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Quase fico sufocada no meio de tantas pessoas. Hoje o Central Park está, particularmente, lotado. O que deu nessas pessoas? Por que todo mundo resolveu vir aqui no horário de almoço?

Procuro, entre a multidão, cabeleiras loiras e curtas. Preciso encontrar um cara loiro e de olhos azuis, que diz ser meu amigo. Preciso saber o que ele tem a dizer.

Há tantas cabeças loiras...

-Cadê ele? -Pergunto, apenas para mim.

Chego ao centro do Central Park, onde várias famílias estão passeando.

-Pietro... -Murmuro chorosa. -Você sumiu de novo.

-Sofia. -Uma voz sussurra atrás de mim. Muito, muito perto.

Não sei o que a maioria das pessoas faria, mas só consegui pensar em me defender.

Me virei tão rápido que, se fosse visto em câmera lenta, ainda seria rápido o suficiente. Minha mão de fechou e eu apliquei toda a força no meu ombro. Com a força máxima atingi a mandíbula do cara, que caiu. Só depois que estava no chão percebi que não era qualquer um, mas o cara que se dizia ser meu Pietro.

-Ah, meu Deus! -Digo e coloco a mão na boca. -Meu Deus! Me desculpa. Eu não costumo ser violenta desse jeito.

Me aproximo dele, que parece estar com os olhos girando.

-Consegue me ver? -Pergunto.

-Ah... Duas Sofias. -Ele ri.

-Ok. -Ele não está bem. -Quantos dedos tenho aqui? -Mostro minha mão.

-Cinco. -Ele responde de imediato.

Olho minha mão.

-Mas eu só levantei dois. -Digo.

-Mas você me fez cair nessa brincadeira quando a gente era criança. Eu não caio mais. -Ele olha pra mim, realmente pra mim e sorri. -Eu ainda lembro, Sofia.

Ele ainda estava sentado em um banco de madeira, enquanto eu conseguia um pacote com gelo. Entrego para o "tal Pietro" e ele geme ao colocar no queixo.

-Desde quando você sabe dar socos? -Ele pergunta.

-Foi mal. -Digo. -Não foi intencional.

-Eu duvido. -Ele murmura.

-Ta doendo muito?

-Se com isso você quer dizer que ainda está me fazendo ficar tonto e ter vontade de chorar, é, tá doendo! -Ele sorri de canto, e, meio que sem intenção, me arranca um sorriso. Um sorriso verdadeiro.

-Desculpa mesmo. -Me sento ao seu lado.

Ficamos um bom tempo sem dizer nada, apenas olhando a paisagem. Não, eu não estava apreciando. Estava pensando. Pensando em como eu iria desenvolver uma conversa com ele de forma que natural. O que eu iria perguntar? O que afinal eu queria saber? Não. Melhor que isso. O que eu esperava com tudo isso. É uma loucura.

Pietro foi um fruto da minha imaginação infantil. Esse cara deve ser... Ahn... Sei lá o que ele deve ser!

-Sofia. -Ele me chama, libertando-me do meu devaneio.

Olho com o cenho franzido, mesmo assim ele ainda mantém um semblante passivo e estranhamente amigável. Como se realmente me conhecesse e fosse meu amigo.

-Olha, eu realmente não sei quem é você. -Deixo meus ombros caírem, mostrando  o meu cansaço. -Então será que, sei lá, você poderia me dizer seu nome de verdade e quem é você. E, principalmente, como sabe do Pietro.

O cara olha para mim, morde o lábio inferior e desvia os olhos, inalando o ar profundamente.

-Eu sei muitas coisas sobre o Pietro porque... -Ele solta o ar de uma vez. -Não adianta. Você não quer acreditar. Quando uma criança não acredita em nós, nós vamos desaparecendo.

-Eu não sou uma criança. E eu estou querendo apenas saber a verdade. -Explico. -Olha, eu não conto pra todo mundo sobre o Pietro. E, se você sabe, quero saber de tudo.

-Você não acredita. -Ele vira o rosto. -Por mais que eu diga que voltei, que sou eu, você está irredutível.

Isso era verdade. Nada me faria achar que outro poderia ser o Pietro. O Pietro era apenas fruto da minha imaginação infantil. Não poderia ser real. Não é?

Contudo, se eu quiser descobrir qualquer coisa desse cara, preciso abrir mais a mente e acreditar que pode ser possível.

-Olha, é complicado pra mim. Quer dizer, eu fui abandonada por... -Ele! -Você quando eu era muito nova. Isso me desestruturou. Eu não sou a mesma garotinha de dez anos que você deixou pra trás.

-Eu sei. -Ele diz cabisbaixo. -Notei isso quando te vi na cafeteria.

Ele dá uma risada seca e sem graça.

-Foi a pior coisa que eu fiz na minha vida.

-O quê? -Retruco.

-Ter deixado você e nem ao menos me explicar. -Ele me olha, e pela íris azul clara consigo identificar toda a sinceridade que ele me mostra. Sim. Ele falava a verdade.

-Então foi por isso que você voltou? Pra pedir desculpas? -Chuto.

-Na verdade eu não sei. -Ele fica meio confuso. -Eu só apareci. Precisava te encontrar, mas não entendi o porquê!

-O quê? Como assim? -Fico confusa. -Me explica direito essa história. Eu, realmente, quero entender.

-Bom, eu estava trabalhando. Londres.  Com o príncipe George.

-QUÊ? -Dou um gritinho. -Você ta me dizendo que era o amigo imaginário do príncipe George, filho do príncipe William?

-Esses mesmo. -Ele sorri. -Eu estava em missão. Se você quer saber, a vida é bem complicada pra alguém tão pequeno que já tem que carregar pesos de responsabilidade.

-É eu sei. -Murmuro.

-Eu estava em missão, mas, no dia anterior a minha vinda, recebi um aviso. Eu precisava ver alguém importante do meu passado.

-Você só tá dizendo isso pra me agradar. -Ergo uma sobrancelha.

-Juro que não. Eu esperei. Pensei que fosse a Penny, a garota australiana que eu cuidei antes de ser transferido para George. Mas aí eu acordei e já não era eu. Quer dizer, era eu, só que mais velho. Com um corpo maior e foi aí que eu entrei no café e depois você chegou e eu te reconheci. Eu vi que eu tinha voltado por você. Para te ajudar.

Fico muda por alguns instantes, querendo separar a verdade da fantasia. Essa história não tem pé nem cabeça. É tão absurdamente louca, que nem sei i que faço.

-Mas eu não preciso de ajuda. -Digo. -Quer dizer, a minha vida tá ótima. Porque eu iria precisar de ajuda?

Ele dá de ombros.

-Eu vou descobrir, Sofia.

Assinto. Olho o relógio e vejo que meu horário de almoço está acabando.

-Ah, foi bom o papo, mas eu tenho que voltar.

Me levanto e ele faz o mesmo.

Começo a caminhar e ele me segue.

-O que tá fazendo? -Paro abruptamente.

-Eu vou com você.

-O quê? Não! -Digo. -Eu vou pro trabalho.

-Eu vou com você.

-Não. Pietro, você não pode. -Falo.

-Não tenho para onde ir. Eu preciso ficar com você. Você vai precisar da minha ajuda.

O encaro, tentando ser intimidadora. Começo a andar e ele segue. Eu paro, ele faz o mesmo.

Maravilha. Parece que o dia vai ser longo.

Chamo o táxi e, mesmo assim, não me livro dele. Então decido só não me estressar.

O chato foi ele ficar sorrindo com cara de bunda para mim a viagem inteira!

Meu Melhor Amigo ImaginárioOnde histórias criam vida. Descubra agora