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Depois daquele evento, ora horroroso, ora revelador, voltamos para Wall Street. Ignorei o fato de Cameron ter aparecido e, pelo que parece, Pietro também havia esquecido ou não se deu conta do que tinha falado. Mas aquilo martelava na minha cabeça. Eu quero descobrir. E preciso arrumar uma maneira de descobrir.

Como é possível?

*

Cheguei no apartamento, exausta e acabei caindo no sofá.

-Quer comer alguma coisa? -Pietro pergunta, depositando sua pasta na mesa de centro.

-Hum... -Penso. -Você nunca me disse onde aprendeu a cozinhar. -Me sento de repente e o encaro.

-Ah... -Ele coloca um sorriso no rosto e se senta na poltrona. -Uma filha de chefes na Califórnia. Hannah. Era uma garotinha legal.

Não consigo evitar sentir um certo ciúmes dessa Hannah. Pelo amor de Deus! Uma menina, Sofia! Uma criança!

-Ela era legal? -Pergunto, me ajeitando no sofá. Eu não queria que ele saísse dali. Queria conhecer meu melhor amigo. Reconhecer, pelo menos. E, por tudo que era mais sagrado, precisava saber sobre essa Hannah!

-Era. -Ele diz com o tom de voz embargado. -Fui enviado pra lá, ela tinha só sete anos. Os pais a ignoravam, mas ela ainda os admirava muito...

A medida que ele conta, deixo o ciúmes de lado. A maneira que ele a descreve faz com que pareça que um pedaço do céu caiu na terra usando vestido rosa e laços de fita, em forma de "Hannah".

Hannah era divertida. Gostava de balé, música e nadar, principalmente. Os pais cozinhavam em um restaurante famoso, e ela dizia que queria também. Era apaixonada pelo garoto da sua sala, e, ao que ela contava, ele gostava dela. Adorava acampar na varanda da casa, fazia sanduíches e cupcakes como ninguém!

-Por quê a deixou? -Perguntei.

Ainda não entendi o motivo dele ter deixado todas as suas crianças. Se ele as amava tanto quanto falava, por que raios as deixava?

-Eu não a deixei. -Seu músculo do supercílio treme. Ele estava engasgando com as palavras.

Fico confusa.

-Não? -Indago.

Pietro respira fundo. Engole o seco e solta.

-Ela me deixou. -Ele fala.

-Mas... -Então paro e penso.

-É, Sofia. Não somos só nós que abandonamos. A vida é uma inconstante. Recheada de surpresas e às vezes é boa, mas às vezes é cruel.

Vejo seus olhos se encherem de água. O lábio treme. Fica difícil engolir a saliva.

-Ela morreu antes dos nove. -Ele diz, como se fosse doloroso cada sílaba. E talvez fosse mesmo. -Câncer. Os pais descobriram quando ela começou a desmaiar na escola. Tentaram a quimioterapia, mas era tarde. Leucemia aguda. Fase terminal.

Minha garganta se fecha.

-Eu... Eu... Sinto muito. -Falo. -Não pensei que vocês podiam ser abandonados. Não dessa forma.

-Pois é. -Ele seca o nariz. -Depois dela eu pensei em cada criança que não recebia atenção dos pais. Pensei em você. Em todos! Queria voltar...

-Mas não podia. -Concluo. -Porque outras com mais problemas precisavam de você.

-É. -Ele se permite sorrir, mas não dura mais que dois segundos.

Corro para abraça-lo. Pietro nunca chorou. Não quando eu era criança, pelo menos. Era eu quem chorava. Eu precisava dele e...

Ei!

Agora é ele que precisa de mim!

Pietro ergue a cabeça e me encara. Sorrio, e enxugo sua lágrima.

-Queria dizer que você fica feio quando chora, mas seria a maior mentira de todas! -Falo.

Ele ri, e passa o braço pela minha cintura, me puxando para mais perto. Respiro fundo com a ação, mas não recuo. O abraço e ficamos lá. Sentados na poltrona de couro marrom do meu pequeno apartamento . Ele soluça baixinho contra meu pescoço e, como instinto, passo a mão pelos seus cabelos.

Nunca fui das que confortam, ou que sabem como agir nessas horas, quer dizer, parece que agora sei.

*

Abro os olhos devagar olhando ao redor. Pisco umas duas vezes até notar onde eu estava. Meu lençol me cobria, enquanto eu estava encolhida na poltrona. Pietro já não estava mais lá. Olho ao redor e o ambiente parece extremamente silencioso. Nenhum sinal dele!

Vou até a cozinha, até o quarto e o restante dos cômodos, mas ele não estava lá. Abro a porta do apartamento, desesperada.

Mas logo paro ao notar o grande homem, de cabelos dourados, prestes a entrar.

-Oi. -Ele fala.

Não digo nada. Apenas pulo em seu pescoço e o abraço.

-Uou! -Ele diz, surpreso. -O que foi?

Medo. -Penso. -Estou com medo de te perder de novo.

-Nada. -Acabo por solta-lo e colocar um sorriso simples no rosto. -Foi aonde?

-Comprei uma pizza. Está com fome?

-Sim!

Pietro entra e preciso morder o lábio.

Como pude deixar isso acontecer? Me apegar tanto a alguém de novo? A alguém que já me deixou no passado e que pode me deixar de novo.

******************

Tem uma pessoa que está amando essa história? Então...

Oiii! -N.


Meu Melhor Amigo ImaginárioOnde histórias criam vida. Descubra agora