A rua do mercado colorido estava vazia. Meu cavalo trotava fazendo um estardalhaço maior por não ter a balbúrdia do dia abafando o som dos cascos.
Esse reino! Como conseguiram viver dessa forma? Se não fosse pelo passado eu não teria aceitado a oferta, mas cá estou eu. Um herdeiro de um antigo sobrenome esquecido pelo tempo, mas lembrado entre os meus.
Um herdeiro de sangue passando uma temporada no inferno! Um bastardo filho da terra e da noite, um segundo que tinha que proteger o primeiro do terceiro, eu sei... Complicado, mas essa é a hierarquia dos meus.
E seguindo a boa fama desse nome eu também sou um assassino e um líder declarado morto por minha própria vontade porque os rumores pediram essa decisão.
Puxei as rédeas e apeei com destreza. Revirei em meus bolsos e tirei o pequeno quadrado cristalizado. Um torrão de açúcar é sempre um bom suborno para o silêncio. Esperei com paciência o torrão doce ser devorado pelo meu amigo de quatro patas. Talvez o único em que verdadeiramente posso confiar nesse lugar.
— Muito bem amigo. — Bati em seu pescoço com carinho. — Agora suma daqui. Não fique longe, não quero voltar para casa andando, pois nós dois sabemos que seria somente isso que eu poderia fazer aqui sem estragar tudo, então, se isso acontecer, você fica sem sobremesa.
O cavalo soltou um barulho, quase um relincho.
—Vá rapaz, e tenho dito! Me deixe para caminhar e fica sem seus torrões.
Dei um tapa em seu traseiro e ele saiu trotando. Coloquei a capa negra conseguida com atuações de crueldade pública. Algumas mulheres da casa de diversão tiveram que sentir o peso da minha mão para que os homens daquela confraria acreditassem que eu era um verdadeiro burguês. Um verdadeiro e maldito traidor com posses e riquezas tão grandes que vazavam pelas minhas orelhas.
O pior que isso não era mentira, eu tinha sim muita riqueza, mais do que qualquer um daqueles homens ignorantes pudessem imaginar. A diferença entre eles e eu, é que eu não precisava delas para nada além de usar agora para provar que eu tinha meios para ajudá-los em suas fomentações.
Até agora não entendo o fascínio que o dourado exerce sobre os homens, a necessidade absurda que eles têm de acumular sem ao menos ter tempo de vida o suficiente para usar sua riqueza.
Mas me está sendo útil agora essa ganância desmedida. Apesar de ter sido simples aproveitar uma ideia já usada para esse fim, não foi nada fácil consegui obter a atenção deles, até mesmo algumas brigas com simpatizantes no bairro dos forasteiros tinha ajudado nessa admissão.
Mas a capa negra chegou de verdade quando briguei com Laican em praça pública não tinha nem quinze dias. Ele tinha aparecido para obter informações sobre a sua protegida no castelo e a discussão ocorreu logo na entrada do reino. O maldito não me poupou, pois era o esperado, mas ia ter troco eu ainda ia cobrar por ele ter me deixado três dias de molho com a surra que me deu. Agora eu tinha motivos para odiar tanto o rei quanto as raças sobrenaturais e era essa a ideia.
Por isso fui convidado para entrar naquela organização secreta e recente. Meu plano era apenas sumir no mundo quando senti o mesmo aroma, quando me assustei com o sentimento de traição ao perceber que não podia estar sentindo isso, por isso pedi a ele que me declarasse morto, por isso fechei a mente, mas agora...
Minha fidelidade ao meu povo e ao meu sangue me fez retornar... Essa é a vida de um guerreiro, sacrificar os interesses pelo bem dos seus.
Andei pela rua deserta, as portas fechadas apenas com as placas deixavam o nome do lugar sem sentido. Um mercado colorido sem cor, porém cheio de tramas.
No meio da rua, entre barracas de tecidos e de pães caseiros estava uma porta neutra, vista de dia iria parecer apenas a porta de um depósito ou mesmo uma entrada inútil aos comerciantes. Mas era naquela porta com a tinta azul descascando que eu esperei por dois meses para bater. A que constantemente mais homens batiam.
O rei estava colecionando inimigos e agora eu fazia parte de sua coleção, só que não estou aqui por ele já que ele não significa nada para mim, porém não há ninguém melhor para esse papel, ninguém em que ele poderia confiar mais essa incumbência e que pudesse ser tão invisível quanto eu, dada as circunstâncias...
Prometi fazer isso para averiguar se nessa confraria tem infiltrados que periga a vida dela, afinal, ela pertence a nós, e é ela que, mesmo inocente disso, segura a mão do meu líder e irmão, por ela que ele não faz a caçada sem poupar vidas até encontrar o perigo que sabemos existir, mas não sabemos onde está. Por isso e para garantir a integridade dela, estou aqui confabulando com o inimigo.
Duas vezes... Uma vez... Duas vezes... Será que acertei?
A porta se abriu e respirei fundo. Tinha acertado a sequência de batidas. Dei um passo e assim que passei pela marquise eu estava ciente de que agora, sou oficialmente inimigo do rei.
Como eu disse, aqui estou sendo mais generosa com caps, porque é o livro no qual estou trabalhando no momento, por isso tenho mais caps revisados do que as outras histórias em andamento :)
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Tratado dos Párias- O rei rebelde. ( Degustação)
FantasíaTiago sempre abominou o tratamento as mulheres no reinado de seu pai. Viu sua mãe virar escrava e suas irmãs serem usadas como objeto sexual. Uma se quebrou por conta dos maus tratos e outra ficou com marcas profundas dos anos de chicote. Tudo isso...