Parece que estou caindo em câmera lenta. A cada centímetro que eu fico mais perto da água, que agora parece calma, algumas situações da minha vida se passam pelos meus olhos.Me lembro de quando eu tinha uma pelúcia de um monstro, o qual eu brincava toda hora. Me lembro de quando eu caçava galinhas, e até porcos, junto com meu primo. Me lembro de quando eu quase me afoguei. Quando eu fiz minha bicicleta. Quando fui na chocofest. Quando eu fui pego roubando. Quando estraguei o natal. Quando eu surfava. Quando eu fui suspenso. Quando eu quase repeti de ano...
Quando eu descobri que viria para São Paulo. Aquela notícia que me deixou com um turbilhão de emoções. Quando meus amigos fizeram uma festa de despedida um dia antes de eu ir embora. Quando, no dia seguinte, os mais próximos foram no aeroporto me dar um abraço longo, lutando contra as lágrimas. Quando eu sai do avião e pisei no meu novo lar, enquanto sentia o vento bater no meu rosto. Quando eu cheguei na cidade. Quando eu me sentei no banco daquele parque.
Quando eu vi Zelune pela primeira vez.
E então, todas as lembranças que envolvem ele passam pelos meus olhos. As mensagens, a culpa, as verdades. De quando eu li sua mensagem de suicidio. De quando eu subi esse penhasco. De quando eu vi ele caindo. De quando eu pulei.
De repente, meu corpo se colide com a água turbulenta. Sinto as pedras cortarem meu corpo, e assim eu grito de baixo d'água. Vou para a superfície com dificuldade, sentindo o gosto de sangue em minha boca. Tento procurá-lo, mas não vejo ninguém.
- ZELUNE! V-VOCÊ CONSEGUE ME OUVIR? - Eu grito, ofegante, sem saber o que fazer direito.
Escuto um gemido baixo. Começo a nadar pelas pedras, até que o vejo parcialmente desmaiado. Fico muito aliviado por encontrá-lo, mas mesmo assim eu fico horrorizado. Ele está todo ensanguentando, arrebentado. A única coisa que impede ele de afundar é uma pedra grande, que o mesmo está segurando com suas últimas forças.
Vou até Zelune, desesperado. Eu enrolo meu braço esquerdo nele. Estou quase me afogando, mas isso é irrelevante no momento. Ele me encara, com seus olhos cansados. Eu o encaro de volta, também exausto. É a primeira vez que o vejo sem boné. Infelizmente, esse é um momento horrível para tal coisa.
- AJUDA! ALGUÉM! - Grito incansavelmente. Não conseguiria segurar uma pedra e segurar Zelune ao mesmo tempo. Nem sei se conseguiria me manter acordado por mais tempo. Meu corpo todo está doendo. É uma dor agonizante.
Mas ninguém veio. Aos poucos, sinto minha consciência indo embora. Olho mais uma vez para Zelune. Bem, é isso. Nunca imaginei que pularia de um penhasco para salvar uma pessoa. Nunca imaginei que eu morreria em um rio turbulento, isolado das pessoas, tendo a esperança de me resgatarem.
Ouço gritos vindos de longe da água. Pode ser ajuda. Ou não. Eu não sei mais.
- ...estamos aqui... - Eu tento gritar, mas não consigo. Tudo está ficando embaçado. Tudo está ficando confuso. E então, meus dedos vão se deslizando para fora da pedra.
Tudo está ficando embaçado.
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- Acorda, por favor! - Ouço uma voz distante.
- Olha! Ele está começando a se mexer. - Ouço outra voz, mas agora não tão distante. - Ah, que alivio!
- RONAAAAAAAALDO!
Abro os olhos rapidamente. Esse grito familiar foi o suficiente para me fazer acordar de vez.
- MEU FILHO! - Uma figura em minha frente começa a me abraçar com uma voz emotiva, e isso me faz ficar dolorido. Minha visão está voltando ao foco aos poucos.
- RONALDO! - Outra figura também me abraça. Sem entender nada, eu fico com os olhos semi cerrados, e então as figuras se tornam minha mãe e meu irmão mais velho.
- O-oi... - Eu digo com uma voz rouca, um pouco tonto. Eu encaro eles, e começo a observar ao meu redor. Olho para baixo. Estou com uma roupa diferente. Por baixo dela, percebo várias ataduras pelo meu corpo. - Onde estou?
- Em um hospital! - Minha mãe aperta minha mão, pois percebeu que eu fiquei desconfortável quando a mesma me abraçou. - Seu pai não conseguiu sair do trabalho, mas ele daqui a pouco chega!
Ah, um hospital... faz sentido. Urgh, minha mente está um turbilhão.
- Por que eu estou aqui? - Eu pergunto.
- Os seus amigos disseram que você pulou do penhasco daquele rio para ajudar outro amigo. - Meu irmão recruta. - Uau, foi um ato de coragem, hein.
- E DE PERIGO! - Minha mãe dá um gritinho. - Ah, Ronaldo. Não me assuste assim de novo! Você está bem?
- Acho que sim... - Eu faço uma expressão pensativa. Eu me lembro de quando uma certa pessoa se desiquilibrou e caiu. De quando eu pulei. De quando eu a vi. De quando eu a segurei. Me esforço, mas é inútil. Eu só me lembro até essa parte. Mas quem é essa pessoa? Quem é...? Qu...
- Eu estava comprando esse boné quando soube da notícia! - Meu irmão interrompe minha linha de pensamento e aponta para sua cabeça, onde ocupava um boné vermelho.
Boné... BONÉ! UM BONÉ PRETO!
- ZELUNE! - Eu grito ao me lembrar. - O meu... "amigo" está bem?
- Eu não sei. Espero que ele esteja bem também! - Minha mãe responde, ligeiramente assustada. Quando estava prestes a sair da cama, ela me advertiu. - Não se levante! Pelo menos por algumas horas! Não saia! Repouse! Eu e Bernardo vamos comprar alguma comida na cantina, já voltamos.
E assim, os dois se vão. Repouso minha cabeça no travesseiro e dou um suspiro, ainda não acreditando que eu realmente sobrevivi. Mas o que isso vai valer apena se Zelune não estiver bem?
- Ronaldo? - Ouço uma voz vinda da porta.
Vejo Wilson chegando até mim, preocupado. Dou um sorriso quando o vejo.
- Eu fiquei sabendo... Pensei que você fosse capaz de se jogar de um penhasco! - Ele diz apertando minha mão. - Você está bem?
- Sim, claro... Obrigado por me visitar. - Eu digo, mesmo estando morrendo de preocupação. - Você sabe se o Zelune está bem?
- Toc, toc.
No momento em que perguntei, vejo Rafael entrar no quarto ajudando uma certa pessoa a andar, cuidadosamente. Meus olhos se enchem de lágrimas.
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É, eu sei. Podem me bater por ter demorado tanto. Os meus maiores inimigos são a preguiça e a procrastinação.Não sei se a cena de ação foi boa, eu não estou acostumada a escrever coisas desse tipo. E, sim, eu prometo que eu vou postar o próximo capítulo rapidamente e ele vai ser mais longo. Bem, talvez. Eu já disse que os meus maiores inimigos são a preguiça e a procrastinação?
Espero que tenham gostado, me desculpem por qualquer coisa. Beijos de luz ~ Ah! Muito obrigada pelos quase 1k de visualizações! Amo vocês <3
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O Garoto do Boné (Rolune)
Hayran KurguRonaldo, um gaúcho de 16 anos, se muda para uma cidade de São Paulo, mas se sente inseguro quanto a isso. Abandonou amigos, parentes e ainda tem que entrar em um colégio novo. Porém, quando Ronaldo está em um parque, alguém prende sua atenção.