Um encontro nada amistoso

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Por mais receio que seu sentisse de andar sozinha, agora que não tinha Daniel para me guiar, eu tomei o carro e pedi para que me levasse a vila Nova. Nem sabia que era chamado assim, mas um dos soldados que tinha visto nós duas conversando me contou que tinha visto Jaci seguir rumo a essa vila.

Demorou um pouco e quanto mais eu me distanciava do bairro dos Forasteiros, mais curiosa sobre essa nova vila eu ficava, afinal, ela tinha o mesmo nome do bairro dos Procriadores, só era chamado de bairro novo para diferenciar do antigo.

Pensei que encontraria a mesma sujeira, a mesma promiscuidade, mas ao contrário do que pensei, as casas novas e o pouco movimento nas vielas dava a sensação que o lugar era abandonado. No entanto, para fazer contraste com essa falta de movimentação entre as casas, a estrada na qual eu seguia começava a ficar movimentada.

Uma infinidade de crianças circulava por todo lugar, umas carregando pacotes outras bilhetes, senhores magros e sujos conversavam sentados no chão sem se importar com o sol quente lhes cozinhando o cérebro.

Apesar das casas mais novas, o povo era mais simples e mais tranquilo, pelo menos não vi gritaria e nem discussão nas ruas. Ainda assim vi um esgoto em céu aberto e ainda um monte de lixo em uma parte distante das casas já prontas e dos prédios ainda em construção mais ao longe.

Peguei a cesta e desci com a ajuda do cocheiro. Tinha colocado um chapéu para me proteger do sol e segui para a estalagem, pois o soldado havia me dito que para conseguir informação, ali era o melhor lugar para perguntar.

Não demorei encontrar, era o único estabelecimento que tinha espaço na frente com algumas mesas dispostas. Entrei e fiquei aliviada quando vi que tinha acertado. Encontrei os conhecidos olhos azuis escuros me observando de cenho franzido e fui pega de surpresa.

— O que faz aqui, pai?

Os olhos dele foram diretos para a cesta que eu carregava.

— Eu é que pergunto, o que faz aqui menina? E porque está carregando esse chamariz para ataques?

Sentei na cadeira na mesma mesa onde ele estava, retirei calmamente o chapéu que me protegia do sol, estava tentando ganhar tempo, afinal essa era a primeira vez que eu saía para tão longe de casa, mesmo tendo os soldados lá fora me escoltando como sempre, ainda assim eu sabia que não devia ter arriscado tanto. Analisei o lugar varrendo tudo com olhos atentos, mesmo tão simples, não era um local que aquela moça pudesse pagar.

— Fiquei sabendo que aqui estava a garota que estou procurando, me disseram os guardas que viram uma moça da maneira que descrevi seguindo em direção a esse bairro e como essa é a única estalagem, imaginei que a encontraria por aqui. — Apontei com o queixo para a cesta que meu pai não parava de olhar. — Trouxe para ela, pois está grávida. Havia lhe dito que viesse me procurar, mas ela não apareceu e isso já faz quatro dias.

Ele assentiu e cruzou os braços esperando eu continuar, mas não falei mais nada, pois era justamente essa a minha história, mas ele, no entanto, parecia estar a todo custo evitando me dizer por que estava ali. Por fim ele olhou ansioso para a porta e falou preocupado.

— Não deveria ter vindo aqui.

— Prometi ajudar a moça.

— Mas se ela não voltou como você pediu, é porque não queria ser ajudada.

Ele até podia ter razão, mas devia estar no sangue a teimosia, afinal, ele também vivia tentando ajudar o filho de Uzias. Acabei sorrindo e pisquei de modo inocente.

— Faz dias que vejo você vindo nessa direção, sempre sem a farda, você mesmo me contou de sua luta para tirar desse bairro o filho de Uzias e pelos dias corridos e estando você aqui, imagino que não está sendo muito fácil para convencê-lo a sair daqui. Então porque insiste? Creio que é o mesmo dilema que o meu, não é?

Tratado dos Párias- O rei rebelde. ( Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora