Capítulo 1

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Abri a portinhola do cercadinho, vasculhando minha mochila em busca do chaveiro. Apenas quando enfiei a chave na fechadura, meus sentidos foram despertados pelo delicioso cheiro de lasanha. A essa altura o sorriso brotando no meu rosto era inevitável. Minha avó era a responsável pela melhor lasanha do mundo, e tinha um tempo relativo que não era agraciada por aquele queijo derretido misturado à carne moída, massa e molho branco com a leve pitada de orégano derretendo em minha boca.

Andei em direção à cozinha — no momento, o único cômodo organizado por completo —, percebendo que se encontrava vazio.

— Vó? — chamei sem obter resposta, joguei a mochila sobre a mesa e dei uma rápida olhada na lasanha borbulhando ainda dentro do forno. – Vó? – dessa vez chamei mais alto.

— Quarto! — Direcionei-me ao cômodo, retirando meu tênis all star e chutando-o para um canto qualquer assim, para logo em seguida pular sobre sua cama, sem me importar se havia ou não roupas a serem guardadas sob mim. — Lara! Não vê que estou tentando arrumar essa bagunça? Sai daí, menina!

Senti uma roupa batendo em minhas costas como um chicote. A primeira reação foi rir. A segunda apenas fazer um montinho das roupas e empurrá-lo para a ponta da cama, antes de me esparramar mais uma vez de bruços.

— Agora está tudo perfeito.

—Você não tem jeito. — Não a olhava, mas apostaria toda a minha coleção de DVDs que a frase foi dita com um revirar de olhos. — Mas diga... Como foi o primeiro dia? — Agora podia sentir um tom de ansiedade em sua voz.

— Ah você sabe... Normal.

— Não, eu não sei. — Bufou. — Caso não tenha reparado ainda não virei o Gasparzinho para acompanhá-la para cima e para baixo a fim de ficar informada.

— Percebi. Mas, de verdade, não foi nada grandioso. Apenas assisti às aulas. Algumas parecem ser bem legais, porém ainda é muito cedo pro veredicto final.

— Hum... Ah, antes que eu me esqueça.— Se virou para a cômoda, que também estava com várias peças de roupas amontoadas, e pegou uma pequena caixa de madeira dentro da gaveta. — Encontrei isso hoje. Há muito tempo que não via, nem mesmo me lembro de ter colocado junto à mudança.

— O que é isso? — questionei, enrugando a testa. Não me parecia nada familiar, logo não entendia o porquê dela me mostrar.

— É tipo uma caixinha de recordações. — Deu um sorriso nostálgico. — Tem o colar que usei no meu casamento, a meia que sua mãe e Roberta usaram quando saí com elas da maternidade, o ingresso da primeira vez que seu avô me levou ao cinema. Enfim... Várias coisas que rementem a momentos marcantes. Tinha muito tempo mesmo que não abria isso. Anos. Então hoje vi e encontrei isso. — Ela levantou a tampa e tirou um papel amarelado. — É seu.

Peguei de sua mão e, assim que desdobrei-o, uma risada escapou de meus lábios ao notar a letra garranchosa de quem havia acabado de aprender a escrever. Lembrava muito vagamente de ter escrito aquilo. Na época eu carregava o papel para cima e para baixo, sempre à espera surgimento de algo a ser realizado. A ideia era listar dez coisas que deveria fazer no decorrer da vida, porém antes que pudesse enumerar a décima coisa o papel se perdeu. Não fazia a menor ideia de como tinha ido parar com minha avó.

— Teletubbies! Sério isso? — Gargalhei. — E eu jurava que com essa idade sabia que tudo o que passava na televisão era invenção.

— Sinceramente, não sei qual é o pior. Isso ou você querendo usar seu primo de três anos para alimentar seus vícios.

— Eu era só uma criança viciada em açúcar com uma avó que fazia os melhores bolos. O que você esperava? — Dei de ombros. — Mas não me lembro de escrever isso. — Franzi o cenho e voltei a mirar o papel.

Apenas Respire [FINALIZADA]Onde histórias criam vida. Descubra agora