Nada como esperado

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Tiago

A carruagem parou e pulei ansioso para bater naquela porta. Apesar de viver as turras com Amélia, eu me sentia solitário quando não a via, por isso estava torcendo para que André estivesse em casa para poder ficar o maior tempo possível conversando com ele e apreciando a presença dela, mesmo que de longe. Se ele não estivesse então eu teria que inventar qualquer coisa na hora, talvez perguntar sobre a escola como estava indo tudo. Sim isso seria um bom começo de conversa.

Dane-se o depois, o que mandava é o começo de uma conversa, na hora arrumaria outro assunto e quem sabe dessa vez as coisas pudessem fluir, quem sabe eu conseguisse acertar nas palavras e não atiçasse uma discussão sem sentido com Amélia, porque ultimamente era sempre isso o que acontecia.

Mesmo eu tentando me controlar, eu acabava fazendo algo que a irritava e a briga começava até ela subir para o quarto e bater a porta me deixando com cara de idiota olhando para André que sempre me lançava um olhar como se realmente eu fosse um completo idiota, e isso me deixava mais confuso.

Nunca entendo o que fiz de errado, mas sempre faço algo errado, incrível como não acerto uma quando se trata dela...

O portão da casa estava aberto, não conseguia entender ainda porque André insistia em morar na vila dos Forasteiros, tanta casa à venda ou disponível para locação na vila da casta nobre e ele não havia aceitado nenhuma.

O conhecendo tão bem eu poderia supor que ele estava sempre pronto para tirar Amélia dali caso fosse necessário, ele não se sentia seguro no reino humano e eu não podia culpá-lo por isso. A hostilidade no olhar dos mais abastados em cima de André me deixava irritado, porém ele não demonstrava nenhum receio ao enfrentar cada olhar de ódio quando aconteciam as reuniões do conselho.

Sua preocupação era com Amélia e eu partilhava desse mesmo receio, meus inimigos não podiam saber de meus sentimentos por ela, senão ela seria um alvo para me atingir. Ela estava se tornando a minha fraqueza, e isso estava crescendo exponencialmente cada dia mais.

Antes que eu chegasse à porta um rapazote chamado Tobias correu ao meu encontro com os olhos assustados. Senti meu coração acelerar com o pressentimento de que algo estava errado. O garoto começou a falar aos tropeções.

— Senhor... A senhorita Amélia.

Só de ouvir o tom afobado na voz e o nome dela saindo de maneira tão aflita o medo me tomou.

— Fale rapaz! O que tem ela?

Ele respirou rápido para recuperar o fôlego. — Ela esperou o senhor André sair dizendo que iria ao reino sombrio porque essa semana é a preparação do príncipe para o sono. Então ela disse que iria amanhã porque hoje tinha umas coisas sobre a escola para resolver. Só que quando ele saiu, ela prometeu se comportar...

Paciência nunca foi meu forte. — Pule o excesso de detalhes e vá direto ao ponto. Diga-me o que ela fez.

Ele assentiu, respirou fundo e falou rápido. — Ela vestiu calças rasgadas e uma camisa pior ainda, saiu daqui tão suja que nem consegui a reconhecer, só soube que era ela quando ela me pediu para chamar um carro.

— Mas que diabos! Onde acha que ela pode ter ido? E como ela encontrou roupas assim?

— Ela tinha comprado ontem de um andarilho. Quando ele passou por aqui ela o parou e deu uma moeda de ouro pelas roupas dele, ainda lhe deu algumas roupas do senhor André porque segundo ela, ele tinha que lhe entregar as peças naquela mesma hora.

O menino parou um pouco de falar e ficou tentando lembrar, o apressei já pronto para explodir com alguém.

— Continue!

Ele deu um pulo com o rompante e assentiu voltando a falar rapidamente. — Aí hoje ela passou toda a manhã ansiosa e assim que o senhor André sumiu pela avenida ela se trocou rapidamente tomou um carro e saiu de seguida.

Passei as mãos pelos cabelos olhando para a estrada na vã tentativa de ver Amélia andando por ali, retornando de seu passeio misterioso, como se isso fosse possível... O que essa maluca estava aprontando?

Só havia um lugar onde ela poderia ir vestida assim, balancei a cabeça desacreditando em minha própria ideia. Ela não faria isso, não ousaria... Ousaria? Olhei para o menino esperançoso de que ele pudesse saber algo mais.

— Acha que ela foi a vila dos Procriadores?

O menino ficou ligeiramente sem graça e olhou para os próprios pés. Não era hora para ser gentil, peguei sua camisa e o puxei para mim.

— Se sabe de mais alguma coisa rapazinho melhor me contar agora. Não vai gostar do que farei com você se eu descobrir sozinho e acabar a encontrando em perigo. Tenho meios para encontrá-la, mas preciso ser rápido. Fale.

— Ela estava curiosa com uma coisa que eu não entendi e também estava procurando uma moça chamada Jaci que está grávida e tinha pedido ajuda a ela há alguns dias atrás, então ela ia aproveitar essa procura do que ela estava curiosa e ia ver também se encontrava a moça, só que essa moça foi...

O menino parou de falar, seus olhos estavam confusos como se lutasse com ele mesmo, com certeza estava encobrindo alguém. Fiquei ainda mais preocupado.

— Foi o que? Fale! Morta?

— Não senhor, ela foi para o novo vilarejo dos libertos.

Soltei o garoto. — Que merda de lugar é esse?

Agora o menino engoliu em seco. — Onde era a prisão dos leviatãs, senhor. O comentário é que nem um cavalo pode entrar lá senão vira alimento.

— Como assim? Me fale tudo o que sabe.

Só de imaginar aquela loira tão miúda e completamente inconsciente dos inimigos prontos para me atingir, entrar sozinha em lugar desses, me deixou em desespero. Ela chamaria atenção e correria perigo, mas que inferno! Eu já tinha avisado sobre isso, será que falei com as paredes? Sem imaginar o que se passava dentro de mim cada informação nova, o menino continuou falando agora parecendo uma matraca.

— Porque eles roubariam o cavalo para comer senhor, mesmo que o dono do cavalo seja forte, a fome lá é tudo o que se vê e por isso eles não temem ninguém e roubam tudo.

Que droga! Amélia ia se enfiar em um lugar desses por causa de uma moça desconhecida e de uma curiosidade qualquer?

Nem mais prestei atenção ao menino, voltei rapidamente ao coche e dei a ordem ao cocheiro. — Me leve à vila nova, rápido!

Sem perguntar nada o cocheiro incitou os cavalos e o carro iniciou movimento.

Agradeci a minha pressa de chegar logo a casa de André, por conta disso eu tinha pedido um carro com quatro cavalos e agora eu poderia chegar mais rápido a essa lugar que eu sequer tinha ciência que existia. E Amélia estava lá! Como posso com essa mulher voluntariosa?

— Mais rápido!

O cocheiro incitou os cavalos com um sonoro grito e afundei no banco me sentindo impotente. 

Tratado dos Párias- O rei rebelde. ( Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora