Capítulo 20

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Isabel acordou sentindo-se surpreendentemente bem. Há tempos não tinha uma noite de sono tão boa! Espreguiçando-se languidamente, ela cogitou ficar um pouco mais na cama - estava tão quentinha! - até que ouviu um barulho na cozinha que, não só a lembrou que não estava sozinha, como também o que ocorrera na noite anterior.

Sentindo seu bom-humor se dissipar, ela se refugiou debaixo das cobertas.

O que tinha acontecido com ela ontem à noite? Por que, diabos, tinha se permitido chorar agarrada ao peito do ex-marido?, questionou-se, começando a achar que a ideia de ficar com Lucas não era tão boa assim. Em apenas dois dias, ele tinha virado sua vida de cabeça para baixo, derrubado suas defesas e a feito admitir uma verdade que ela nunca tinha revelado a ninguém, lembrou amarga.

Será que conseguiria encará-lo todo dia e se lembrar do que tinha acontecido? De tudo que ela tinha perdido?

Não, era impossível! Tinha sido justamente por isso que eles tinham se divorciado, a convivência entre eles era insuportável! O acidente podia ter apagado a memória de Lucas, mas as coisas não haviam mudado para ela.

Não, ela não podia ir com ele, decidiu, pulando da cama e marchando para cozinha para confrontá-lo.

Assim que ela chegou na cozinha, Pipoca a saudou alegremente e ela o afagou, distraída. Lucas estava arrumando a mesa para o café da manhã e ela desejou que ele não estivesse sendo tão gentil. Isso só tornava as coisas mais difíceis.

- Bom dia! – ele a cumprimentou.

- Eu mudei de ideia – ela falou de uma vez, sem ânimo para enrolação. – Não vou mais com você.

Ele terminou de colocar os pratos na mesa e perguntou, calmamente:

- Por quê?

- Eu agradeço pela sua disposição, mas isso não vai dar certo. Achei que conseguisse ficar com você, mas não dá – concluiu, lembrando-se da noite anterior e sabendo que ele fazia o mesmo.

- Tudo bem – ele falou e ela respirou, aliviada. – Se você não quer ir para minha casa, nós ficamos aqui.

- O quê?! – Tinha cantado vitória cedo demais. – Você não pode ficar aqui! Eu acabei de dizer que não consigo ficar com você, não escutou?

- E o que você vai fazer então? Vai para casa da sua irmã?

Ela não tinha pensado nisso. Na verdade, não tinha pensado em nada, apenas em fazê-lo ir embora.

Sentindo que essa discussão se prolongaria bem mais do que o desejado, ela abriu a porta do armário à procura de bebida. Não tinha esquecido da promessa que fizera à irmã, mas não conseguiria confrontar Lucas sóbria. Só desta vez, prometeu a si mesma. Começaria do zero amanhã.

- Joguei fora – ele falou, observando-a encarar o armário vazio.

Engolindo um palavrão, ela respirou fundo e virou-se para ele.

- Você precisa ir embora.

- Você vai ligar para Carolina depois que eu for? Posso deixar você na casa dela, se quiser.

- Eu não vou para a casa da minha irmã – ela sibilou.

- Então você quer que eu vá embora para voltar a beber? – ele perguntou, a voz levemente acusadora.

- Também não. Eu só quero ficar sozinha. – Por que isso era tão difícil de conseguir?

- Você não precisa ficar sozinha. Tem várias pessoas querendo lhe ajudar.

- Eu não preciso de ajuda – ela falou, irritada.

- Precisa sim – ele falou, firme. – São nove da manhã, você nem tomou café da manhã ainda e já ia beber!

- Eu só precisava de ajuda para enfrentar você – falou, como se aquilo fosse desculpa suficiente.

- Você não precisa me enfrentar, Isabel. Eu não estou contra você. Já disse que só quero ajudá-la.

- Então, por favor, vá embora – ela suplicou.

- Não posso deixá-la assim.

Ela não entendia a relutância dele. Da última vez, ele não hesitou em deixá-la. Na verdade, a tinha expulsado de casa, dizendo que não aguentava mais olhar no rosto dela, isso depois de jogar-lhe na cara a culpa pela morte do filho, lembrou-se, sentindo a boca amargar e as lágrimas molharem-lhe  os olhos.

- Você perdeu sua memória, Lucas, mas eu não esqueci de nada. – E nem queria. Ela podia ainda não estar pronta para lembrar do filho sem sangrar por dentro, mas nada no mundo a faria se esquecer do seu pequeno.

Ele se aproximou dela e tocou-lhe o rosto, secando as lágrimas que ela nem percebera que tinham escapado.

- Então vamos fazer o seguinte: você vai comigo e tenta, se não der certo, você volta para cá. – Ela ia interrompê-lo, dizendo que já sabia que não ia dar certo, mas ele colocou um dedo em seus lábios, silenciando-a. – Vamos viver um dia de cada vez. O que me diz?

Ela fitou-lhe os olhos e viu tanta ternura e um algo mais que a fez se lembrar do homem pelo qual tinha se apaixonado e com o qual se casara. Seu coração machucado sentiu-se aquecido pela primeira vez em muito tempo e ela se viu dizendo, com a voz hesitante:

- Tudo bem.

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