostaria de ser convidado a entrar, está esfriando sabe.

— Ah! Claro... Perdoe-me. Entre por favor.

Puxei o rosto para me livrar de seus dedos que não tinham desgrudado do meu queixo e saí do caminho, ele entrou me olhando de canto e murmurou um obrigado nada amistoso, porque ele tinha se irritado agora eu não fazia ideia. Ele não parecia entender que para mim era difícil saber como agir, ou como trata-lo, na verdade esse jeito dele estava a me tirar a paciência. Ele olhou para a escada.

— Como está André?

— Ele dorme, eu ia agora mesmo preparar algo leve para ele. Então... — Olhei para o sofá e depois para a escada tentando decidir o que fazer. Podia convidá-lo a sentar ou então convidá-lo a subir para ver meu pai. Estava quase desesperada para me livrar daquele olhar que parecia condenar cada ação minha, quando ele me segurou pela mão e me arrastou para a cozinha.

Tratado dos Párias- O rei rebelde. ( Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora