Lua Negra II

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A verdade

Tio Jorge os deixou na porta da casa da avó. Nem ele ficaria por lá, voltaria para buscá-los mais tarde. Seriam só Regina, Caio, Rebeca e Estela. Regina sentiu um forte mal-estar, sabia que seria sabatinada ali. Os olhos de Rebeca brilhavam de esperança pueril, era como se a avó tivesse o poder de resolver qualquer problema. Caio não criara expectativas. Muito pelo contrário, na sua cabeça, martelavam as cenas angustiantes do último sonho.

− Venham para a cozinha – convidou Estela. − Falta muito pouco para que o almoço fique pronto.

A cozinha era ampla, envidraçada, toda enfeitada de objetos antigos. Estela cantava, Rebeca a acompanhava, Regina quase sorria, lembrando-se de sua infância alegre. Para a avó, aquela era uma hora sagrada, nada de desagradável deveria ser dito diante dos alimentos, que só deveriam receber energias boas.

− Estou vendo que está usando os brincos que lhe dei. Espero que não seja só para me visitar.

O caio olhou para as pedras e a cena da noite anterior relampejou em sua memória. Ele ainda não tinha parado para pensar no estranhamento que sentiu.

− Você estava usando estes brincos ontem?

− Sim.

− Cara, eu vi uma coisa muito bizarra: na hora em que a Priscila cuspiu fogo em você, estas pedras faiscaram com muita intensidade!

− A Priscila cuspiu fogo em Rebeca? – irritou-se Regina. − Que história é essa?

− Calma, mãe, eu estou muito bem.

− Foi bizarro – repetiu Caio. − Foi tudo tão rápido, não sei nem se é coisa da minha cabeça dizer que essas pedras brilharam. Além do salvamento também ter sido surreal, acho que era quase impossível Gustavo ter feito aquilo...

− Meu Deus! Ela fez de propósito?

− Acho que não, mãe − respondeu Caio.

− Claro que não. Foi um acidente. Ela anda muito estranha: às vezes, muito controlada, o que não tem nada a ver com ela; às vezes, completamente louca.

− Fica longe dessa garota, minha filha — advertiu Regina à Rebeca.

− Vamos nos acalmar – falou Estela, já compreendendo que força e poder mágicos estavam envolvidos. Todos silenciaram, sabiam que estavam infringindo uma regra da casa.

Dirigiram-se para o jardim depois do almoço. Rebeca percebera o olhar ressentido de Regina para a avó. Estela aproximou-se da filha, segurou suas mãos de olhos fechados e cantarolou alguma coisa incompreensível.

− Não faça isso, você sabe que eu não gosto – disse Regina.

Estela sorriu pacientemente:

− Vamos conversar a sós, mas não agora. Primeiro, quero falar com Caio. Meu neto, venha comigo até o lago.

Enquanto Caio caminhava sobre os seixos rolados até o lago, Estela chegou até a neta e lhe pediu seus brincos. Ela o fez de maneira tão reverenciada que fez Rebeca pensar que poderia recusar com autoridade.

− Você está angustiado, Caio. Fale o que lhe passa.

− Tenho tido sonhos perturbadores. A senhora sabe o que se passa lá em casa... E eu vi a mulher que é amante do meu pai. Nos meus sonhos, eu sou criança, e ele me leva aos encontros com ela. Ela tem o olhar dissimulado e debochado, é uma mulher vulgar. Eu vi o carro dele deixando-a em casa, mas, quando me viram, ele fugiu. Eu corri até ela... Ela tentou fechar o portão na minha cara, mas eu bloqueei. Ela me reconheceu, debochou de mim. Eu tenho vontade de...

Os Olhos da Deusa (completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora