Capítulo 14

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Não era uma pessoa que já experimentou muitos prazeres na vida, mas duvidava que houvesse algo melhor do que ser atingido pela segunda-feira sem que ela a afetasse. 

Talvez essa junção de palavras não fosse coerente, afinal, na prática é impossível ser atingindo sem ser afetado. Porém, essa era a beleza da teoria, do campo metafórico. Nada precisava fazer real sentido. E nenhuma outra combinação exemplificaria a minha atual relação com as segundas-feiras. Porque no final era isso. A segunda me atingia porque, é óbvio, não há como parar o tempo, mas já não me afetava. Não me sentia frustrada, não me sentia nervosa, não me sentia pelando em febre por saber que os cômodos segundos do final de semana haviam chegado ao fim.

Poderia até me atrever a dizer que talvez sentisse uma ponta de felicidade com sua chegada. E poderia não sentir quando estava tranquilamente acompanhada sem que meu sistema simpático se ativasse?

A ausência de sensações esmagadoras e observações constantes impregnadas de autocrítica era um alívio. Proporcionava-me uma leveza que me fazia ansiar por abrir o peito procurando a origem dessa fonte, com o único intuito de poder fabricá-la em infinitas quantidades. Pequenas doses de confiança todo dia.

Pela primeira vez, estava verdadeiramente aproveitando o dia em Andarilho. A cidade amanheceu fria e nublada naquele dia, mas minha alma estava ensolarada.

Dias de confiança.

Eram raros, mas estavam se tornando cada vez mais frequentes e intensos no último ano. E daquela vez, faria o possível para que a sensação postergasse sua partida. Talvez não fosse uma tarefa tão difícil levando em consideração que a cada dia, meu humor se movia um pouco mais para o lado colorido do gradiente.

A prova disso era que mesmo quando já provara este gosto no passado, não havia nada que me ligasse ao mundo externo ou me tirasse do ambiente familiar. E agora ouvia a história das duas pessoas sentadas a minha frente, com a naturalidade que por anos desejara.

— Você simplesmente perdeu a melhor festa do ano! — Lívia declarou pela quinta vez após contar cada detalhe da chopada. 

— Não ouça essas incoerências. — Vitor retrucou com toda serenidade que sempre trajava. — Foi a pior festa do ano. Por Deus, faltou luz e não tinha música! 

— Deixa de ser do contra. Até o Alê concordou que foi legal. E você sabe bem que ele tem a capacidade de passar cinco horas balançando aquela raba e ainda dizer que não se divertiu. 

— Isso porque não existe alguém que goste mais de contato humano no mundo. E aquilo lá tava um antro de carência. 

— Ou seja, foi a melhor festa! Não sei por que insiste em negar. 

— Talvez porque um bando de gente desconhecida se abraçando e gritando aos quatro ventos os versos de "Borboleta" não seja o meu passatempo preferido. 

— Não cantamos apenas sertanejo. — Lívia bufou. 

— Kelly Key tampouco está nas mais tocadas da minha playlist. — Revidou. 

— E se estava tão chato assim por que não foi embora? — Lívia resmungou com as bochechas já vermelhas. 

— Primeiro que já estava lá, segundo que a única coisa que me tira de uma festa é cerveja quente. E nisso eles não pecaram. 

— Você precisa se entregar mais à nostalgia. — Disse apontando o dedo em sua direção e então se virou para mim. — E você não escapa da próxima. Dessa vez eu deixei passar porque não quero ser culpada por uma recuperação. Mas esses olhinhos, não me enganam. Você gostaria de estar lá. 

Apenas Respire [FINALIZADA]Onde histórias criam vida. Descubra agora