“O inverossímil em matéria de sentimentos é o sinal mais seguro da verdade.” - Liev Tolstói
Tudo bem que ninguém pode esperar que essa cidade seja uma espécie de Gothan City, com um monte de crimes e corrupção para se descobrir, mas também não pensei que ela seria tão perfeita (ou tão sem graça, já que, além de tudo, nada acontece por aqui). Caramba, já devo estar há umas duas horas grudada no notebook enquanto minha companheira de quarto - que pro meu consolo, é surpreendentemente legal - dorme na cama ao lado, na esperança de encontrar algo que valha uma boa matéria, mas parece que vai ser mais difícil do que eu imaginava.
Tento na política e o prefeito tem uma reputação intocada, tento em escolas e hospitais e nada, tudo anda como deve ser... Vai ser difícil conseguir algum furo revolucionário que compense a ameaça da minha querida chefe, que foi bastante categórica com seu: "Apareça com a matéria da sua vida ou, do contrário, nem precisa se dar ao trabalho de voltar, Samantha. E tente voltar com esse Rodrigo já laçado também. Não aguento mais esse seu romancezinho platônico". A última parte é preciso deixar claro que foi um tremendo exagero já que não tenho romance platônico nenhum com Rodrigo. Aliás, o último amor platônico que tive foi com uns treze anos. E foi pelo Jon Bon Jovi.
Mais alguns minutos digitando freneticamente sobre esse lugar nos sites de busca e, de repente, sou surpreendida por uma batida fraca na porta que corta meu raciocínio e me faz pensar em quem raios bate na porta de um quarto a essa hora da madrugada.
Depois de quase um malabarismo meio desajeitado para pôr o computador na cama e descer dela sem fazer barulho para não acordar Beth, ando na ponta dos pés e dou de cara com um Rodrigo meio transtornado demais pro meu gosto quando abro a porta.
- Rodrigo? Tá fazendo o que aqui numa hora dessas? - Sussurro com estranheza notando que até seu cabelo está meio desgrenhado de tanto que ele fica mexendo nele com nervosismo.
- Precisava falar com você.
- Às duas da manhã? - Pergunto depois de passar os olhos por um relógio de parede do quarto.
- É! - É rígido enquanto pega uma das minhas mãos, tentando me levar para fora do quarto. - Vem comigo.
Ainda tenho tempo de fechar a porta com certo cuidado e silêncio e quando me dou conta já estou sendo praticamente arrastada por ele pra fora da casa, rumo a varanda, onde sentamos em um dos bancos.
- Caramba... Vai tirar o pai da forca? - digo assim que consigo sentar e observá-lo com ainda mais atenção.
- Por que você não me disse que conhecia o fotógrafo que tá aqui? Aliás, por que não me disse que é justo aquele com quem você vive em pé de guerra? Que droga de coincidência é essa?
Ah, então é isso. É, ele ia acabar descobrindo de qualquer jeito... E pode-se dizer que não está feliz com a novidade. Nada feliz.
- Como você queria que eu te dissesse alguma coisa se não desgrudou da Júlia nem por um segundo durante o dia inteiro? - Bancar a ciumenta não deveria ser bem minha prioridade, mas agora já saiu...
- Júlia... - pareceu ter lembrado - O infeliz dos infernos também é ex dela. Dá pra acreditar nisso?
Ai minha nossa. Eu sabia que aí tinha coisa...
- Como você descobriu essas coisas, afinal de contas? - faço uma careta de estranheza que deixa bem claro o quanto daquilo eu estou entendendo (ou seja, nada).
- Nós fomos em um bar. - responde sério.
- Um bar? - minha careta provavelmente piora mais um pouco - Com ele?