Menina Esperta

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O carro parou e o cocheiro abriu a portinhola. — Majestade.

Olhei ansioso para os lados ainda tentando assimilar qual coisa urgente eu teria que fazer primeiro. — Não posso sair, preciso que me faça uma coisa antes.

Ele me fitou sem entender nada, e sinceramente eu não estava com paciência ou humor para explicar qualquer coisa, peguei algumas moedas. — Tome, me compre roupas velhas. — Olhei para ele e falei de modo severo. — Velhas! Não me venha com boas roupas e não volte aqui sem elas.

Ele ficou visivelmente nervoso olhando para as moedas e para a rua sem saber como reagir, ou mesmo agir. — Mas majestade, como eu irei comprar isso?

Me senti miserável por não ter pensando em trazer o garoto Tobias comigo, com certeza ele me seria mais útil que esse medroso. Eu tinha que admitir que meu mau humor estava aflorado por conta da preocupação e eu sabia disso, por isso respirei fundo e tentei buscar paciência.

— Ande por aí e me traga a primeira criança que encontrar na rua. — Estendi a mão. — E me devolva essas malditas moedas.

Ele me entregou com um sorriso amarelo o punhado de moedas e fechou a portinhola. Soquei minha perna como um meio de punição pela raiva de mim mesmo e esse meu jeito explosivo que afastava as pessoas. O coitado não tinha culpa do meu aborrecimento, mas quem pode culpar um homem preocupado e irado de preocupação?

Aquela loira... O que ela tinha na cabeça? Tantos lugares perigosos e escolhe justamente aquele mais distante? Ela estava fazendo de propósito só para me irritar, pois eu tinha avisado que era perigoso no bairro da Procriação e agora ela escolhe um idêntico e muito mais longe?

A portinhola abriu e o cocheiro me mostrou uma garotinha que olhava para mim curiosa pela porta. Pelo porte mirrado não parecia ter nem nove anos.

Olhos espertos e castanhos me fitaram. — O que precisa, senhor?

— Preciso de roupas muito velhas e informações depois disso.

— Quanto vai pagar?

— Uma moeda de ouro pelas roupas se elas forem mesmo bem velhas, e outra moeda de ouro pelas informações se elas me forem úteis.

Ela coçou o queixo me olhando com sagacidade. — Então ainda irá faltar uma moeda de prata.

Por mais aborrecido que eu estivesse naquele momento, senti vontade de rir com a pequena negociante tentando me arrancar o couro, ela via em mim lucro certo e não tinha receio em seus olhos, gostei da menina.

— Muito bem dona espertinha, e essa moeda de prata seria pagamento pelo que mesmo?

Ela levantou os ombros como se fosse obvio. — Pelo meu silêncio.

Apertei os lábios para evitar uma risada que se formava.

— Muito justo, então façamos melhor que isso. Será uma moeda de ouro pela sua lealdade. O que me diz?

Ela esticou a mãozinha para mim. — Feito!

Apertei aquela minúscula mão sentindo até a tensão passar um pouco, ela falou sem pestanejar.

— Me entregue uma moeda agora que lhe trarei as piores roupas que eu encontrar e com algum bônus para um bom cliente.

Dessa vez eu ri, não resisti aos encantos da pequena malandra, lhe entreguei a moeda e pisquei. — Me surpreenda.

Ela assentiu com energia e saiu correndo. O cocheiro fechou a porta e continuei rindo com a situação. Criança esperta para fazer negócio.

Enquanto esperava minha encomenda bati o dedo indicador nervosamente no joelho, sem conseguir parar quieto, puxei a cortina só um pouco e sondei a rua.

Tratado dos Párias- O rei rebelde. ( Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora