Capítulo 26

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— Vamos! — Gabriel me convidou, saindo da água e passando as mãos pelos cabelos molhados. — A água está uma delícia.

O vento soprou no meu rosto e eu afastei uma mecha de cabelo que insistia em tapar minha visão. Enfiei meus pés na areia, apreciando a sensação estranha que o contato causava.

— Naahh! — Franzi o rosto. — Tô bem aqui.

Era surpreendente para mim mesma que estivesse sendo tão sincera. Eu odiava praias e o seu pacote de formigueiro humano, mas aquela tinha me surpreendido por estar tão vazia e calma. Ali, observando aquelas almas juvenis, rodeada por nada além da natureza, era quase como se todos os problemas se reduzissem a nada, quase como se estivesse em paz. Quase.

Após acordar, alguém tinha sugerido que viéssemos. Após duas semanas frias e chuvosas, o sol enfim retornara para iluminar a cidade. Não poderia afirmar com propriedade quem fora o autor da ideia porque a princípio não dei muita atenção. Se fosse bem sincera, confessaria que em dado momento passei a desejar que todos fossem embora. Até perceber que meu humor não mudaria com esta simples realização. Não quando a raiz do meu desconforto crescera debaixo de casa.

E considerando que eu não estava pronta para conversar, eu precisava sair. Era um tiro no escuro. Eu estava cada vez mais frágil, cada vez mais próxima da inevitável queda. Eu nunca sabia quando uma simples saída se tornaria ou não o prelúdio do caos. Para o meu alívio, naquela hora pude contar mais benefícios do que prejuízos.

— Não vai querer que eu te carregue, né? — provocou.

— Você se cansaria antes de chegar na margem.

— Ei! Mais credibilidade, por favor. Você não está vendo esses músculos? — Tensionou o braço, mas eu não notei nada de diferente. Ele continuava o mesmo adolescente mirrado de quatro meses atrás. — Agora eu tô dando duro na academia.

— É... — Entortei a boca. — Acho que é preciso mais do que duas semanas pra ter algum efeito.

— Argh, você tá parecendo a mamãe. Só falta dizer que não vou aguentar nem dois meses.

— Bom... Exercício físico realmente nunca foi sua praia — pontuei. — Lembra quando resolveu lutar taekwondo?

Gabriel sempre foi um rato de biblioteca. E embora não se encaixasse no estereótipo de nerd tímido, ele não se saía muito bem quando se tratava de largar o sedentarismo. Vez ou outra entrava num delírio de alcançar uma rotina um pouco mais fitness, o que nunca dava certo. Sua última tentativa resultou em nada além de um braço quebrado e alguns hematomas.

— Cê nunca vai esquecer isso, né? — Balancei a cabeça e ele sentou ao meu lado, abraçando as pernas. — Tudo bem. Posso lidar com isso, mas fique sabendo que vai ter volta.

Ri e comecei a desenhar uma flor na areia.

— Você sabia? — perguntei após ficarmos um tempo em silêncio.

— O que? — Olhou-me confuso.

— Você sabe. — Inclinei a cabeça.

— Oh! Aquilo... — Fez uma pausa e quase pude enxergar balões de pensamento sobrevoando sua mente. — Bem que eu estava sentindo um clima estranho rondando a casa hoje. E nada tinha a ver com a língua afiada de Cecília.

— Então você sabia.

— Você conhece a mamãe. É difícil não saber de alguma coisa quando ela está envolvida. Acho que Cecília puxou isso dela. De um jeito um pouco mais distorcido e cruel, mas dela.

Apenas Respire [FINALIZADA]Onde histórias criam vida. Descubra agora